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Mulheres desbravam áreas de predominância masculinas em busca de representação e igualdade

Por Daniela Borges |
| Tempo de leitura: 7 min
Margareth Dalcomo
Margareth Dalcomo

Toda mulher tem o direito de ser e de fazer o que ela quiser. Essa é a liberdade que todas nós buscamos, seja qual for a atividade a que nos dedicamos. Como bem disse a escritora e filósofa francesa Simone de Beauvoir, que também era ativista política e feminista: “que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância, já que viver é ser livre”. 

Se imaginarmos que até 1932 a mulher não tinha direito ao voto no Brasil, ou seja, não era vista como cidadã pela sociedade, podemos concluir que evoluímos ao longo das décadas. Hoje, representamos 52% do eleitorado brasileiro. Porém, ainda presenciamos episódios lamentáveis de cerceamento da vontade e dos direitos femininos em diversos setores. A liberdade é uma conquista e como tal deve ser alcançada com persistência, mobilização e empenho. Todos os dias. "A ideia de poder feminino é uma construção", aponta a doutora em história social Suzana Lopes Salgado Ribeiro, professora da Unitau (Universidade de Taubaté).

Um exemplo típico pode ser visto nos cargos de liderança. Apesar de mais instruídas, as mulheres ocupam 37% dos cargos gerenciais. Falta espaço, oportunidade. Modelos de liderança como Kamala Harris, vice-presidente dos Estados Unidos, e Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia, ajudam não só a quebrar preconceitos e romper barreiras, servem também de representação. 

"Toda vez que vemos uma mulher no poder estamos falando para todas as crianças, todas as meninas, que elas poderão ocupar este espaço", afirma Suzana. "Cresci tendo referências de mulheres no mundo do trabalho. Minha mãe, por exemplo, era professora e eu quis ser professora, porque achava esse lugar maravilhoso. Algumas meninas, hoje, podem olhar essas mulheres e achar que é o lugar em que querem estar no futuro. Ou seja, a representatividade semeia sonhos e os sonhos são motores para que possamos ir em frente", reforça a professora.

No Brasil, contudo, não conseguimos avançar em termos de representatividade política, apesar de maioria do eleitorado. No Congresso Nacional, apenas 15% são mulheres. Nas eleições de 2020, dos 5.463 prefeitos eleitos, 658 pertencem ao sexo feminino, ou seja, 12% do total. 

Os motivos são complexos e possuem raízes históricas e culturais, entre eles a própria falta de ambição política. "As mulheres, de maneira geral, recebem poucos incentivos ao longo da vida para saberem sobre política e se engajarem nesse assunto", afirma a pesquisadora e cientista política Letícia Quirino de Medeiros, cofundadora da ONG Elas No Poder.

"A falta de estímulos sociais, a dupla jornada de trabalho, a violência política sofrida pelas mulheres eleitas, o pouco apoio político e financeiro para produzirem campanhas e o ambiente partidário masculino e excludente, todos esses fatores, combinados, impõem muitos desafios para a eleição de mulheres no Brasil", complementa.

Partiu do Chile uma ação inédita no mundo que prevê que a nova Constituição seja redigida igualmente entre os gêneros, ou seja, 50% das vagas para a Assembleia Constituinte devem ser para mulheres. 

No Brasil, os partidos políticos são obrigados por lei a reservar 30% das vagas de candidaturas para as mulheres. "Mas não garante que 30% delas sejam eleitas", observa a professora da Unitau. "No nosso país temos uma política maioritariamente masculina, que decide para uma população majoritária feminina. E muitas mulheres não acham que isso é um problema, e não se sentem representadas por outras mulheres", observa a professora Suzana. "Desconstruir isso é fundamental, senão esses números serão sempre apenas números e não vão significar mudança alguma. É preciso que haja uma mudança na mentalidade das pessoas e que as mulheres possam ser vistas como possibilidade de liderança, e hoje, no Brasil, isso ainda não acontece", completa.

Para Letícia, uma lei não substitui a outra. "As leis atuais, estimulam o recrutamento de mulheres e a destinação de uma parte dos recursos para suas campanhas. A lei de reserva de cadeiras é um complemento a essas outras políticas. É mais um passo na busca do aumento da representatividade", explica. 

O recrutamento, aliás, é fator muito importante para a participação política das mulheres. "Ao forçar os partidos a recrutar mais mulheres para seus quadros de filiadas e estimular suas candidaturas, está estimulando também uma quebra no padrão de comportamento dos partidos. Afinal, historicamente, os partidos são organizações políticas criadas e geridas de homens para homens", reforça.

