OPINIÃO

Obsessão por viver   


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Não acredito em coincidências feitas ao acaso. Não que eu tenha sido adestrado ou convencido de ter essa visão peculiar, eu simplesmente me rendi a minha própria observação da profundidade dos diferentes campos energéticos, que influenciam os caminhos de pessoas, famílias e mesmo de países inteiros.

A densação de “acaso” aparece para mim somente quando o motivo mais profundo não é me revelado, devido a minha limitação de compreensão ou à posição que eu ocupo em relação aos sistemas envolvidos. Quando ocorre, então, eu paro e me reorganizo, pensando que não se trata verdadeiramente de acaso, mas de algo que não consigo entender ... ainda.

Exemplo disso é a notícia que caiu no meu colo, bem na semana em que elaborava o material para falar de suplementação e longevidade: Observou-se mundialmente o aumento do câncer principalmente em pessoas com menos de 50 anos de idade, com um quarto destes casos evoluindo para a terminalidade da vida.

Nunca fomos tão prósperos e abundantes, pensando na nossa história enquanto humanidade. Nunca tivemos tanto recurso, acesso à educação e alimentação. A medicina nunca foi tão adiantada, entretanto, parece que esse avanço não está se refletindo da maneira que esperamos.

As causas para isso ainda não são claras, visto que esses dados estatísticos impactam, mas são muito amplos para permitirem uma análise mais certeira. Fatores como alimentação e seus desvios (como a obesidade e alimentos ultraprocessados) devem estar envolvidos, bem como os fatores psicobiológicos, típicos das doenças psicossomáticas, entretanto, é cedo para dizer o quanto cada um responde por esse aumento e de outros fatores que podem contribuir também. Contudo, sei que nada disso é, como já disse, “por acaso”.

Por ora, trarei para a nossa atenção algo que pode ser ponderado com relação a isso. O cidadão contemporâneo, conectado na velocidade da informação, se encontra em um estado de desconexão com o próprio íntimo. Parece-me que vivemos uma grande epidemia de viver da maneira mais intensa e performática possível. Sinto nas pessoas uma urgência em preencher um vazio existencial de experiências incríveis, conquistas épicas, todas elas ocorrendo com uma frequência cada vez maior.

Qual foi a sua obra-prima deste mês? Seu momento inesquecível desta semana?

Dentre os mais jovens percebo a necessidade de ostentar esses feitos, não entre os seus íntimos, mas com o maior número possível de pessoas. Como dizem, “se não postou e curtiu, pode não ter acontecido, de fato”. Essa busca sai do saudável quando começam expondo-se a riscos, sejam físicos (escolhendo estimulantes e outros que prometem performances além do cabível) e principalmente psíquicos, quando o contato consigo mesmo e a satisfação pessoal passa antes pelo crivo e aprovação pública dos seus “seguidores”.

O nome desta postura é obsessão. Ainda que seja por algo “bom”, como o gozo da vida, a atitude obsessiva rouba da conquista o brilho e a lembrança que deveriam ser guardadas no coração, para entregar no lugar a dúvida e incerteza que escravizam: “O que vem depois? O que devo fazer agora?”, podem se perguntar corações ansiosos e inquietos.

Novamente, não sei, o quanto disso pode responder pelo quadro catastrófico que a notícia me trouxe. Nem eu, nem comunidade científica e pensante que exista o sabemos. Ainda. Só que a associação entre doença e essa nova “atitude”, acredito muito, não ser “acaso”.


Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em medicina tradicional chinesa e osteopatia

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