OPINIÃO

Como é a relação com o seu trabalho?


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Existe um ditado promulgado pela tradição da Cabala, que é uma ramificação esotérica e mística do Judaísmo, que versa da seguinte forma: "todo pai tem obrigação de ensinar ao seu filho três coisas, na vida: O Torá, uma profissão e a nadar" . Eu acho isso uma pérola de sabedoria.

Muito pode ser dito a respeito disso, onde cada uma das tarefas paternas na frase tem uma grande interpretação, em diferentes níveis de entendimento, como é típico dessa tradição esotérica, mas, para este texto, quero enfatizar que a profissão foi colocada lado a lado com algo que é da mais alta importância para os participantes da egrégora judaica e cabalista: o Torá, as escritas sagradas, a palavra de Deus.

Isso mostra o quão relevante para a vida é o conhecimento profissional, que vai direcionar a força de trabalho de cada um e é um pilar essencial para a aceitação do indivíduo na sua vida em sociedade. Como pai, conforme o dito, deve-se dar ao filho condições de oferecer algo para o grupo em que se vive e ser merecedor de receber deste mesmo grupo o sustento e o acolhimento.

Esse ditado não poderia ser mais verdadeiro, nos dias de hoje, quando a vida profissional ocupa quase tanto tempo quanto dispomos para a nossa vida relacional e mesmo para o próprio lazer. Algumas vezes, nossa profissão é tão presente e tão próxima, que chega a ser confundida com a própria identidade, como no caso de alguns colegas que, ao se apresentarem, se referem como "sou o doutor fulano de tal".

Não acredito que essa seja uma relação muito saudável com o nosso próprio trabalho, dada a proximidade excessiva dele com algo tão genuíno e único como é a nossa própria identidade. Com os anos pode se tornar tóxico para o próprio indivíduo se confundir e misturar a própria existência com o exercício da sua função social e "utilidade". Isso é algo muito notável quando, por qualquer motivo que seja, se pretende trocar de profissão ou mesmo aposentar-se do que fez durante anos à fio.

Contudo, admito que existe essa tendência, já que, como o ditado mostrou, o exercício da nossa profissão é um poderoso caminho para a nossa colocação no mundo.

O trabalho é o mecanismo do fluxo de troca, a manifestação mais tangível e palpável da lei de compensação e equivalência, que garante o equilíbrio entre sacrifício e recompensa no nosso cotidiano mais corriqueiro. Por isso, exercê-lo não pode ser penoso ou gerar algum tipo de arrependimento ou rancor. Trabalho pode cansar, mas não pode desgastar. Pode agitar e consumir o corpo, mas comprometer o bem-estar e gerar ferimentos energéticos ou emocionais são sinais de tomar atenção.

Caso ocorram, podem ser indicativos que essa "troca" está desequilibrada, nos doando mais do que deveríamos sem receber a mesma proporção de volta, causando muita insatisfação ou, ainda, estamos nos enganando, esperando um "algo diferencial"  como um retorno que na realidade não pode ser obtido por intermédio do ambiente laboral, criando um problema que se atrela ao que falei antes, a confusão da persona profissional com necessidades de outros campos da vida.

Vale a reflexão para que sempre possamos nos ajustar dentro da nossa expressão e dela retirar o que há de melhor, de maneira pura, justa, equilibrada e … sem ilusões.

Alexandre Martin é médico especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)

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