
Acompanhar a frequência escolar e combater a evasão podem ser a chave para reduzir a entrada de jovens no crime em Bauru. Essa é uma das avaliações de Glauber Woida, assistente social especialista em gestão de políticas públicas e professor de Serviço Social e Processo de Trabalho da Instituição Toledo de Ensino (ITE), para quem existe falha em diferentes aparatos estatais, especialmente os da Educação, quando o número de infratores aumenta.
A posição de Woida veio em resposta à matéria publicada pelo JC em março, segundo a qual existe uma mudança estrutural em curso no crime organizado, que estaria abandonando a gestão dos pontos de vendas de drogas. As chamadas "biqueiras" passaram a ser assumidas por jovens da cidade, conforme informações de Marcelo Bertoli Gimenes, delegado titular da 2.ª Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes (2.ª Dise) da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic).
Segundo o professor, o abandono escolar já deveria ser um alerta para o poder público. "Se um adolescente está vendendo droga às 3h da tarde, é porque ele não está na escola. A pergunta é: por que esse aluno não foi localizado pela rede de proteção?". O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) obriga a matrícula e a frequência escolar de crianças e adolescentes. Quando o aluno deixa de comparecer, a unidade de ensino deveria notificar a ausência e acionar os responsáveis, defende.
"A escola é o primeiro agente. Se a frequência não é cumprida, a gestão escolar precisa agir, contatar os pais, mobilizar a rede de proteção. Essa omissão abre espaço para o aliciamento pelo crime", afirma.
A fragilização dos laços familiares é outro ponto responsável por empurrar os jovens para a infração. "A lei obriga os pais a mandarem seus filhos para a escola. Ele não pode falar que não tem mais gerência sobre a vida dos filhos. Descumprir essas obrigações pode gerar, inclusive, pagamento de multa".
"Quando os pais não cumprem sua função de proteger, sustentar e educar, o adolescente fica vulnerável", explica. O especialista também destaca o papel da assistência social. "Se a família está em situação de vulnerabilidade, é dever do Estado oferecer apoio psicológico e social para que possa exercer sua função protetiva", complementa.
A vulnerabilidade econômica e social que muitas enfrentam é um fator que ajuda o crime a aliciar esses jovens. "A obrigação da família é garantir o sustento, a guarda e a educação. Quando essa família, por exemplo, não tem renda, ela fica sem condições de prover o sustento básico, alimentação, vestuário, objetos de lazer. Diante da carência, os adolescentes expostos a uma comunidade que está organizando um ponto de vendas de drogas, podem acabar se iludindo. Eles acham que ao entrar nesse mercado, podem ganhar dinheiro para adquirir seus bens de consumo", comenta o pesquisador.
EFICIÊNCIA
Experiências anteriores do assistente social mostram que a atuação integrada do poder público pode reverter esse cenário, desde que feito com eficiência. Ex-conselheiro tutelar em Lençóis Paulista, Woida relata que, entre 2013 e 2017, o município viu uma diminuição de ocorrências de tráfico de drogas. Isso porque, houve uma resposta do poder público que envolveu ações coordenadas em educação, profissionalização, saúde e responsabilização, na cidade com 68 mil habitantes atualmente.
"Conseguimos reduzir a criminalidade juvenil quando o Estado passou a cumprir sua parte. Reduzimos evasão escolar, ampliamos o acesso ao primeiro emprego e aplicamos medidas socioeducativas quando necessário. A sensação de impunidade também precisa ser combatida", afirma.
Ele destaca a importância do acompanhamento contínuo da família, inclusive nos casos de internação. ""O trabalho socioeducativo na Fundação Casa, quando articulado com os serviços de acompanhamento dos pais, executado a pela secretaria municipal de assistência social, pode reverter trajetórias de risco dos adolescentes", enfatiza.
PROGRAMAS SOCIAIS
Para o pesquisador, programas de transferência de renda, especialmente o Bolsa Família, têm impacto direto na redução da criminalidade. "Eles atuam rompendo o ciclo intergeracional da pobreza. A principal lógica por trás do programa é a garantia de direitos básicos, como alimentação, educação e saúde, para famílias em situação de vulnerabilidade. Um dos elementos centrais do programa são as condicionalidades, entre elas a frequência escolar obrigatória. Isso significa que, para continuar recebendo o benefício, a família precisa garantir que as crianças e adolescentes estejam matriculados e frequentando a escola", diz
"Essa estrutura cria um mecanismo de proteção social que ajuda a evitar a evasão escolar — um dos principais fatores de risco para o envolvimento de adolescentes com a criminalidade. Ao manter o adolescente na escola e ao mesmo tempo oferecer um mínimo de segurança alimentar e estabilidade financeira à família, o programa reduz as pressões que poderiam levá-lo ao trabalho informal, à rua ou à criminalidade", finaliza o especialista.