Será preciso algo ainda mais catastrófico do que os fenômenos extremos que já experimentamos, para que façamos a transição energética imprescindível à nossa salvação. O bicho-homem é um ser destruidor. Mata as outras espécies, inclusive a sua, e desnatura a natureza. A mudança climática é a única real grave ameaça, capaz de extinguir a vida no planeta.
Se houver futuro, os sobreviventes lamentarão a insânia das atuais gerações, que não tiveram coragem de banir o uso do carvão e demais combustíveis fósseis e de investir pesadamente na busca de alternativas.
Uma delas é o hidrogênio. Ele é multiforme. O hidrogênio verde é o produzido pela eletrólise da água, que pode ser do mar. Por esse processo, o hidrogênio é separado do oxigênio por uma corrente elétrica, vinda de fonte renovável, como a eólica ou solar. O hidrogênio branco, também chamado natural, devido à sua pureza, é produzido naturalmente na crosta terrestre. Fonte potencial de energia limpa, gerada continuamente pela Terra. Os reservatórios se formam quando a água aquecida encontra rochas ricas em ferro.
O hidrogênio azul é produzido pela "reforma a vapor". Deriva do gás natural, combustível fóssil, capturado nas chaminés das indústrias. A maior parte do CO2 emitido no processo é capturado e armazenado no subsolo. Há também o hidrogênio cinza, igualmente extraído do gás natural. A diferença é que as tecnologias não capturam o gás carbônico e ele é liberado para a atmosfera. É o menos ecológico dos hidrogênios.
Hidrogênios rosa e roxo, são produzidos pela eletrólise da água o roxo se faz mediante uso de energia nuclear e calor, por meio da divisão combinada da eletrólise quimiotérmica da água. O rosa se produz por eletrólise da água, usando eletricidade de usina nuclear. Os hidrogênios marrom e preto, produzidos a partir do carvão, são dois outros tipos. Mas são considerados poluentes.
Quais os estudantes do Ensino Médio que hoje têm aulas a respeito da transição energética e que tomam conhecimento de que é urgente, no Brasil, a utilização do hidrogênio? As desculpas são as mesmas: ainda existe petróleo em abundância. Os processos para a produção de hidrogênio são caríssimos.
Mais importante do que autorizar prospecção de petróleo na foz do Amazônia, aumentar os dividendos da Petrobrás, anistiar grileiros, dendroclastas e exploradores de minerais em demarcações indígenas e em reservas ambientais, é investir em pesquisa. Converter a educação defasada, anacrônica e decoreba, em forma de despertar a curiosidade da infância e da juventude para o estudo e o aprofundamento em ciências duras. Física, matemática, química, geologia, biologia, botânica, tudo aquilo que salva a humanidade e o planeta.
O ensino pífio de humanidades superficiais, a formação de gerações desacostumadas aos desafios, incapazes de se adaptar às profundas mutações estruturais advindas da dinâmica das mais modernas tecnologias é insuficiente para salvar a Terra.
Se os docentes se devotassem a conscientizar infância e juventude sobre os riscos a que a humanidade está exposta em virtude de sua inconsequência, egoísmo e ignorância, já cumpririam imenso papel na transformação do mundo. É urgente desenvolver as capacidades socioemocionais, negligenciadas em favor de um ensino que prioriza a memorização e não prepara os jovens para a árdua luta que enfrentarão logo mais. A vez é do hidrogênio, não da decoreba superficial e inútil.
José Renato Nalini é reitor de universidade, docente da Pós-graduação e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras (jose-nalini@uol.com.br)