ENTREVISTA DA SEMANA

Idenilde de Almeida Conceição; União para enfrentar a vida

Por Guilherme Matos | da Redação
| Tempo de leitura: 5 min
Mateus Ferreira
Idenilde conta que a luta pelo coletivo foi despertada na igreja
Idenilde conta que a luta pelo coletivo foi despertada na igreja

"Sozinho, o problema é seu. Juntos, o problema é nosso". A frase, bastante conhecida, expressa o pensamento da professora aposentada Idenilde de Almeida Conceição, 63 anos. A ideia nela contida não baliza apenas a atuação da profissional que esteve por 30 anos em sala de aula e tem 20 anos de militância, principalmente no Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). Abarca ainda sua vida pessoal: ela também acredita na força do vínculo familiar para além da união da categoria.

O mesmo conceito a impulsionou na luta pela melhoria do serviço de saúde oferecido aos servidores e a integrar o Conselho Municipal da Comunidade Negra, atuação que lhe rendeu um prêmio Zumbi dos Palmares, do quão tanto se orgulha. Além disso, foi membro por vários mandatos do Conselho Municipal de Educação e hoje está no fórum municipal representando a Central Única dos Trabalhadores.

Sua trajetória começa em uma vila operária, em Adrianópolis, município de pouco mais de 5 mil habitantes localizado no sudeste do Paraná. Seu pai, Cyriaco da Conceição, falecido no ano passado aos 87 anos, é descrito por ela como um homem sábio e rígido, o que influenciou sua personalidade e postura ética. Já a mãe, Augusta Almeida Conceição, morreu em 2019, aos 84 anos. Idenilde é a filha mais velha de cinco irmãos: Milton, Valdir, Aparecida e Valter.

E foi na igreja onde começou seu histórico de militância. Ela atuou pelo Movimento Cristão de Apiaí, cidade do Interior paulista em que foi morar em 1976, após a aposentadoria de Cyriaco. Na época, ela tinha cerca de 16 anos. Nascida em 1961, Idenilde viveu sua juventude e o início da carreira durante os anos de chumbo. Ela lembra do dia em que um padre contou ao grupo de jovens sobre o assassinato do jornalista Vladimir Herzog. Era 1975.

Em 1979, Idenilde se forma e dá início à carreira no magistério. Depois, decidiu cursar Contabilidade e iniciou um estágio em uma multinacional do setor de metalurgia, no setor administrativo. Conta que produziu um relatório na época em que apontava diversas críticas aos gestores, o que não foi aceito pela empresa. "Sempre fui muito briguenta e não aceitava quando as coisas estavam erradas", ela define a atitude. Contabilidade, porém, não era sua vocação.

Se encontrou em história, graduação feita em Itapetininga. Em 1986, ela concluiu a faculdade e mudou-se para Bauru no ano seguinte. Na Sem Limites, em 1989, passou a integrar a Apeoesp, onde atua até hoje. Na cidade, sozinha, criou seus dois filhos, Max Wellington Fischer e Caio Augusto Conceição Queiroz, enquanto trabalhava e militava. Leia os principais trechos da entrevista?

JC - Você tem uma longa trajetória de militância. Como isso influenciou sua carreira como professora?

Idenilde - Desde o início, percebi a importância de estar envolvida na militância. A Apeoesp é um sindicato forte, respeitado até mesmo fora do País, e eu sempre acreditei que lutar por melhores condições para os professores e pela qualidade da educação é fundamental. Nossa luta é por uma educação de qualidade para os filhos dos trabalhadores, e isso sempre me motivou a participar ativamente das campanhas e até greves. Sempre que o sindicato precisava, eu estava lá.

JC - Quais foram os principais desafios enfrentados?

Idenilde - Um dos problemas foi o da progressão continuada. O sistema de ensino na época permitia que os alunos passassem de ano mesmo sem completar as competências necessárias. Por conta disso, os estudantes não se esforçavam e eu precisei insistir para que estudassem diversas vezes. Eu tinha um ímpeto de querer mudar essa realidade das crianças. Como essas crianças iriam brigar por uma vaga no Ensino Superior?

JC - E os desafios em sala de aula?

Idenilde - E uma escola de Bauru, um aluno levou uma peixeira para sala e tive que ministrar a aula com ela guardada na minha cintura. Alguém me alertou que ele estava armado, eu o chamei e perguntei se confiava em mim. Quando ele assentiu, perguntei o porquê da faca. Ele contou que estava sendo ameaçado e que iriam pegá-lo na saída. Ele confiou em mim e aceitou que eu ficasse com a peixeira. Foram duas aulas com o objeto na cintura. No final, ele tentou pegar novamente, mas eu falei que não poderia entregar por conta das minhas obrigações como educadora. O levei para a diretora, que o liberou mais cedo e evitou que os rapazes o ameaçassem.

JC - Quais as principais conquistas que você testemunhou?

Idenilde - Tivemos conquistas importantes, como aumentar o contrato dos professores da categoria O, que antes tinham contratos muito precários. Conseguimos também derrubar a prova que era exigida para lecionar, que não era um critério justo de avaliação. Também já realizamos 97 dias de greve, uma das maiores de São Paulo e que me orgulho muito. Por conta da minha atuação no Conselho Municipal da Consciência Negra, recebi o Prêmio Zumbi dos Palmares.

JC - Como é sua atuação hoje em dia?

Idenilde - Atualmente sou Conselheira Estadual da Apeoesp, tenho uma cadeira no Conselho Municipal da Saúde e no Conselho da Fundação Estatal Regional de Saúde da região de Bauru (Fersb) e faço parte da Comissão da Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo (Iamspe).

JC - Que conselho você daria para os professores que estão começando a carreira?

Idenilde - O principal conselho é se unir ao sindicato, participar das reuniões, das assembleias, estar sempre informado sobre o que acontece na educação. Sozinhos, a gente não consegue muita coisa, mas juntos, dentro do sindicato, conseguimos lutar por melhores condições e por uma educação de qualidade para todos.

O QUE DIZ A PROFESSORA

"Sempre tive vocação para sala de aula, cumprir minhas obrigações e ímpeto de mudar a realidade dos alunos"

"Procuro mostrar aos estudantes a importância do conhecimento para o crescimento"

"Hoje em dias os professores enfrentam em sala de aula os desafios da sociedade"

"O educador precisa ser um exemplo para os alunos e os sindicalizados, para os outros professores"

Professora durante protesto pela educação
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Idenilde em reunião do Coletivo de Aposentados da Apeoesp
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Idenilde tem vocação para a liderança desde sua entrada na Apeoesp
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Idenilde, seus filhos Caio e Max, acompanhados por seu neto Matheus Antonio e Natalia Sanches Mangaba, sua nora
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Idenilde e dois irmãos em viagem a cidade de Iguape
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