ARTIGO

Sobre golpes e anistias

Por Ayne Salviano | Especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 3 min

Em razão do 31 de março, data oficial do golpe militar em 1964, escrevi uma resenha informativa sobre a obra “Brasil Nunca Mais”, livro sobre a ditadura militar brasileira (1964-1984) elaborado pela Arquidiocese de São Paulo e o centro de documentação histórica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Meu texto começava com uma provocação: “Quer saber por que ainda hoje as pessoas gritam nas ruas ‘ditadura nunca mais’ e ‘sem anistia’"? Leia "Brasil Nunca Mais", obra com trechos de depoimentos prestados aos órgãos oficiais competentes da época por presos e torturados pelo regime: homens, mulheres, crianças; trabalhadores, donas de casa e estudantes (porque esses eram os perfis da maioria dos torturados e mortos naquele período).

Como disseram recentemente os ministros Flávio Dino e Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, o golpe não matou ninguém no dia 31. Mas matou dezenas, centenas, nos anos seguintes e ainda há pessoas "desaparecidas", cujos corpos não foram localizados, como o do ex-deputado Rubens Paiva, cuja história foi retratada no filme “Ainda estou aqui”, vencedor na categoria internacional do Oscar desse ano.

A lei 6.683, de 28 de agosto de 1979, assinada pelo presidente João Figueiredo, anistiou presos e exilados políticos, mas também os militares. Muitos ainda recebem altos salários e nunca responderam pelos seus crimes.

Talvez, por essa última parte, uma seguidora tenha se indignado e escrito: “anos atrás um belo grupo foi anistiado mesmo cometendo graves crimes como assaltos a banco, sequestro de embaixador e até morte. Hipocrisia pura. Para uns tudo, para outros nada”.

Não sei o que ela quis dizer com “para uns tudo, para outros nada” porque a Lei da Anistia favoreceu os dois lados do conflito. Mas tentarei decifrar o texto com o objetivo de ampliar minhas indicações de obras e ajudar a aumentar o conhecimento porque só ele nos salvará.

Documentos do regime militar apontam que para financiar suas ações, grupos revolucionários de esquerda assaltaram bancos durante a ditadura. A ex-presidente Dilma Rousseff, por exemplo, ficou presa por três anos, sofrendo torturas, acusada de assessorar os guerrilheiros.

Sobre esse episódio, sugiro assistir ao filme “A Torre das Donzelas”, de 2008, sobre o presídio onde ficou a ex-presidente. Importante destacar que um juiz federal concedeu anistia a Dilma por “sua condição de vítima de tortura e outras violações durante a ditadura militar no Brasil”.

Já sobre o sequestro de embaixadores (sim, foi mais do que um), sugiro o livro “O que é isso, companheiro?”, de Fernando Gabeira, jornalista, ex-deputado federal. Autobiográfico, ele foi publicado em 1979. Nele, o autor relata sua experiência na luta armada tendo como ápice o sequestro do embaixador norte-americano no Brasil, Charles Elbrick, em 1969.

Após a prisão, Gabeira foi para o exílio na Argélia e depois na França. Depois da anistia, como milhares de brasileiros, presos ou exilados, ele voltou para casa. Lembrando que essa é a mesma lei que permitiu que os torturadores não fossem criminalizados. Não há hipocrisia. Há fatos. História. Arranjos políticos no Congresso. As leis. A Justiça. Mas, especialmente, a democracia. Sem ela, só existe a violência e o medo.

Ayne Regina Gonçalves Salviano é graduada em jornalismo e marketing digital. Mestrado em comunicação e semiótica e MBA Internacional em eestão educacional

Fale com o Folha da Região!
Tem alguma sugestão de pauta ou quer apontar uma correção?
Clique aqui e fale com nossos repórteres.

Comentários

Comentários