A tributação em geral tem sido um tema recorrente na agenda do atual governo, especialmente no que tange à criação de mecanismos para aumentar a arrecadação para custeio de programas de distribuição de renda e investimentos em políticas públicas em geral.
De início, cabe uma diferenciação importante: de um lado tem-se o chamado “arcabouço fiscal” que, por meio de um projeto de lei que será apresentado ao Congresso Nacional, busca a criação de um novo regime orçamentário e de metas a ser cumprido pelo próprio chefe do executivo federal. De outro, tem-se a iniciativa do governo federal em, unilateralmente, criar formas de elevar a tributação de investimentos internacionais, agora com o foco no próprio contribuinte.
Como é a tributação de investimentos internacionais hoje?
Atualmente, as regras tributárias para o investidor pessoa física que aporta no exterior são semelhantes às aplicadas em território nacional. Na hipótese de venda com lucro de stocks, REITs e ETFs, tem-se a obrigatoriedade de apurar o ganho de capital da operação, sendo verificado a valorização cambial, custo de aquisição e o valor da venda e aplicação de uma alíquota de 15% de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).
Além disso, tem-se que eventuais valores recebidos de proventos em geral (aluguéis e dividendos) no exterior também haveriam de ser apurados de acordo com a tabela progressiva de Imposto de Renda (IRPF), indo de 7,5% a 27,5%, a depender do valor recebido e com deduções legais, sendo, em resumo, aplicável a seguinte tabela:
Entretanto, quando ocorre uma tributação no país de origem dos recursos, há uma compensação para que se evite uma bitributação. Um exemplo cada vez mais comum é a dolarização do patrimônio por meio de investimentos nos Estados Unidos.
Neste caso, como ocorre a retenção na fonte na ordem de 30% como forma do estado norte americano tributar os lucros e dividendos distribuídos por empresas lá sediadas, o investidor brasileiro que recebe tal renda internacional não terá que apurar IRPJ, justamente pela alíquota americana aplicada na fonte ser maior do que a nacional.
Quais alterações foram propostas pela MP 1.171/2023?
A Medida Provisória nº 1.171/2023, assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União no último domingo (30) e visa unificar alíquotas para tributação na modalidade de ganho de capital e de rendimentos auferidos no exterior por contribuintes brasileiros. Ou seja, com a aprovação da MP, tem-se por certo que toda renda auferida no exterior poderá ser objeto de uma tributação de IRPF que irá de 0% a 22,5%, bastando observar a base de cálculo aplicável.
Conforme exposto, a alíquota para venda de ativos no exterior era fixa no importe de 15%. Entretanto, com a promulgação da MP, a intenção do governo é a criação de uma tabela progressiva para apuração de ganho de capital, nos seguintes moldes estabelecidos no art. art. 21 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995:
Por outro lado, os rendimentos advindos de aluguéis e lucros e dividendos no exterior também tiveram uma mudança, sendo agora aplicável a seguinte nova tabela, ao invés daquela utilizada para rendas auferidas em território nacional:
Entretanto, no que tange a lucros e dividendos distribuídos por empresas norte-americanas, por exemplo, haverá a retenção na fonte do imposto devido nos EUA no importe de 30%, de modo que tal tabela acima mencionada não será aplicável quando o imposto de pais de origem for maior do que o nacional.
O grande reflexo neste ponto é justamente em instituições offshores que, em regra, não possuem tributação para a tributação de lucros e dividendos para seus sócios, sendo aplicável agora no atual cenário caso o contribuinte seja residente no Brasil.
Próximos passos
Conforme o processo constitucional de aprovação de uma Medida Provisória, disposto no art. 62 da CF, tem-se que, apesar de produzir efeitos jurídicos imediatos, a MPV precisa da posterior apreciação pelas Casas do Congresso Nacional (Câmara e Senado) para se converter definitivamente em lei ordinária.
Ou seja, ainda existe uma real possibilidade de que todas as modificações acima explicitadas sejam modificadas em qualquer uma das casas legislativas ou, até mesmo, rejeitadas.
Ademais, uma medida provisória possui prazo de validade e depende impreterivelmente do Congresso Nacional para a sua existência. Isso ocorre pelo fato de que, caso uma MP não seja pautada e votada nas duas Casas Legislativas (Câmara e Senado), ela caduca, ou seja, perde a validade.
Guilherme Del Bianco de Oliveira é advogado, possui graduação pela Faculdade de Direito de Franca e Pós-graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito, Gestão Jurídica da Empresa pela Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho e Negociação Estratégica pelo Instituto de Pesquisa INSPER. Atualmente é Sócio-Diretor do Moisés, Volpe e Del Bianco Advogados, escritório fundado há mais de 20 anos e com atuação especializada nas demandas de empresários e produtores rurais.
Carlos Eduardo Silva Jr. é advogado, possui graduação pela Faculdade de Direito de Franca e Pós-graduação em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito de Coimbra/PT e no LLM de Direito Corporativo com ênfase em Sociedades Anônimas pelo IBMEC. Sócio do escritório de advocacia Moisés, Volpe e Del Bianco Advogados.