OPINIÃO

Promiscuidade política no Brasil: o túmulo de Montesquieu

Por Marcos Cintra | O autor é Doutor em Economia por Harvard, é atualmente professor titular da Fundação Getúlio Vargas
| Tempo de leitura: 2 min

O governo Lula, em outubro passado, escancarou a farsa da política brasileira. Dois ministros, André Fufuca (Esporte, do PP) e Celso Sabino (Turismo, do União Brasil), permaneceram nos cargos mesmo após seus partidos declararem oposição ao Planalto, numa ginástica de lealdades que desafia a lógica.

Acordos espúrios mantêm essa "geleia geral", onde base e oposição se misturam como água suja, sem distinção. A separação de poderes, pilar de qualquer democracia, é uma piada cruel. Executivo e Legislativo barganham ministérios e emendas como se o Brasil fosse um mercado de pulgas, enquanto o Judiciário, ativista e intocável, legisla disfarçado de árbitro. O interesse nacional? Relegado ao último lugar, soterrado por privilégios de uma elite que trata o Estado como herança particular. Somos o "país dos coitadinhos", onde direitos – ou melhor, favores – de poucos prevalecem sobre o bem comum.

Charles-Louis de Montesquieu, que teorizou a separação de poderes, deve se contorcer no túmulo. Em O Espírito das Leis (1748), ele alertou: "Quando o poder legislativo e o executivo se reúnem, não há liberdade." No Brasil, essa fusão é rotina. O Centrão, com sua voracidade, troca apoio por cargos e verbas, enquanto o Planalto cede para evitar CPIs. O resultado é um patrimonialismo descarado, onde o público vira butim privado. Raymundo Faoro, em Os Donos do Poder (1957), descreveu isso como "a fusão do Estado com a sociedade pela dominação burocrática". Décadas depois, sua análise segue cruelmente atual: ministérios viram feudos, e a nação, refém.

Essa promiscuidade não é acidente; é método. A governabilidade, tão alardeada, é apenas cleptocracia maquiada. O povo paga a conta com inflação que corrói salários, saúde em colapso e escolas sucateadas. Lula, que já posou de ético, agora dança com oportunistas, enquanto Fufuca e Sabino, meros peões, simbolizam a falência moral de um sistema. A crise não é só políticta; é civilizacional. O Brasil precisa de reformas urgentes: fim das emendas secretas, candidaturas independentes de partidos e um Judiciário que julgue, não legisle. Sem isso, continuaremos a ser um país onde a república é um mito, e a democracia, um teatro de sombras.

Montesquieu via a separação de poderes como a base da liberdade política. Aqui, ela é um cadáver pisoteado por interesses mesquinhos. É hora de o Brasil acordar, romper essa geleia tóxica e colocar o interesse coletivo acima dos conluios. Do contrário, o túmulo do barão de La Brède será também o nosso.

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