HÉLCIO COSTA

Triste: os municípios continuam com o pires na mão

Por Hélcio Costa | Jornalista
| Tempo de leitura: 3 min

O ex-governador Franco Montoro dizia, com toda razão, que o cidadão mora no município, não no Estado, nem na União.

Afinal, como todo mundo sabe, é no município que o cidadão tem suas atividades, trabalha, gera riquezas, estuda, constitui família, tem filhos, se diverte, dá risada, chora, vive e morre. No Brasil atual, no entanto, a lição de Montoro foi esquecida em alguma gaveta empoeirada de Brasília, quando se trata da redistribuição de recursos federais. Governos entram e saem, e a Equação Federativa continua desequilibrada em favor da União. Mais que uma disputa política, isso tem efeito direto na vida das pessoas, que, como disse Montoro, não moram nem no Estado, nem na União. Moram, moramos todos, nas cidades.

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Como desatar esse nó?

Esse é o pano de fundo da "invasão" programada para os dias 20 e 23 de maio, em Brasília, quando a capital federal deve receber mais de 10 mil pessoas, entre prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, secretários municipais e autoridades locais em busca de soluções para questões prioritárias aos municípios brasileiros. É a "Marcha a Brasília", que chega este ano à sua 25º edição. A convocação geral é da CNM (Confederação Nacional de Municípios). Mas outras entidades engrossam a Marcha, como a Frente Nacional dos Prefeitos. Da região vão prefeitos avulsos, vão prefeitos em grupo, reunidos em torno da Amvale (Associação de Municípios do Vale do Paraíba e Litoral Norte). A pauta, no entanto, é comum: alterar as regras de redistribuição de recursos pelo governo federal.

Para a região, o grande gargalo é a Saúde.

Estudo da Amvale a ser entregue à ministra da Saúde, Nísia Trindade, na próxima quinta-feira, mostra uma redução considerável, até drástrica, dos repasses federais aos 39 municípios da Região Metropolitana do Vale do Paraíba desde 2020 apenas na área da Saúde. Para o presidente da Amvale, Thales Gabriel (PSD), prefeito de Cruzeiro, o objetivo da ida ao Ministério é reivindicar parte dos recursos financeiros que estão sendo liberados a diversas regiões, mas que ainda não chegaram às cidades da RMVale.

Base para a reivindicação existe.

O estudo em posse da Amvale, feito pela Planus Brasil, revela que a participação da União no financiamento da Saúde na região encolheu de 31% para 22%, em média. Isso teve efeito direto nas cidades. Taubaté amargou uma crise no setor em 2023, agravada com uma queda de mais de R$ 70 milhões nos repasses federais de ICMS e FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Jacareí fechou 2023 com resultado negativo de R$ 20 milhões na Saúde, um "tsunami" sentido também em Guaratinguetá, Caraguatatuba e outras cidades da região.

Esse problema não é exclusivo da RMVale. De modo geral, segundo a CNM, as cidades brasileiras investem R$ 46 bilhões por ano a mais em saúde do que prevê a Constituição Federal (mínímo obrigatório é 15% da receita; investimento municipal chegou a 22%, em média em 2023). E o governo federal repassou R$ 12 bilhões anuais.

Emendas

Para o prefeito de Jacareí, Izaias Santana (PSDB), um dos principais desafiios a ser superado é o critério excessivamente político adotado para redistriuição de recursos federais. "Desde que criaram as emendas parlamentares, metade delas é vinculada à Saúde. Você tem um volume de recursos para a Saúde definidos por critérios políticos. Com isso, regiões com poucos deputados saem no prejuízo." Outros desafios, segundo ele, são a falta de critérios técnicos para liberação de verba e uma defasagem da tabela de serviços do Ministério da Saúde.

Qual será a resposta do governo?

Em 2023, sob pressão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou que iria liberar recursos de emergência aos municípios para compensar perdas sofridas nos repasses federais. Fez "lives", deu entrevistas. Mas o volume de recursos liberados não agradou todo mundo. O prefeito de Guaratinguetá, Marcus Soliva (PSB), por exemplo, não vai a Brasília desta vez, insatisfeito com os resultados de 2023. "Lula deu uma gorjeta para os municípios", disse ele. "Tirou R$ 30 milhões da gente e devolveu R$ 1,5 milhão no final do ano."

Pelo jeito, Lula está precisando de uma boa "dose" de Montoro.

Comentários

1 Comentários

  • José Tadeu Gobbi 18/05/2024
    É sempre bom lembrar que o orçamento federal, nos últimos anos, passou por mudanças radicais em sua destinação sendo predado por grupos de interesse, principalmente do Congresso Nacional. A cada ano parlamentares abocanham fatias substanciais do orçamento com emendas individuais, de relator, de bancada e de comissão, quase todas de execução obrigatória. Alguém de lembra do orçamento secreto? Em 2024 estas emendas ficaram em R$ 53 bilhões. Isto sem contar o poder do Congresso de alterar a destinação da fatia vinculada do orçamento. Além disso temos os fundos eleitoral e partidário que ano após ano abocanham fatias cada vez maiores do orçamento. Renuncias fiscais, subsídios improdutivos e outras artimanhas levam outra fatia gigantesca do orçamento. Os prefeitos deveriam questionar as duas casas do Congresso Nacional sobre para onde vai o dinheiro dos impostos arrecadados dos municípios.