OPINIÃO

Interações: medicamentosas e na vida


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Já ouviram falar de “polifarmácia”? É um termo pouco familiar para o público geral, contudo, o contexto a que ele se refere é bem comum. Reflete uma situação mais típica nos idosos, por serem eles usuários de várias medicações para compensar vários quadros de saúde ao mesmo tempo.
 
É comum, no meu consultório, quando pergunto sobre as medicações que meu cliente está tomando, ele traga consigo uma lista, tão longa quanto uma lista de compras no supermercado, com nomes das medicações e horários, para que ele não se perca.
  
“Acordo e logo tomo esta medicação para o estômago e, depois de 15 minutos, essa para a tireoide. Depois de meia hora, logo antes do desjejum, tomo esse para pressão, para diabetes... “– assim vai falando em ordem e atento, tal como o sacristão desfia um terço em reza. Confesso que a frequência com que essa cena se repete me entristece um pouco, pois verifico, tal como um colega geriatra comentou comigo certa vez, “o idoso por vezes toma mais medicações do que come”.
 
Porém, a situação inspira dois outros alertas, que acho muito útil tratar aqui: primeiro, a polifarmácia, tal como descrita acima, abre as portas para interações medicamentosas indesejáveis. É tecnicamente impossível (acreditem em mim) prever todas as interações medicamentosas com tantos remédios juntos em uma mesma pessoa.
 
Nós, médicos, estudamos as interações mais comuns e procuramos evitá-las, mas elas ocorrem sempre, variando em forma e intensidade conforme a pessoa que recebe a combinação, segundo as doenças e deficiências prévias que ela tem e mesmo com a comida ou grau de estresse que esse indivíduo é submetido. Trata-se de uma ilusão achar que é possível analisar tudo isso junto.
 
Então, é muito importante o paciente fazer uso da sua autonomia e autoridade sobre a própria saúde e se questionar, de tempos em tempos, sobre o papel de cada um dos remédios que está usando. Hoje acredito que o serviço mais importante que eu faço, quando possível, é a “desprescrição”, ou seja, retirar medicações quando a ação delas está pouco colaborando para o bem-estar geral. Especialmente em idosos, “menos é mais”.
 
O que me leva ao segundo ponto de importância, desta vez bem reflexiva: tal como na prescrição dos nossos remédios, que deveriam sempre nos ajudar, existem vários elementos no nosso campo energético com forças e atuações. São emoções, crenças e até mesmo traumas e cicatrizes que adquirimos durante nossa jornada da vida.
 
Algumas destas “concentrações de energia” faziam muito sentido quando surgiram, tal como um antitérmico faz razão onde há uma febre alta demais que precisa ser controlada. Contudo, depois que a doença e a febre passam, não há motivo para continuar tomando o antitérmico regularmente.
 
Você se frustrou com um relacionamento abusivo? É bem natural que isso acorde certas feridas que carregamos e cause dor o suficiente para mudarmos nossos hábitos e nos tornemos mais cautelosos para escolher nossas companhias e parcerias. Natural e útil para evitar que a situação se repita, mas é só.

A coisa se torna um trauma quando não conseguimos nos desvencilhar emocionalmente do ocorrido, gerando uma paralisia de medo em tudo o que fazemos adiante. Caso você carregue algo assim consigo, sugiro, como bom médico, que considere a “desprescrição” daquilo que não lhe presta mais.

Alexandre Martin é médico especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)

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