
Takemi Fugiwara tinha 32 anos quando foi convidada para trabalhar na Unidade Centrinho, referência internacional nas áreas de anomalias craniofaciais e saúde auditiva, que atualmente integra o complexo do Hospital das Clínicas Bauru (HC) de Bauru. Ela ficou por dois anos como estagiária e foi efetivada em janeiro de 1985. Passou por alguns setores antes de chegar ao Serviço de Educação e Terapia Ocupacional do HC, onde descobriu, por acaso, um talento: o de acalmar os bebês que se preparam para passar por cirurgias na instituição.
Nem ela própria sabe explicar como, mas os pequenos relaxam e dormem em seus braços, mesmo em jejum por conta das operações, situação que costuma provocar muito choro. Pelo poder do acalento, a técnica de apoio educacional, hoje com 74 anos, tornou-se conhecida como "a encantadora de bebês".
Filha do mecânico Massanosin Fugiwara e da dona de casa Toio Fugiwara, ambos já falecidos, Takemi nasceu na cidade de Agudos (26 quilômetros de Bauru) em 1951 e se mudou para a Cidade Sem Limites tão jovem que não consegue lembrar-se da idade.
Takemi já recebeu um troféu do próprio Centrinho como uma homenagem e agradecimento pelos serviços prestados. Ela destaca, porém, que o maior reconhecimento é, sem dúvidas, a gratidão que recebe dos pais das crianças que passam por procedimentos no hospital.
Ela vai se aposentar no ano que vem e está se despedindo, com o coração pesado, do local que trabalha há 42 anos. Ela considera a equipe da instituição sua família e é bastante querida pelos profissionais do HC. Ao JC, ela relembra momentos marcantes de sua trajetória, revela sua rotina e orgulhos que acumulou ao longo dos anos:
JC - Como é sua rotina? Quais são suas principais atividades?
Takemi - Quando os pacientes vão para cirurgia, as mães ficam aqui. Para ajudar na espera, oferecemos atividades de produção de artesanatos. Os pais aprendem a fazer crochê, laços e outras peças aqui. Soube que alguns passam a vender essas peças posteriormente. Uma vez soube de um pai que foi convidado para dar um curso em Brasília para outras pessoas. Ele disse que queria fazer gratuitamente, mas incentivei que ele cobrasse pelo serviço porque precisava daquela renda.
JC - Como aprendeu estas artes?
Takemi - Tudo que eu sei, aprendi por aqui. Muitos anos atrás uma mãe me ensinou a fazer crochê, por exemplo, e eu passei a ensinar as outras pessoas. É um espaço de troca, em que aprendo e ensino. Eles se distraem.
JC - Como começou sua jornada no hospital? O que a motivou a trabalhar nessa área?
Takemi - Comecei no Projeto Rondon, em 1983. O tio Gastão, fundador do hospital, convidou a gente para ensaios aos domingos. Em maio do mesmo ano, uma funcionária precisou sair, e me ofereceram um estágio. Fiquei dois anos como estagiária e, em 1985, fui registrada.
JC - Você tem uma habilidade especial para acalmar bebês antes da cirurgia. Como isso começou?
Takemi - Não sei explicar. As mães perguntam: "O que você fez para ele dormir?". Eu brinco: "Belisquei". Mas, na verdade, canto aquela musiquinha do "Meu Ursinho Pimpão" [do Balão Mágico]. Seguro a criança na posição certa e ela se acalma. Não pode ficar arrumando muito o bebê. Mesmo com o cansaço, tem que manter a mesma posição.
JC - Como você identifica as necessidades dos bebês?
Takemi - A fome é o maior problema. Às vezes, a mãe não dá a última mamada antes do jejum, e o bebê chega aqui chorando. Aconselho sempre a alimentar a criança no tempo certo para que ela não sofra enquanto se prepara para a cirurgia.
JC - Alguma história marcante desse trabalho?
Takemi - Um pai me pediu para segurar o bebê que iria para cirurgia. Ele chorava muito. Consegui fazê-lo dormir e, quando o chamaram para o centro cirúrgico, o pai insistiu para que eu o levasse porque tinha medo que ele voltasse a chorar. Foi muito gratificante este reconhecimento. Ano passado, duas mães indígenas ficaram aqui por meses. Certa vez, disseram que estavam com vontade de comer farofa. Consegui autorização para levá-las para comer um pastel comigo na feira. Quando chegaram lá, viram o sanduíche de pernil e ficaram encantadas. Depois, fomos a outros restaurantes para provarem outros pratos. Foi bastante gratificante proporcionar essa alegria para elas.
JC - Você também dá apoio emocional aos pais?
Takemi - Sim. Alguns ficam muito nervosos. Eu os tranquilizo e explico que em 42 anos nunca vi complicações ou mortes durante a cirurgia. Tento acalmá-los da melhor forma.
JC - Já reencontrou crianças que atendeu quando bebês?
Takemi - Sim, muitas voltam para visitar. Elas lembram da gente, mas nós nem sempre as reconhecemos. É difícil, são muitos rostos e elas mudam muito quando crescem.
JC - Como é saber que seu trabalho faz a diferença na vida das pessoas?
Takemi - É gratificante. Tudo o que faço aqui me traz felicidade.



