CRISE FINANCEIRA

Dívida impede Prefeitura de Taubaté de ter acesso a operação de crédito de R$ 86 milhões

Governo Saud obteve aval da Câmara há um ano e meio, mas dívidas contraídas pela Prefeitura desde então, como a do CAF, impedem que contrato de empréstimo seja assinado

Por Julio Codazzi | 17/04/2024 | Tempo de leitura: 9 min
Taubaté

Caique Toledo/OVALE

Crise financeira da Prefeitura se agravou no fim de 2022
Crise financeira da Prefeitura se agravou no fim de 2022

Um ano e meio após a Câmara de Taubaté autorizar a Prefeitura a contratar operações de crédito de até R$ 86 milhões junto ao governo estadual, o município ainda não conseguiu concretizar o empréstimo. O motivo: as dívidas milionárias contraídas pela administração municipal no período.

Clique aqui para fazer parte da comunidade de OVALE no WhatsApp e receber notícias em primeira mão. E clique aqui para participar também do canal de OVALE no WhatsApp

Enviado à Câmara pelo prefeito José Saud (PP) em maio de 2022, o projeto foi aprovado pelos vereadores em novembro e sancionado em dezembro daquele ano. Desde então, porém, a situação financeira da Prefeitura se deteriorou.

Entre dezembro de 2022 e fevereiro de 2024, por exemplo, a Prefeitura acumulou dívida de R$ 112,698 milhões com o IPMT (Instituto de Previdência do Município de Taubaté). E também desde dezembro de 2022, deixou de pagar R$ 99,394 milhões ao CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina).

Operações de crédito solicitadas por municípios precisam de aprovação da STN (Secretaria do Tesouro Nacional), que analisa se os valores irão extrapolar os limites de endividamento estabelecidos pela legislação federal, com o objetivo de precaver futuros calotes - como o que ocorreu com relação ao CAF. Ciente de que o contrato das operações de crédito de até R$ 86 milhões não seria aprovado, a Prefeitura de Taubaté sequer deu andamento os procedimentos necessários.

Mesmo um ano e meio após o aval da Câmara, a Prefeitura ainda não enviou toda a documentação necessária para a Desenvolve SP. Segundo a agência de fomento do governo estadual, nessa etapa são exigidos documentos como pareceres e certidões do TCE (Tribunal de Contas do Estado) e também relatórios contábeis.

No início de 2023, a Prefeitura também chegou a iniciar o processo para pedir o aval da STN, com o protocolo dos pedidos no Sadipem (Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios), mas o procedimento não foi concluído pelo município.
Questionada pela reportagem, a Desenvolve SP afirmou que as linhas de crédito seguem "disponíveis", mas ressaltou que a Prefeitura ainda não "encaminhou toda documentação solicitada para darmos andamento".

Já a Prefeitura alegou que "está comprometida em fazer o pagamento" de dívidas como as "prestações do CAF", e que "os setores envolvidos estão trabalhando para prestar as informações necessárias e finalizar os processos [das operações de crédito] para, em seguida, executar as obras previstas".

CRÉDITO.
Inicialmente, quando o projeto foi aprovado pela Câmara, o recurso seria aplicado em três iniciativas: a retirada de postes da região central (R$ 30 milhões), a construção de uma nova sede para a Prefeitura (R$ 36 milhões) e a duplicação do viaduto da CTI (R$ 19 milhões).

No início de 2023, quando a Prefeitura iniciou o processo para pedir aval da STN, a relação de projetos foi alterada. A construção de um novo Paço Municipal e a duplicação do viaduto da CTI saíram da lista. E outras três ações entraram: a construção de um viaduto em frente ao Atacadão, sobre a Via Dutra, para ligar os distritos industriais do Una 1 e do Una 2 (R$ 20 milhões); obras de drenagem e implantação de piscinões na cidade (R$ 29 milhões); e reforma de um prédio que receberia o Paço (R$ 7 milhões) - essa última já foi abortada, pois não houve acordo com a Unitau (Universidade de Taubaté), que é proprietária da área.


