OPINIÃO

Quem é responsável pelas mortes da dengue?

Por Ayne Salviano | especial para a Folha da Região
| Tempo de leitura: 3 min
Paulo Pinto/Agência Brasil

Já posso pedir música para o “Fantástico”. O programa dominical da Rede Globo tem um quadro esportivo com a seguinte dinâmica: quando um jogador de futebol marca três gols ou mais em uma partida, ele pode escolher uma música para celebrar. Nos 20 anos que moro em Araçatuba, tive dengue três vezes, a mais recente na semana que passou. Na primeira vez, achei que ia morrer. Na segunda, tive certeza, fiz até um pacto com Deus, que não vem ao caso agora. A terceira, confesso, foi mais branda, mas ainda estou convalescente.

Reconheço os meus privilégios. Só fiquei boa rapidamente porque tenho plano de saúde e dinheiro suficiente para a farmácia e os remédios que amenizam a febre e as dores. E, também, tenho recursos para a hidratação com água de coco da avenida da Saudade. Sei que seis litros de água de coco por dia desfalcariam um trabalhador comum, mas é o mínimo que um adulto deve tomar por dia.

Existem quatro tipos de dengue. E quando você é infectado por um tipo, diz a ciência que nunca mais você será atacado por ele de novo. Eu deveria estar um pouco aliviada, mas confesso que não quero encontrar o quarto tipo de mosquitinho.

A dengue é debilitante em todas as suas versões. Mas pode matar quem não recebe atendimento profissional rapidamente. E vamos combinar, atendimento imediato na saúde particular já está difícil, imaginem no serviço público.

Mas desde a primeira dengue, entendi que pegar a doença não depende de uma única pessoa, no caso, nós mesmos. A dengue é um problema coletivo. Quando tive dengue pela primeira vez, eu morava no bairro Jardim Nova Iorque, área nobre da cidade, mas abandonada. Perto da minha casa existiam as ruinas de uma antiga costelaria, o prédio estava completamente abandonado, cheio de mato e lixo. Fora os terrenos baldios nas mesmas péssimas condições. Quem deve fiscalizar a limpeza pública?

Na segunda vez que tive dengue, morava perto da avenida Pompeu de Toledo, cartão postal da cidade, mas tão deteriorado naquela época e hoje. Quem deve ser o responsável pela limpeza de locais públicos, especialmente de córregos que cortam a cidade, mas estão entupidos de lixo que acumula água para os nascedouros do mosquito?

Nesta terceira vez, estou em um dos bairros mais próximos do centro da cidade e, pasmem, a sujeira continua a mesma. As calçadas cheias de mato, as praças sem limpeza adequada e os vizinhos insistem em fazer a lombada de cimento sobre o asfalto para não molharem as rodas dos seus carros e nem sujarem as suas varandas, mesmo que com isso, a sujeira se acumule nas poças de água que não escorrem. Quem fiscaliza essas construções irregulares na cidade?

Enquanto os problemas de limpeza pública persistirem, o município precisará gastar milhares de reais para pagar hora-extra de funcionários dos postos de saúde públicos mais milhares de reais para a compra de todo material e medicação necessários para o tratamento. Aumentar o horário de atendimento dos postinhos é uma iniciativa necessária, mas não resolverá o problema, é o famoso “enxuga gelo”. Saio da terceira dengue restabelecida, mas há pessoas que morrem por causa dela. Quem responderá por essas mortes?

Ayne Regina Gonçalves Salvino é graduada em jornalismo e marketing digital. É especialista em metodologia didática, com mestrado em comunicação e semiótica e MBA Internacional em gestão educacional.

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