Gerontolescência é o termo cunhado pelo médico gerontólogo Alexandre Kalache, um dos mais reconhecidos especialistas em envelhecimento no País, para definir o que vem sendo estudada como uma possível segunda fase de transição na vida humana. A expressão faz menção à adolescência, que corresponde à mudança da infância para a vida adulta, e trata da etapa em que as pessoas passam da vida adulta à velhice.
Não oficial, o termo foi proposto em 2015, frente ao aumento da expectativa de vida dos brasileiros e à forma cada vez mais ativa e autônoma com que chegam à casa dos 60 anos. Para se ter ideia, em Bauru, este grupo já representa 18% da população. Pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Estatuto da Pessoa Idosa, contudo, eles são considerados idosos, mas vivem uma fase que vem sendo ressignificada, embora não tenham se livrado totalmente de estereótipos e preconceitos sociais.
Beneficiários de avanços científicos como vacinas, antibióticos e procedimentos médicos, com níveis educacionais superiores a de seus pais e avós e com mais acesso à informação, não abrem mão de estudar, viajar, dançar, praticar esportes e mantêm vitalidade e disposição para continuar exercitando corpo e mente. Com quase 40 anos de atuação em Bauru, o médico geriatra e reumatologista Júlio Horta pontua que o conceito de envelhecimento vai além do viés cronológico, abrangendo também aspectos biológicos, psíquicos e sociais.
"Eu, por exemplo, atendo pessoas de 80, 90 anos que, biologicamente, socialmente e psicologicamente são bem mais novas. Quando comecei na geriatria, era raro receber um paciente com 80, 85 anos. Hoje, não passo um dia sem atender alguém com 90, 95 anos", revela.
De fato, desde 1940, os brasileiros tiveram um ganho de longevidade de mais de 30 anos. Segundo o Censo Demográfico 2022, a expectativa de vida ao nascer chegou a 75,5 anos, sendo 79 anos para mulheres e 72 anos para homens. E, com o aumento da longevidade, o conceito de saúde também mudou.
"Antes, era ausência de doença e, hoje, é manutenção da autonomia e independência, porque é difícil uma pessoa de 80, 90 anos não ter doenças. Se o idoso tem autonomia e independência financeira, física e mental, é considerado saudável, mesmo tendo diabetes, hipertensão ou outras doenças características da Terceira Idade e que podem ser controladas", descreve Horta.
Somente em Bauru, 68.235 pessoas têm 60 anos ou mais, número que corresponde a 18% da população. Trata-se de um contingente que cresceu 51,8% desde 2010, ano do penúltimo Censo, quando foram contabilizados 44.941 moradores com esta faixa etária. No mesmo período, a população em geral da cidade aumentou 10,2%, chegando a 379.146 habitantes.
Segundo Horta, a expectativa e a qualidade de vida aumentaram devido a diversos fatores, como a queda da mortalidade infantil, estendendo o número de pessoas que chegam à Terceira Idade, avanços da medicina e da indústria farmacêutica e a maior conscientização sobre cuidados com a saúde.
Neste sentido, ele pontua o grande desafio do poder público e da iniciativa privada em garantir infraestrutura para atender à demanda criada - e cada vez mais ampliada - por este público. "É preciso assegurar mais produtos e serviços não apenas em saúde, com mais leitos hospitalares, mas também em outras áreas, como lazer", completa.
'Muito mais pique do que pessoas jovens'
"Muitos idosos têm muito mais pique do que pessoas jovens, são ativos, têm vontade de viver e aprender coisas novas". É assim que Valquiria Pinheiro Valério, presidente da Associação dos Aposentados, Pensionistas e Idosos de Bauru e Região, descreve os frequentadores 60 da entidade, que oferece cursos de informática, de smartphone e inglês, aulas de pilates, bailes com banda ao vivo e, em breve, um curso de teatro.
Ela conta que, em sua maioria, são pessoas que já estão com a aposentadoria garantida, não trabalham e nem precisam mais cuidar de filhos e têm, portanto, mais tempo para si e para fortalecer relações sociais.
"São dois bailes por semana e, em cada um, reunimos cerca de 200 pessoas. Eles gostam muito e têm incentivo dos próprios filhos, que os levam e buscam", frisa. A associação também promove duas excursões ao ano, sendo a mais recente para Águas de Lindóia.
"São, em média, de 35 a 40 pessoas. É um pessoal animado para viajar, dançar, fazer cursos, com muita disposição para curtir a vida e continuar aprendendo", frisa.
Dados da Pesquisa Estatísticas do Registro Civil divulgados em abril deste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que os idosos em Bauru também estão se casando mais. Segundo o levantamento, dos 2.258 casamentos registrados em 2022, 53 tinham noivas a partir de 60 anos, o que representa 2,3% do total.
Já em 2012, quando foram contabilizadas 2.810 celebrações, apenas 30 delas (1,1%) abrangiam esta faixa etária de mulheres. Desta forma, em uma década, o número de moradoras que casaram quando estavam na chamada Terceira Idade aumentou 76,7%.
Trata-se de uma transformação que também impacta o universo masculino. Conforme a pesquisa, 124 homens (5,5% do total) firmaram união conjugal em Bauru quando tinham 60 anos ou mais em 2022, sendo que 89 haviam tido a mesma iniciativa (3,2%) dez anos antes. A alta no período foi de 39,3%.
Representatividade
Intelectuais, políticos, artistas e outras personalidades com mais de 60 anos têm ganhado maior destaque nos meios de comunicação, contrariando o estereótipo de "velho" ao demonstrarem características como inteligência, versatilidade, sagacidade e bom humor e provando que também é possível ser produtivo nesta fase. Marcos Palmeira, 61 anos, e Malu Mader, 57 anos, por exemplo, interpretam um casal no remake de "Renascer", atual novela das 21h da TV Globo, lançando luz, inclusive, sobre a sexualidade na maturidade.
Em Bauru, exemplos de representatividade e valorização do público 60 são a Realeza da Terceira Idade do Carnaval e a escolha anual da "Miss e Mister 60 Bauru" que, neste ano, ocorrerá em 27 de setembro, na Sociedade Hípica.
