Desamor

Por José Faganello | 29/04/2020 | Tempo de leitura: 2 min

“O amor é como a lua: quando não aumenta, diminui” (Segur)

O homem, ao contrário dos outros animais, é um ser que demonstra, e em grau desmedido, tanto o amor como o ódio. É também um animal que, ao contrário dos demais, mata sem necessidade e ao mesmo tempo é capaz de demonstrar solidariedade surpreendente. Jamais veremos, por exemplo, uma manada de cavalos selvagens interromperem sua marcha em solidariedade a um deles retardatário.

É a si próprio que o homem costuma amar mais. O amor-próprio é uma característica humana. Este amor-próprio, embora combatido por religiões, filósofos, e destratado pela maioria, é difícil de ser extirpado e, em muitos, atinge grau de exacerbação visível. Quando alcança esse grau, o amor-próprio torna-se presunção inexcedível. Diante do conceito judaico-cristão, é a anatematizada soberba, o primeiro dos pecados capitais. Pessoa presunçosa é sempre cansativa e a reação que provoca é riso ou fastio.

A história está repleta de presunçosos. É evidente que ao longo dos tempos presunçosos nunca faltaram. Tomamos conhecimento apenas daqueles que tiveram cacife para deixar gravados seus nomes. Ramsés II, Séc. XIII a. C., deixou em um de suas gigantescas estátuas a inscrição: “Rei dos Reis. Quem quiser saber quem eu sou (..) que supere as minhas obras”. Hoje restam no deserto apenas duas pernas dela. A lista interminável de presunçosos históricos como Creso, Nabucodonosor, Alexandre, o Grande, Nero, Frederico, o Grande, Napoleão, Hitler Stalin etc. Serve para nos alerta de nossa total insignificância.

Aparentemente, hoje, os homens afiguram ter perdido aquele amor-próprio antes tão comum e tão exacerbado.

É verdade que muitos filósofos, muitos ensinamentos religiosos, e a maior disseminação cultural deram substancial ajuda para isso.

A carga de desamor atual, no entanto, não parece ser resultado disto apenas. Praticamente, podemos afirmar que estamos entrando numa era de desamor.

Quanto mais a inteligência humana desenvolve-se. Quanto mais espetaculares são os inventos modernos, maior parece ser a desilusão.

O homem feliz é aquele que está contente com o que possui. O nirvana da felicidade exige o congraçamento, a comunhão, a convivência, não apenas pacífica, mas participativa, com seus semelhantes.

De nada valem riquezas, posses, sem amizades. A solidão, principalmente quando no meio de muita gente, é dos mais cruéis castigos, que alguém pode sofrer.

É neste o mundo moderno, onde as comunicações tornam-se a cada dia mais rápidas, que o paradoxo da solidão avança celeremente.

A sensação de impotência para eliminar este mal faz um homem cada dia mais descrente de alcançar o bem, de construir um mundo melhor, e o faz perder aquela empáfia de que ele tudo pode. Se o amor próprio exacerbado não é desejável, o desamor, que desarvora e desestimula, é muito pior.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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