Amizades

Por José Faganello | 11/08/2021 | Tempo de leitura: 3 min

“De vez em quando a gente precisa sacudir a árvore das amizades para caírem as podres”. (Mario da Silva Brito, Cartola de Mágico, 1910)

Como a longevidade sempre desejada está cada vez premiando maior número de pessoas; um amigo meu completou 90 anos em plena forma física e prometeu que quando fizer 101 anos irá dar aos seus amigos uma festa de arromba, com certeza irá gastar bem pouco, pois eles estão perrengues), é aconselhável adicionar novos amigos, de modo que a falta de um possa ser suprida por outros.

Assim como o apreciador de bons vinhos os acondicionam em adequadas adegas bem providas e as vão renovando constantemente, assim devemos fazer para não ficarmos desprovidos de amigos com os inevitáveis desfalques por óbitos ou por mudanças para longe de nós.

Uma vez estabelecida a amizade devemos cultivá-la de tempos em tempos, portanto há a necessidade de uma manutenção constante. Quando elas são reais, não se portam como blocos de gelo a se derreterem ao menor calor. Serão sólidas como granito que perdura, sem desgaste sob a ação do tempo.

Infelizmente, o desenvolvimento tecnológico não foi acompanhado pela solução dos conflitos humanos através do diálogo.
O que se constata é o aumento da violência, a insanidade do egoísmo; portanto, feliz daquele que consegue ter amigos sinceros. Eles servem como bálsamo para as feridas em nossa alma provocadas pela loucura da vida moderna.

As estocadas que recebemos em nosso dia a dia, ao sermos amparados por nossos amigos, não conseguirão nos derrubar.
Não podemos eleger nenhum deles como o mais querido, ou o melhor e jamais permitir que nossas amizades sejam afetadas por bagatelas.

O amigo é aquele com o qual posso desabafar e ser sincero. Falar a verdade é um luxo permitido para poucos, pois as pessoas, em geral, não costumam aceitá-la, quando por ela não são agradadas. A hipocrisia permeia soberana nos relacionamentos sociais. Os elogios e mesuras normalmente encobrem os reais pensamentos entre os interlocutores.

A sociedade não costuma mostrar sua real face e para se manter relações cordiais necessitamos, numa época em que a falsidade é moeda corrente, ter certa dose de demência. Isso dificulta-nos andar ereto. Somos obrigados a afagar os egos e a retribuir as mesuras que recebemos, caso contrário criamos um clima de inimizade e de isolamento.

O amigo verdadeiro não se intimida de corrigir-me e ao oferecer-me entretenimento não exige qualquer retribuição. Shakespeare com muita propriedade sintetizou o que achava do amigo: “(…) Pois é tão doce lembrar o que valeis, / Que essa sorte eu não troco nem com reis”.

Ralfh Waldo Emerson, criador da Filosofia Transcedentalista, em que sob forma lírica e lógica retomou o grande tema da fatalidade, celebrando ao mesmo tempo a audácia ideal do homem, em sua obra “Ensaios I, I: Amizade”, no contexto desta obra pode-se pinçar alguns pensamentos lapidares sobre a amizade e amigos: “Um amigo pode ser considerado a obra prima da natureza”; “Faço com meus amigos o que faço com meus livros: guardo-os onde os possa encontrar, mas uso-os raramente”; “O único premio da virtude é a virtude; a cínica maneira de ter um amigo é tê-lo”.

Sabemos que o uso da palavra amigo é muito comum, mas na realidade eles são raríssimos, pois a fidelidade é por demais rara.
Desafortunadamente constatamos que nesses novos tempos os valores tidos em conta pela maioria são os alicerçados no ter e não no ser. Essa maneira de pensar não propicia o desenvolvimento de reais e sólidas amizades, mas o vicejar do egoísmo e a busca incessante de vencer a qualquer custo e de sobressair-se. Em vez de se procurar o aprimoramento intelectual, está prevalecendo a cultura do físico, do corpo magro, sem nenhuma gordura. Para isso não se mede os esforços, enquanto que em vez de enriquecer o espírito com mais conhecimento e a aprender a se conviver com a diversidade amando o próximo, pratica-se o ridículo narcisismo.

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