No dia 25 de abril, oito dias após a publicação da reportagem, a Prefeitura de Taubaté enviou a seguinte nota a OVALE:
"Em relação à reportagem veiculada pelo jornal "O Vale" no dia 17 de março de 2024, sob a manchete “Dívida impede Prefeitura de Taubaté de ter acesso a operação de crédito de R$ 86 milhões", a Prefeitura de Taubaté esclarece:
-Não é verdade que “dívidas milionárias” contraídas pela administração municipal impedem acesso a quaisquer operações de crédito;
-A Prefeitura de Taubaté está, sim, em tratativas com a Desenvolve SP para obtenção de financiamento para viabilizar projetos de infraestrutura relevantes ao município. A não-concretização dessas tratativas, ao contrário do que afirma este jornal, não decorre de pendências financeiras, mas, sim, de uma reestruturação nos projetos em questão;
-O município de Taubaté detém uma decisão judicial expedida no processo no. 5002528-95.2022.4.03.6121, da 2a. Vara Federal de Taubaté, que impede restrição nas certidões em decorrência de débitos, como, o contrato do CAF, que tem a União como avalista (vide documento anexo);
-No que tange às dívidas junto ao IPMT e ao CAF, a Prefeitura de Taubaté esclarece que elas estão em processo de repactuação e demanda judicial, respectivamente, não constituindo obstáculos à obtenção do financiamento;
-Não existem pendências no CAUC e no CRMC;
-Em virtude de novas demandas do Município e da necessidade de captação de recursos, o prefeito José Saud determinou a modificação dos projetos originalmente apresentados ao Desenvolve SP. Nesse sentido, a versão mais recente da demanda priorizou a execução do viaduto do Una (R$ 56 milhões), o que implicou no cancelamento do projeto de infraestrutura urbana (R$ 36 milhões) já que tal objeto é passível de captação de recursos junto aos governos federal e estadual. O projeto de iluminação (R$ 30 milhões) foi mantido integralmente e o projeto do viaduto do UNA teve seu valor ajustado de R$ 20 milhões a R$ 56 milhões;
-Transformar uma questão administrativa em um suposto impeditivo decorrente de uma dívida foi, como demonstrado, conclusão precipitada do jornal.
Feitos esses esclarecimentos, a Prefeitura de Taubaté reitera a sua confiança no bom exercício do bom jornalismo como instrumento essencial para tornar nossa cidade e nossa sociedade cada vez melhores.


