
A nomeação do vereador Luiz Cirilo (Podemos) para a Secretaria Municipal de Habitação de Campinas oficializa uma movimentação política que vinha sendo cantada desde o final das eleições de 2024. Trata-se menos de uma surpresa e mais da conclusão de um compromisso firmado entre o grupo de Dário Saadi (Republicanos) e o Podemos, que agora se consolida como uma das forças mais relevantes na composição do Executivo municipal.
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Cirilo, nome tradicional do Legislativo campineiro, inicia um novo ciclo no Executivo, após cinco mandatos consecutivos na Câmara. Ele chega com o objetivo de dar novo fôlego à pauta habitacional, marcada por desafios históricos como regularização fundiária, projetos de moradia popular e reestruturação da Cohab, que seguirá sob comando de Arly de Lara Romeu, agora exclusivamente na presidência da companhia.
A separação entre a Cohab e a Secretaria foi, dessa vez, habilmente construída por meio de projeto de lei complementar, aprovado recentemente pela Câmara Municipal. Na prática, a manobra abriu mais um cargo no alto escalão para abrigar aliados, e usa um modelo similar das estruturas da Saúde (com a Rede Mário Gatti) e Transportes (com a Emdec). A medida dá margem para uma gestão mais técnica e focada — ou, ao menos, é esse o discurso oficial.
A chegada de Cirilo também representa um reforço institucional ao Podemos, partido que emergiu das eleições com três cadeiras no Legislativo e já ocupava a Secretaria do Clima, com Adegas Jr. Agora, com dois nomes no secretariado, o Podemos se firma como uma das principais âncoras da base de Dário Saadi, ao lado de Republicanos, PSD e PSB.
Com a saída de Cirilo da Câmara, assume a cadeira o suplente Gilberto Leão de Araújo, o Mineiro do Espetinho, que teve 4.441 votos. A mudança altera minimamente o equilíbrio interno da base, mas reforça a tendência de recomposição e fidelização de apoios políticos para a reta final da gestão, especialmente com as pautas impopulares em curso, como os reajustes salariais no alto escalão.
Em resumo, a posse de Cirilo não é apenas uma troca de cargos. É uma peça importante no tabuleiro político da cidade, com foco em estabilidade na base e reconfiguração estratégica de forças.
Mineiro do Espetinho toma posse
Com trajetória marcada pelo empreendedorismo e raízes no Distrito do Ouro Verde, Gilberto Leão de Araújo, o Mineiro do Espetinho, é o novo vereador de Campinas e deve assumir o cargo nesta quarta. Primeiro suplente do Podemos, ele entra na vaga deixada por Luiz Cirilo, que passa a comandar a Secretaria Municipal de Habitação.
Mineiro do Espetinho tem 54 anos e foi eleito com 4.441 votos nas eleições de 2024, ficando como suplente imediato do partido. Conhecido por comandar duas lojas de espetinhos que levam seu apelido, ele é uma figura conhecida, especialmente no Ouro Verde, onde mora desde 1978.
Empresário e católico, Mineiro chega à Câmara com discurso de “trabalho, fé e dedicação” e promete usar sua vivência nos bairros e no comércio para defender pautas ligadas à geração de empregos, valorização das periferias e apoio ao empreendedorismo popular.
Cargos, cargos e mais cargos
Mais uma vez, a sanha da Câmara de Campinas em ampliar a estrutura de cargos comissionados se transforma num problema jurídico e político de grandes proporções. O inquérito civil aberto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo para investigar o contrato de R$ 2,25 milhões com a Fundação Instituto de Administração (FIA) expõe a pressa dos vereadores em reeditar uma fórmula já desgastada: aumentar o número de assessores nos gabinetes e fortalecer o poder da Presidência da Casa — ainda que, para isso, pisem numa casca de banana colocada por eles mesmos.
O ponto central da apuração é a dispensa de licitação e a escolha da FIA, que apresentou proposta R$ 960 mil mais cara do que outra instituição, além da antecipação de 30% do valor sem justificativa clara, segundo a denúncia. Para o MP, a operação levanta suspeitas de direcionamento e eventual improbidade. A Câmara nega.
Mas o que realmente chama a atenção é o conteúdo do projeto encomendado pela própria Câmara, cuja suspeita de bastidor é clara: ampliar os cargos de livre nomeação nos gabinetes, retomando um formato já condenado anteriormente. A farra só aumenta.
Esse movimento é sintomático. Desde a última década, a Câmara campineira foi alvo de sucessivas ações do Ministério Público questionando o excesso e a estrutura dos comissionados, o que resultou em cortes e reestruturações para garantir proporcionalidade e respeito ao concurso público. Ainda assim, os parlamentares seguem tentando burlar o limite, criando “atalhos técnicos” com roupagem de reestruturação administrativa.
O discurso oficial tenta justificar a medida com modernização e eficiência, e a contratação da FIA é usada como escudo. Mas, nos bastidores, a real motivação parece ser a mesma de sempre: mais cargos para distribuir e acomodar interesses políticos, com impacto direto sobre servidores efetivos, que podem perder atribuições ou espaço de atuação.
A tentativa de mostrar que o processo foi transparente e respaldado não esconde a essência do problema: o Legislativo gerou um problema jurídico por buscar uma saída institucional para um desejo político — inflar sua própria estrutura. O histórico da Câmara, com casos semelhantes, não ajuda a conter a percepção de que há uma reincidência camuflada de decisões já condenadas pela Justiça.
- Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.