Após denúncia do Ministério Público, duas empresas com sede em Taubaté foram condenadas pela Justiça por fraudar uma licitação da Prefeitura local.
Clique aqui para fazer parte da comunidade de OVALE no WhatsApp e receber notícias em primeira mão. E clique aqui para participar também do canal de OVALE no WhatsApp
Na sentença, a juíza Rita de Cassia Spasini de Souza Lemos, da Vara da Fazenda Pública, concluiu que a Andrade Britta e a Darc omitiram integrar um mesmo grupo para participar de uma licitação feita pela Prefeitura de Taubaté em 2016. O certame era para aquisição de CBUQ (Concreto Betuminoso Usinado a Quente), material usado para serviço de asfaltamento.
Embora tenha concluído que a fraude denunciada pelo MP se confirmou, a juíza puniu as empresas apenas com a proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos públicos - por dois anos, no caso da Andrade Britta, e por três anos, no caso da Darc. No entanto, por entender que não houve dano aos cofres públicos, a magistrada negou o pedido da Promotoria para que as duas empresas e três sócios delas fossem condenados a ressarcir o município em R$ 3,687 milhões.
O MP já apresentou recurso contra a sentença, justamente para pedir que o Tribunal de Justiça reforme a decisão e ordene o ressarcimento. As empresas e os sócios negam ter cometido qualquer irregularidade (leia mais abaixo).
Denúncia.
Dos seis itens da licitação, dois foram vencidos pela Andrade Britta e um pela Darc. Os três restantes ficaram com outras duas empresas. A suspeita de irregularidade foi apontada pela Auditoria Geral da Prefeitura: ao cadastrar os dados para a emissão de notas fiscais, a Darc forneceu o mesmo telefone e o mesmo e-mail da Andrade Britta.
Na denúncia feita à Justiça em abril de 2018, o MP apontou que as investigações comprovaram que as duas empresas são do mesmo grupo, e que elas simularam uma concorrência inexistente na licitação. De acordo com a Promotoria, a Andrade Britta, fundada em 2012, demitiu todos os funcionários em 2014, quando a Darc foi criada. Na sequência, os empregados foram absorvidos pela Darc. Até 2018, ao menos, a Andrade Britta não teria admitido mais nenhum trabalhador. Um funcionário ouvido pelo MP apontou que as duas empresas funcionavam no mesmo lugar.
Na ação, a Promotoria citou ainda a ligação entre os sócios das duas empresas. Proprietária da Andrade Britta, Daniela Andrade Britta foi sócia da Darc até 2015. Já a Darc tem como proprietária Maria José Barberi Campos. Ela é mãe de Gabriel Barberi Perroni de Souza, que também foi sócio da Andrade Britta. Os três estão com os bens bloqueados desde o início do processo.
O MP também apontou outras duas irregularidades: superfaturamento, já que a Darc teria cobrado 15% a mais do que a Prefeitura pagou a outras empresas pelo mesmo produto; e irregularidade nos atestados apresentados pela Darc, que competiu em lotes destinados a microempresas, embora não se enquadrasse nessa faixa.
Sentença.
Na sentença, a juíza apontou que "a participação das empresas" na licitação "infringe frontalmente diversos princípios ligados à administração pública", já que a Andrade Britta e a Darc "fizeram uso de expediente a fim de omitir sucessão empresarial (ou uso de artifício irregular) para que ambas as pessoas jurídicas participassem" do certame, "aumentando assim suas chances de sucesso".
A magistrada destacou que, "de acordo com os documentos amealhados, restou claro que as empresas mencionadas atuavam de forma uníssona, compartilhando suas estruturas produtivas e os meios de produção no mesmo estabelecimento comercial".
A juíza também atestou que a Darc, embora tenha apresentado "declaração e balanço patrimonial para fins de enquadramento na condição de microempresa", teve "ganhos de janeiro a dezembro do ano-calendário anterior à licitação muito superiores" ao patamar para a classificação como microempresa.
Ao negar o pedido para que as empresas e os sócios fossem condenados a ressarcir a Prefeitura no valor dos contratos firmados, a magistrada apontou que laudo pericial feito por determinação da Justiça "apurou que não houve superfaturamento nos produtos adquiridos pelo ente público, tampouco prejuízos financeiros, já que a aquisição dos materiais (asfalto) se deu dentro do padrão de preço praticado no mercado de consumo".
Recurso.
No recurso contra a sentença, o MP alegou que houve "prejuízo ao erário" devido à "existência de evidente superfaturamento do valor da tonelada de asfalto" em três dos itens, cujos preços "foram 15% superiores que os ofertados pelas demais empresas, para o mesmo produto".
A Promotoria também contestou o fato de a juíza ter se baseado no laudo pericial para concluir que não houve prejuízo aos cofres públicos. "O prejuízo não está propriamente no valor de comercialização efetivo dos bens, mas no valor inferior que poderia ter sido despendido pela Fazenda Pública de Taubaté caso não tivesse ocorrido a fraude", alegou o MP. "Pagou-se valor superior ao que poderia ter sido praticado caso os apelados tivessem se portado com honestidade", concluiu a Promotoria.
Questionada pela reportagem, a Prefeitura, que atuou na ação ao lado do MP, afirmou que defendeu "a condenação dos requeridos à restituição dos valores pagos" e que só não irá apresentar recurso porque a Promotoria já o fez.
Outro lado.
A Andrade Britta, que ainda tem Daniela Andrade Britta como sócia, afirmou que "as manifestações" da empresa "ficarão restritas aos autos em respeito ao devido processo legal", mas alegou que "a prova técnica" e a "sentença" reconheceram "que não houve dano e sim uma economia ao município".
Maria José Barberi Campos, que também é advogada e defende a ela própria e a Darc na ação, afirmou que irá se manifestar no processo. "O processo judicial ainda está em andamento e minhas manifestações serão apresentadas dentro do prazo e no próprio processo". Maria José também alegou que "tanto a perícia como a sentença deixaram claro que não houve qualquer dano material ao município".
A defesa de Gabriel Barberi Perroni de Souza não respondeu às tentativas de contato da reportagem. No processo, Gabriel negou qualquer irregularidade.