O caminho por uma sociedade mais justa e igualitária passa pelo esporte. "De maneira geral, o ambiente esportivo ainda não é um espaço seguro e equânime para as meninas e mulheres. São recorrentes episódios de assédio e abuso, tanto moral quanto sexual, as desigualdades salariais, a falta de investimento nas categorias femininas das diversas modalidades e, principalmente, a escassez de políticas públicas e institucionais que promovam a justiça de gênero no ambiente esportivo", ressalta Jane Moura, presidente da Empodera, associação que trabalha pela transformação social por meio do esporte.

A equiparação salarial é fundamental para o desenvolvimento do esporte de mulheres. Na lista mais recente da Forbes com os 50 esportistas mais bem pagos do mundo, apenas duas são mulheres: Naomi Osaka e Serena Williams, ambas tenistas. "No Brasil, o futebol é uma das modalidades em que as desigualdades salariais são absurdas. As jogadoras dos principais times do país ganham em média R$ 3.000 mensais. Se compararmos com as folhas salariais do futebol masculino, os valores pagos às atletas mulheres são ínfimos", pontua Jane. Além do futebol, ela cita o basquete como modalidade mais injusta para as mulheres. 

Se falarmos em participação feminina, as modalidades mais equânimes, segundo Jane, são o rugby, vôlei e handebol. "E, apesar das mulheres não ganharem mais do que os homens em nenhuma modalidade, o vôlei - de quadra e de praia - tem demonstrado importantes avanços nos últimos anos", destaca. 

Apesar desses entraves, o acesso das mulheres ao esporte tem crescido recentemente. Basta olhar para a evolução da participação das mulheres na história olímpica: nas Olimpíadas de Tóquio, a participação das mulheres representará quase 49% do total de atletas, superando os 46% das Olimpíadas do Rio, em 2016, que foram um recorde histórico.

Existem diversos exemplos de como o esporte de mulheres deve ser tratado, segundo Jane. "É necessário que os clubes e outras instituições de gestão do esporte invistam em salários e condições de trabalho igualitárias, que as mídias deem maior visibilidade às mulheres no esporte, que as empresas invistam em maiores patrocínios, e que a população de maneira geral passe a consumir, acompanhar e incentivar mais o esporte de mulheres", resume.

Por meio de exemplos como esses podemos concluir que o copo está meio cheio, o cenário está mudando, tudo isso graças à maior organização, coletividade e engajamento das mulheres na luta por igualdade.

A luta por uma sociedade mais justa e igualitária às mulheres passa por todos os segmentos profissionais. E no esporte, não seria diferente. “O ambiente esportivo ainda não é um espaço seguro e equânime para mulheres. São recorrentes episódios de assédio e abuso, tanto moral quanto sexual, as desigualdades salariais, a falta de investimento nas categorias femininas das diversas modalidades e, principalmente, a escassez de políticas públicas e institucionais que promovam a justiça de gênero no ambiente esportivo”, ressalta Jane Moura, presidente da Empodera, associação que trabalha pela transformação social por meio do esporte.

Mercado. No geral, se falarmos em participação feminina e equidade salarial, nota-se que a disparidade é grande. Segundo uma publicação do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgada no início deste ano, as mulheres receberam 77,7% do salário dos homens em 2019. A diferença é ainda maior em cargos de gerência e diretoria, onde elas ganharam apenas 61,9% do rendimento dos homens. A pesquisa também apontou que somente 34,7% dos cargos gerenciais do país eram ocupados pelo sexo feminino.

Também é importante observar, que mesmo diante da diferença, elas ainda são as que mais tinham diploma de grau superior, segundo a mesma pesquisa do IBGE. Na faixa-etária entre 25 e 34 anos, 25,1% das mulheres concluíram o nível superior, contra 18,3% dos homens. Ainda assim, basta uma pesquisa rápida para descobrir que há menos mulheres dando aulas em universidades ou atuando, por exemplo, em instituições científicas.  

Ainda que o cenário pareça desanimador, estamos avançando, ainda que a passos lentos, já que há mais mulheres se destacando em cargos de liderança, batalhando por mais respeito e igualdade. Basta avaliar exemplos recentes neste aspecto como Maria Paula Capuzzo, presidente da Colgate-Palmolive, Margareth Dalcomo, pesquisadora da Fiocruz, e tantas outras listadas pela Forbes neste ano como mulheres de sucesso.  

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