OPINIÃO

Cafezinho no supermercado

Por Bruno Sanches | 02/06/2024 | Tempo de leitura: 2 min

Tenho sentido falta de um espaço nos supermercados. Mesmo que sabendo não estar mais ali presente, procuro-o em fins de corredores, próximo à entrada do depósito, e nada... é sempre uma frustração. Local em que os clientes e funcionários se aglomeravam (antes da pandemia, é claro) em busca de um alento para o dia, o néctar do estímulo, ambiente para o convívio frugal, para as convenções do tempo (tá quente, será que amanhã chove?) e para selar compromissos.

Tá faltando o cafezinho do dia, supermercados. E empórios. E lojas de conveniência. O cafezinho é o que socialmente nos faz ser Brasil - ainda que divididos, cada vez mais, por religião, política e desigualdades sociais. É o que estimula, encoraja, promove encontros e desencontros. Reúne os favoráveis a café sem açúcar - para os diabéticos e fãs de adoçante; e aos outros que preferem com açúcar (ou meu com, por favor). Os copinhos, pequenos e descartáveis, são abastecidos uma, duas ou três vezes, conforme a vontade do freguês. A fila que se forma diante da cafeteira vazia, a reposição que é feita por (geralmente) uma moça, que se torna uma das mais adoradas do mundo naquele segundo.

E sim, a casualidade dos papos, o esquentar dos polegadores/indicadores e as ondas que se formam nas borbulhas após o assoprar da borda do copinho dão lugar a primeira bicada, muito contida, no cafezinho. É muito difícil não queimar a língua, assim como deixar derramar um pouquinho pelas bordas, até pelo chão. O café é sempre forte, para suportar as agruras da vida, os preços do supermercado, que sistematicamente sobem sem uma motivação específica. E, talvez seja por isso mesmo, que esse cafezinho do supermercado tenha sumido dos corredores e dos cantinhos. O papo de pandemia, distanciamento social não cola mais, donos de supermercado. Sinto como se tivesse perdido o "brinde" da loja. A bolachinha nova que alguém oferece no quiosque do provador. O copo de plástico que se ganha após fazer uma compra acima de não sei quantos reais. Aquela gentileza que não tem preço (no fim, tem, sim) e que faz toda a diferença no humor do dia.

Enfim, fica aqui o meu manifesto, cultural e antropológico e bebericante, pelo retorno ao espaço do cafezinho do supermercado. Não precisamos de um retorno gourmetizado, com maquininhas e cápsulas e cafés especiais, não; queremos aquelas cafeteiras gigantes, reposições com leiteiras, cafés com pouca ou nenhuma especificação da ABIC. Café bom, eu tomo em casa. Ou na cafeteria.

No mercado, eu quero queimar a língua, derramar no pé, responder sobre o tempo e jogar o meu copinho descartável no lixo mais próximo, e voltar às minhas compras, um pouco mais contente.

Receba as notícias mais relevantes de Bauru e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.