OPINIÃO

Folia e Agonia – sobre a acusação a um certo professor da Unesp

Por Marcelo Bulhões | 15/02/2024 | Tempo de leitura: 2 min

O autor é Livre-docente em Teoria Literária pela Unesp e doutor em Literatura Brasileira pela USP, autor de obras sobre literatura, cinema e jornalismo

Um frevo esquecido

Foram trinta e quatro anos entrando em salas de aula. Vinte e nove anos de Universidade. Mas olhar hoje pra isso é acolher mágoa.

Nesses dias de carnaval, um amigo me disse que é preciso seguir, viver. Eu deveria ter ido a algum bloco. A beleza da vida deve ter ficado em alguma rua do Recife. Em alguma esquina no Rio, alguém deve ter lembrado de uma marchinha de Lamartine Babo. Em alguma esquina do Recife, um saxofone desafinado tocou um frevo esquecido.

Mas como seguir? As matérias de jornais expõem o meu nome como o "assediador"; ou "professor da Unesp suspeito de assédio é demitido".

Não adiantou

Quando foram colados cartazes fakes pelo campus da Unesp em julho de 2022 com conteúdo sexual, não adiantou eu ter dito à direção da Faculdade que aquilo era uma fraude, uma peça montada. Como eu naturalmente sabia.

Depois de instaurada uma sindicância e meu nome ter sido exposto (sem se cumprir o dever de segredo de justiça), não adiantou que nenhuma vítima dos tais banners tenha comparecido, mesmo o grande incentivo a que os alunos denunciassem o "assediador".

Não adiantou que nenhuma prova tenha chegado. Era preciso continuar. O linchamento midiático já havia acontecido; a folia dos veículos de imprensa e das redes sociais. As militâncias cobravam punição.

Depois da exposição midiática, foram colhidas em torno de sete mil assinaturas pedindo a exoneração do tal professor. Não apareceu uma única vítima, uma única prova. Mas não importa que não haja vítimas ou provas.

No lugar do arquivamento da sindicância, abre-se um processo administrativo. Afinal, alunos disseram que o professor de literatura Marcelo Bulhões de vez em quando falava de erotismo. Bem, isso também é afastado. Que surja alguma prova! Não adiantaram os testemunhos de minhas orientandas atestando meu profissionalismo.

A folia

Até que... surge uma "prova"! Uma professora "ouviu dizer" que o professor beijou uma aluna em plena sala de aula. A aluna é trazida à comissão. Ela desmente o boato. Mas a aluna - que nunca havia feito qualquer queixa - diz que houve algo: o professor "apontou o dedo para a sua camiseta" enquanto dava aula. É suficiente. O professor é demitido. A agonia - que fique com o "assediador".

A folia de se destruir uma trajetória de vinte e nove anos na universidade.

(Narração é baseada nos autos do processo).

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