NOTA DA REDAÇÃO
Ao contrário do que diz a nota enviada pela Prefeitura, OVALE não publicou informação que "não é verdade" e também não houve "conclusão precipitada do jornal". A reportagem citada na nota foi produzida por meio do exercício de um jornalismo livre, independente, crítico, plural e apartidário, como é característico desse veículo. Por isso, OVALE reafirma e sustenta todas as informações contidas na reportagem.
Além disso, é importante ressaltar que OVALE recebe com certa surpresa a nota enviada pelo Departamento de Comunicação da Prefeitura, devido aos fatos elencados abaixo:
-Em janeiro de 2023, dois meses após a Câmara autorizar a Prefeitura a contratar operações de crédito e um mês após a lei ser sancionada por Saud, a reportagem questionou o município se o contrato com a Desenvolve SP já havia sido assinado. Na ocasião, o próprio Departamento de Comunicação da Prefeitura afirmou que ainda não havia ocorrido a liberação para a assinatura do contrato, "em decorrência do débito com o CAF". Ou seja, a própria Prefeitura, por meio do próprio departamento autor da nota de agora, admitia desde o início que a dívida referente ao empréstimo do CAF impedia a celebração do contrato com a Desenvolve SP;
-Segundo ressaltado à reportagem pela própria Desenvolve SP, assim que a Prefeitura fornecer toda a documentação exigida - o que não foi feito até agora, mesmo passado mais de um ano e meio -, o processo para autorização da operação de crédito será encaminhado à STN (Secretaria do Tesouro Nacional), que analisa se os valores irão extrapolar os limites de endividamento estabelecidos pela legislação federal, com o objetivo de precaver futuros calotes. Essa análise, como dito pela Desenvolve SP, está subordinada às normas da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal). E no §10 do Art. 40, a LRF estabelece que "o ente da Federação cuja dívida tiver sido honrada pela União ou por Estado, em decorrência de garantia prestada em operação de crédito, terá suspenso o acesso a novos créditos ou financiamentos até a total liquidação da mencionada dívida". Essa situação citada pela LRF é justamente a ocorrida em relação ao empréstimo do CAF - as três parcelas que a Prefeitura deixou de pagar, que somam R$ 99,394 milhões, foram quitadas pela STN;
-Também causa certo espanto o fato de que a nota enviada pelo Departamento de Comunicação traz uma série de informações que OVALE havia solicitado ao mesmo departamento antes de a reportagem ser publicada, como a de que houve alteração na relação de projetos a serem contemplados com o recurso. No entanto, essas informações não foram fornecidas ao jornal anteriormente. Aliás, nos questionamentos feitos antes da publicação da reportagem, OVALE fez indagações a respeito do fato de as dívidas da Prefeitura impedirem a assinatura do contrato com a Desenvolve SP, e não houve nenhuma contestação do Departamento de Comunicação a respeito.
Eis os questionamentos enviados por OVALE ao Departamento de Comunicação antes da publicação da reportagem:
'Foi sancionada em dezembro de 2022 a lei 5.789, que autoriza o município a contratar operações de créditos com a Desenvolve SP - Agência de Fomento do Estado de São Paulo.
Em janeiro de 2023, após questionamento da reportagem, a Prefeitura informou que o contrato ainda não havia sido assinado, "em decorrência do débito com o CAF", referente à segunda parcela de 2022.
No primeiro semestre de 2023, o município protocolou cinco processos no Sadipem (Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios), do Tesouro Nacional. Um dos processos aparentemente está duplicado, sendo os demais nos valores de R$ 7.000.000 (reforma de prédio para implantação do Paço), R$ 20.000.000 (construção de viaduto do Una), R$ 29.000.000 (piscinões) e R$ 30.000.000 (aterramento dos postes do centro). No entanto, a Prefeitura nunca concluiu o preenchimento das informações desses processos, o que impede que sejam analisados pelo Tesouro Nacional.
Diante disso, gostaria de saber:
1) O contrato com a Desenvolve SP já foi assinado? Se sim, quando? Se não, há previsão de quando isso ocorrerá?
2) A situação financeira da Prefeitura, com a dívida do CAF - entre várias outras -, continua a impedir o município de assinar o contrato com a Desenvolve SP?
3) A relação de obras a serem financiadas com essa linha de crédito seguem sendo essas quatro citadas acima? Caso algum projeto tenha sido incluído na lista, favor detalhar a proposta e o custo estimado dela.
4) Por que a Prefeitura nunca completou o preenchimento das informações dos processos no Sadipem?'
Como fica claro, a Prefeitura foi prequestionada de todos os pontos que a reportagem abordaria. Mas, em vez de respondê-los ponto a ponto, o Departamento de Comunicação optou por enviar uma nota simples, que não questionava qualquer detalhe citado pelo jornal: 'A Prefeitura de Taubaté está comprometida em fazer o pagamento das prestações do CAF, dívidas da área da saúde com a municipalização do HMUT, entre outras assumidas pelo prefeito anterior. Todavia, os setores envolvidos estão trabalhando para prestar as informações necessárias e finalizar os processos para, em seguida, executar as obras previstas'."

Receba as notícias mais relevantes de Vale Do Paraíba e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

2 COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.

  • RONALDO GARCIA
    19/04/2024
    Deseja fazer empréstimo sem apresentar a documentação necessária, fica difícil!??? Não tem um destino correto, mudou duas vezes ou mais quais os projetos irão serão contemplados, não tem um destino certo para o montante a ser emprestado, isso prova a ingerência por parte dessa atual administração, trágica!!! A Saúde está um caus, não executou uma obra de grande expressão, sendo que a cidade carece de obras de mobilidade urbana, o trânsito não fluí, os motoristas ficam empacientes, socorro!!! Que tragédia....
  • Clebion Eli Miranda
    18/04/2024
    Pois então! Mas, e agora, José\'s ?? O primeiro, deixou uma espécie de dantesco \"Cavalo de Tróia\" ... para o segundo!! - CEM