A proposta desta coluna de opinião não é criar textos interligados, tal como uma novela, mas o título da semana passada foi muito convidativo para que eu resistisse à tentação: eu havia escrito sobre “o jeito de falar as coisas”, sobre a escolha dos tons e palavras para comunicar as ideias e o seu impacto no assimilar pela outra parte.
Hoje vou falar do polo oposto: de como interpretamos o que recebemos, não só de pessoas, mas do ambiente como um todo e qual o impacto disso principalmente na nossa saúde.
Existe um ditado, muito simples e direto, que fala que “a mesma água quente que amolece uma batata, endurece um ovo”, ou seja, aquilo do qual somos “feitos” influencia muito nossa visão dos acontecimentos. Somos seres complexos e muitos elementos participam dessa “composição” mas, ao longo da história sempre houve tentativas de criar-se modelos que auxiliassem na compreensão mais sistemática desta “receita” de percepção humana.
Um que merece destaque é a “teoria” dos temperamentos, derivado da ideia aristotélica que somos compostos de uma combinação de elementos primordiais da natureza, representados pelos clássicos fogo, terra, água e ar, gerando por sua vez, segundo a representatividade de cada elemento, um “fluido” vital que ele denominaria de “humor”.
O humor de cada um, tal como uma receita individual específica, mostraria a tendência natural de reagir às diferentes adversidades da vida. Coléricos, por exemplo, marcados pela energia do fogo, pelo calor que dele advém, tem humores “quente e seco” e por isso tem maior iniciativa, são impulsivos, gostam de resoluções rápidas e não se prendem muito em detalhes, querendo atingir “de pronto” os seus objetivos.
Claro que, do outro lado da moeda, têm também tendência à impaciência, à intolerância e podem gerar situações de agressividade com relativa facilidade. Do ramo médico, Aristóteles observava que essas pessoas tinham maior tendência a desenvolver doenças que hoje sabemos serem baseadas em processos inflamatórios descontrolados (veja que a própria palavra “inflamatório” significa “colocar fogo”).
O indivíduo de composição oposta seria o de humor Melancólico, representado pelo elemento terra e de características “frias e secas”: paciente, passivo, afável, discreto, mas com tendência à grandes processos emocionais densos e onde é muito fácil se perder em tristeza e isolar-se em solidão.
Colocado assim é fácil de entender o exemplo de que um término de relacionamento, para o humor colérico poderá causar revolta, raiva e indignação, mas, no máximo em uma semana, nosso amigo estará novamente disponível para uma nova felicidade, ao passo que o melancólico irá iniciar uma longa jornada de culpa e redenção, que poderá marcar, de uma forma até trágica, muitos anos da sua vida.
O humor melancólico, aliás, é famoso por coexistir com certas doenças além das óbvias depressões: a tuberculose, doença ainda muito prevalente no nosso meio, é conhecida também como o mal dos poetas, por afetar pessoas com perfis psicológicos mais sombrios e reclusos.
Um humor, contudo, não é uma sentença ou determinismo. Trata-se somente de mais uma maneira de conhecer-se para, certamente, planejar um melhor tempero e implementar posturas e ações que “compensem” o que já é naturalmente fácil para cada um de nós.
Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em Osteopatia e medicina tradicional chinesa (xan.martin@gmail.com)
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Jose Antonio Bergamo 05/07/2025Excelente! Instrutivo!