Documentos sigilosos obtidos pela CPMI do INSS revelam o que milhares de aposentados já sentiam no bolso: a esmagadora maioria dos descontos associativos em seus benefícios era irregular. Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) é categórica: 97% de um grupo de 1.300 entrevistados afirmaram nunca ter autorizado tais cobranças.
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O mais grave, no entanto, é que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tinha plena ciência do problema e, por anos, protelou ações efetivas para barrar as fraudes. Atas de um grupo de trabalho que reunia o próprio INSS, o Ministério Público Federal (MPF) e outros órgãos de controle detalham uma longa história de inação.
Desde 2020, o tema dos descontos fraudulentos era pauta recorrente no Grupo de Trabalho Interinstitucional (GTI). Representantes da Defensoria Pública da União (DPU), por exemplo, já alertavam para a "enxurrada" de queixas de aposentados com dificuldades para cancelar filiações que sequer sabiam ter feito.
A solução parecia girar em torno de uma nova Instrução Normativa (IN) para regulamentar os acordos com as associações. Contudo, as atas mostram que a publicação da norma se tornou uma novela. Em diversas reuniões, ao longo de mais de dois anos, o INSS apresentou desculpas, alegando dificuldades técnicas, necessidade de mais análises ou discordância das entidades.
Enquanto a burocracia se arrastava, os descontos indevidos se multiplicavam. Questionado sobre a explosão de cobranças em 2022, um então diretor de benefícios do órgão chegou a justificar o ocorrido como um mero "crescimento do mercado", segundo os registros.
A pressão dos órgãos de controle aumentava. O MPF cobrou cronogramas, a CGU expôs a falta de colaboração de entidades suspeitas e a DPU reforçou a necessidade de revalidar todas as autorizações de desconto, dada a dimensão da fraude. Mesmo assim, as respostas do INSS continuaram vagas.
A situação só começou a mudar efetivamente em 2024, após a "farra do INSS" ser exposta na imprensa e a Polícia Federal deflagrar a Operação Sem Descontos. Só então o INSS implantou, em março de 2025, o sistema de biometria facial como requisito para novas autorizações de desconto, uma medida de segurança discutida por anos.
As atas revelam uma omissão que atravessou diferentes governos e permitiu que milhões de reais fossem retirados indevidamente dos benefícios de aposentados e pensionistas, a parte mais vulnerável do sistema. O caso agora segue na mira do Congresso e do Ministério Público Federal.