OPINIÃO

A imprevisibilidade do Dinizismo

08/11/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Inegavelmente, Fernando Diniz é um treinador revolucionário, amado e odiado por muitos. Claro, qualquer unanimidade é utópica e burra, ainda mais no futebol (que mexe com paixões), e por isso o técnico é tão questionado.

Desde o seu tempo de Votoraty, a pequena equipe da 3ª divisão estadual, passando pelo Paulista de Jundiaí (onde ganhou a Copa Paulista), chegando ao vice-campeonato regional pelo Audax (eliminando o São Paulo FC e perdendo para o Santos FC), Diniz foi testando seu modelo de jogo. Alguns viam nele o tik-tak criado por Pep Guardiola no Barcelona, mas na verdade nunca foi isso.

O "Dinizismo" (como se tem chamado o jeito de jogar dos times que ele treina) é baseado em intensa troca de passes e posse de bola, permitindo uma maior liberdade para o atleta driblar (uma variação do já citado tik-tak). Para isso, todos os atletas devem ter boa habilidade com os pés (especialmente o goleiro) e espírito coletivo em campo. Ou seja: não é fácil essa proposição de jogo.

Havia um mito no futebol de que "o trabalho de Diniz era de 6 meses": ele chegava, inovava, conseguia resultados mas depois se "auto-sabotava" criando um clima ruim nos vestiários – e isso não é verdade.

O que ocorre (e não se discute) é que Fernando Diniz (desde os tempos de jogador) sempre foi temperamental. E para isso, pasmem, fez até uma faculdade de psicologia para tentar se entender e se auto-equilibrar. O problema supostamente de relacionamento se dava pela cobrança da falta de títulos e da imprevisibilidade dos resultados. E explico: quando esteve no São Paulo, chegou a liderar o Brasileirão com 7 pontos de vantagem, mas a real necessidade de entendimento do jogo (ou se preferir: entrosamento) proporcionava que se numa partida o Tricolor goleasse, havia chance de ser goleado em outra. Assim, a maturidade do trabalho de Diniz carece necessariamente de tempo.

Ele não teve tempo no Morumbi; idem a suas passagens no Santos e no Vasco. Quem confiou nele e lhe deu carta branca foi o Fluminense.

No começo da Taça Libertadores da América, era razoável crer que o elenco milionário e badalado do Flamengo poderia festejar sua 4ª conquista no Maracanã. Ou o Palmeiras, ou o River Plate (outros endinheirados do continente). O Fluminense, cá entre nós, era uma "zebra". E foi uma zebra agradável! Afinal, goleou o River Plate e venceu o Boca Juniors, os dois grandes rivais hermanos que temos, em se falando nas competições de clubes.

Por isso que se deve louvar o Dinizismo (em clubes, com tempo de trabalho, sem pressão). Mas ao mesmo tempo, preocupa-me esse jeito de jogar na Seleção Brasileira. Afinal, os jogadores se reúnem num dia, treinam em outro e jogam no seguinte. Fazer com que se entenda o modelo de jogo sem uma intensa pré-temporada é muito problemático.

Será irônico ver as contestações: Diniz, até pouco tempo atrás, não tinha título de expressão internacional (e agora tem). Se não vencer seus adversários na próxima rodada das Eliminatórias da Copa do Mundo, será novamente questionado (como foi após a derrota para o Uruguai)?

Veremos, portanto, o que é a paixão do torcedor: o treinador que era xingado há 20 dias pela derrota com a Seleção, é louvado pela conquista da Libertadores. E assim que perder um jogo pelo Brasil, novas reclamações...

Que Diniz seja um novo Telê Santana dos nossos dias: de "pé frio" a "vencedor".

Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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