"...Acordei muito tarde hoje, já são sete e meia!...", disse minha mãe, em meu telefonema matinal quase que diário desde que ficou viúva, há pouco mais de um mês. Ela, que sempre se orgulhou de ter trabalhado sem descanso, desde os – pasmem, leitores – seis anos de idade, agora vê-se diante de uma realidade, após setenta e três dos setenta e nove já vividos, completamente oposta à aquela que até então estava habituada.
Mesmo sendo alertada, sempre sentiu dificuldade em lidar com a compreensão da necessidade da prática curativa e protetiva da saúde mental, que é o descanso. Essa introdução tem a intenção de discutir e conscientizar sobre uma outra questão, que é lugar do "não" descanso em nossa existência.
A vida de minha mãe não foi pior que a de muita, mas de muita gente mesmo, com foco principal em mulheres que conheci e que conheço. Fui criada escutando que acordar tarde, dormir até mais tarde, é coisa de preguiçoso. Aposto que você também já escutou isso em algum momento.
No diálogo com ela pelo telefone, que ocorreu poucos dias antes da data da publicação deste artigo, expliquei-lhe que agora, livre do stress permanente em que vivia, seu sistema corpo/mente estaria então iniciando o processo de volta à homeostase, termo que define a capacidade do nosso organismo de manter-se com certa estabilidade.
Ou seja, o retorno do corpo ao seu estado basal de equilíbrio saudável que nos permite e proporciona verdadeiro bem-estar. E que não há mal algum permitir que o organismo descanse quanto nos pede, seja em forma de pausas de atividades de rotina de trabalho ou obrigações, seja dormindo até mais tarde.
Somos uma máquina perfeita que necessita que cada variável esteja completamente ajustada para que o funcionamento dos órgãos ocorra de maneira correta. E isso inclui o que há tempos nos ensina a Medicina, a Psicologia e a Neurociência. Através dos estudos mais modernos existentes, esses campos científicos ensinam sobre os pilares da saúde mental que são a alimentação, a hidratação, o movimento, o sono e o silêncio. Estes dois últimos, possíveis de serem vividos em plenitude somente quando, adivinhem? Nos permitimos merecido descanso!
Alguns autores famosos e estudiosos do assunto já traduzem esse comportamento como "ócio criativo" ou seja, praticar o nadismo... Isso mesmo, o fazer nada! Nossa sociedade, sobretudo a ocidental, especializou-se em encarar o ócio, o ter nada para fazer como algo pernicioso, proibitivo, impraticável e passível de julgamento, inclusive moral, em um mundo cada vez mais caótico e sobrecarregado.
E então, ao longo da vida, aprendemos que descansar é ocupar o tempo fora do trabalho ou das rotinas diárias e de responsabilidades com atividades quase que ininterruptas. Ou alguém que leu até aqui é capaz de negar que nunca tentou ou conhece alguém que, após um dia longo de trabalho, escolheu "descansar", maratonando séries de tv e depois acordou na madrugada com torcicolo?
Qual é o lugar então, para você, do descanso protetivo do sistema corpo mente? Se ainda não o colocou em prática, recomendo, em nome da sua saúde física e mental, além de longevidade e bem estar, que comece o quanto antes. E, caso ainda desconfie que isso possa não surtir o desejado efeito positivo, apenas experimente observar os exemplos que você conhece. De pessoas que nunca param, nunca se permitem uma pausa, um descanso. E então venha me contar o que observou!
Márcia Pires é Sexóloga e Gestora de RH (piresmarcia@msn.com)