VICIANTES

Bolinhos de chuva

Redondos, às vezes com uma pontinha espevitada, os bolinhos de chuva aparecem sempre multiplicados, porque poucos não bastam

10/05/2020 | Tempo de leitura: 4 min

Ingredientes

3 ovos

2 xícaras (chá) de farinha de trigo

1 colher (sopa) de fermento

1 xícara (chá) de leite

1/2 xícara (chá) de maizena

4  colheres de açúcar

Óleo para fritar

 

Nessa quarentena a que fomos forçados para preservar nossa saúde e não contribuir para arruinar a dos outros, a cozinha tem sido mais visitada pelas avós do que o normal. Várias  amigas me dizem que  preparam  guloseimas para alegrar os netos fechados em casa ou para  os que estão longe  delas, e  a quem  chegam como presente para o lanche da tarde. Neste contexto,  os bolinhos de chuva são unanimidade. Dourados e perfumados, com  o delicioso aroma  de canela em pó misturada a açúcar,fazem as vezes de declaração de amor.

Fórmula antiga da culinária doméstica, feito  com ovos, farinha ,açúcar,  leite e  fermento,  o  bolinho de chuva  tem nome que não o restringe a dias pluviais, seu passe é  livre para ser saboreado  em qualquer tempo. Também não escolhe idade; embora seja frequentemente associado à infância, é devorado por adultos que mantêm dentro de si  a criança que foram.

Em nosso país, ele  começou a aparecer  com a popularização do trigo em meados do século XIX, e num resgate do sonho, guloseima típica da doçaria lusitana.  O folclorista Luís da Câmara Cascudo  menciona  essa herança culinária em sua obra “História da Alimentação no Brasil”. Descreve  os sonhos nas bandejas  cercadas  por carreiras  de açúcar fino e  canela em pó. A diferença é que os sonhos portugueses, produzidos com fermento biológico,  eram bem maiores que os bolinhos e tinham recheio, um tipo de creme pasteleiro feito com gemas, leite, açúcar e baunilha. No Rio de Janeiro de Machado de Assis, apareciam no tabuleiro das africanas que obtinham dos patrões umas horas para vendê-los nas ruas cariocas, desde que dividissem o lucro com eles.

Mas a fama do bolinho  cresceu mesmo foi com Monteiro Lobato, que o adorava e o transportou para a cozinha do “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, obra lida por gerações de crianças brasileiras, desde que lançada nos anos 40 do século passado. E quem, senão a personagem Tia Nastácia, cozinheira do Sítio, para prepará-los? Eles ficavam tão saborosos que quando Narizinho, Emília e Pedrinho sentiam o cheiro da fritura doce invadindo a casa, já corriam para a cozinha, ansiosos por vê-los  retirados da panela, escorridos  na peneira e depois passados pelo açúcar. Tinham tal fama os bolinhos de Tia Nastácia que  até salvaram  os  moradores   daquele universo mágico de serem  dizimados pelo Minotauro,  monstro mitológico  importado da Grécia graças aos predicados da grande contadora de histórias  Dona Benta.  “Pegou um, e outro e outro, e comeu a peneirada inteira. Depois me apontou para o fogão num gesto que entendi que era pra fazer mais (…). Acabou completamente manso, esqueceu até a mania de comer gente (…). Pois é, foi o bolinho que me salvou”,suspirou a cozinheira depois de ser libertada do labirinto do monstro.

Quando lhe pediam para contar o segredo, ela avisava: “Receita, dou; mas a questão não está na receita – está no jeitinho de fazer”. De fato, na vida real os ingredientes são sempre os mesmos, poucos e prosaicos. Mas é a forma de reuni-los, obter a textura correta e- principalmente- fritá-los, que vai garantir um bolinho fofo e enxuto, ao invés dos engordurados que não têm graça nenhuma e são indigestos.

Para fazer bolinhos inesquecíveis, use bons ingredientes. Comece  batendo  os ovos, claras e gemas, com um fouet ou garfo, e depois junte o açúcar. Volte a bater até a mistura ficar homogênea. Acrescente aos poucos  a farinha de trigo  peneirada  com o fermento  e  a maisena,  alternando com leite.  A maisena deixa o bolinho sequinho e o fermento peneirado junto com a farinha permite que se espalhe igualmente  por toda a massa. Se for necessário, junte mais farinha, pois  a massa não deve escorrer da colher e sim ficar aderente a ela. Se ficar muito mole, encharca; muito dura, pode não fritar dentro.  Esse é o segredo.

Em uma panela média despeje óleo de milho em quantidade suficiente para que o bolinho fique boiando. Deixe ficar bem quente. Use duas colheres para formatar a massa e colocar no óleo. Baixe a chama e frite em fogo baixo. Se a massa estiver perfeita, o bolinho vai fritar de um lado e automaticamente virar do outro. Por isso ele é chamado em algumas regiões  brasileiras de “vira-cambota”. Se ele não virar sozinho, ajude-o com uma colher. Frite aos poucos, de quatro em quatro. Quando dourados, estarão  no ponto de tirar com espumadeira. Coloque sobre papel absorvente  a fim de escorrer o excesso de óleo. Logo em seguida passe o bolinho no açúcar e na canela. Sirva com café coado  na hora. Ô delícia!

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