O Ministério Público de Contas (MPC) defendeu ao Tribunal de Contas de São Paulo (TCE-SP) a rejeição sumária do contrato entre a Prefeitura de Bauru e a editora Movimenta, que vendeu o material Palavra Cantada à Secretaria de Educação no ano passado, e a aplicação de multa aos responsáveis pela aquisição, que custou R$ 5,2 milhões aos cofres públicos municipais.
A manifestação do MPC, à qual o JC teve acesso, foi oferecida no final de setembro no âmbito do processo que tramita no TCE a respeito da compra milionária dos kits pedagógicos Palavra Cantada. A aquisição é também objeto de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) que tramita na Câmara de Bauru há três meses e já em fase final.
No parecer, a procuradora Élida Graziane Pinto, designada para atuar junto ao Tribunal de Contas, afirma que a compra do Palavra Cantada - realizada por dispensa de licitação, na modalidade inexigibilidade - contraria a legislação.
"Não houve justificativa que especificasse tecnicamente a singularidade do objeto, tampouco as vantagens alcançadas pela sua adjudicação direta", adverte a procuradora.
A aquisição do material se deu por meio da modalidade inexigibilidade porque a Movimenta, editora responsável pelos livros, tem atestado de exclusividade sobre os títulos - o que inviabiliza o fornecimento dos kits por outros fornecedores. Para o MP, no entanto, a exclusividade não é o único fator que justifique a modalidade de compra.
"Em que pese a exclusividade no fornecimento da coleção em tela, a conduta do gestor revela preferência por marca, uma vez que não houve prévio cotejamento entre outras coleções de caráter similar, ponderação necessária a esclarecer a peculiaridade do que se procura contratar", aponta o parecer.
A procuradora diz ainda que o princípio da discricionariedade, que dá liberdade de ação ao gestor público, se baseia nos princípios constitucionais da administração pública e a compra de materiais complementares "deve ser motivada à luz das demais opções igualmente válidas para se alcançar tal finalidade, sob a égide do postulado da proporcionalidade".
Segundo o MPC, o próprio Tribunal de Contas de São Paulo tem jurisprudência que rejeita compras por inexigibilidade de licitação quando não há estudos prévios que realmente justifiquem o instrumento.
O parecer de Élida Graziane questiona também se havia mesmo necessidade da Prefeitura de Bauru adquirir o material. "A aquisição de material didático em caráter de despesa adicional em relação ao Programa Nacional do Livro Didático (PLND) não só sobrecarrega desnecessariamente o erário como também coloca em risco o cumprimento tempestivo das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação", destaca.
A procuradora diz também que não há liberdade irrestrita do gestor público para comprar material apostilado - sobretudo quando as metas e estratégias do Plano Nacional de Educação sequer foram cumpridas no âmbito municipal.
Em nota, a Movimenta afirma que "preencheu todos os requisitos necessários para a contratação pública pelo Município de Bauru na modalidade compatível com a exclusividade do material comercializado, conforme atestado emitido pelo Sindicato Nacional de Editores de Livros e exigido pela Lei 8.666/1993 nos casos de inexigibilidade de licitação".
A editora diz também que o preço dos livros é padronizado, "conforme se demonstrou nas notas fiscais emitidas na comercialização do projeto em outros municípios", e que o projeto Palavra Cantada é concebido para contemplar todas as particularidades de um país continental como o Brasil.
"Por isso, além de mídias em CD e DVD, inclui QR Codes para acesso dos conteúdos via internet. Todo o material contratado foi devidamente entregue ao município dentro do prazo estabelecido, bem como o treinamento dos professores. A Movimenta não é alvo de qualquer denúncia ou procedimento do MPF ou da CGU. Embora não tenha sido ouvida pelo Ministério Público de Contas, a Movimenta Editora tem todo o interesse em prestar os esclarecimentos necessários", ressalta.
A princípio divulgada como uma aquisição positiva pelo governo Suéllen Rosim (PSD), a compra do Palavra Cantada foi colocada em xeque já em setembro do ano passado, um mês depois da assinatura do contrato.
O primeiro questionamento se voltou à qualidade do material. Os livros são bons, argumentam técnicos da Educação, mas sua utilização envolve CDs e DVDs, equipamentos mais do que obsoletos. Computadores da pasta não possuem mais suporte para os discos, por exemplo. Depois veio o fracasso na tentativa de implementar os livros na rede municipal.
O contrato prevê um treinamento, que só começou no início deste ano e que demorou a terminar: ele foi suspenso ainda na primeira semana. Na sequência estão as suspeitas sobre compras de kits pedagógicos. O Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União já promoveram ações contra esquemas nesse sentido. Outro fator está no primeiro contato entre a editora e a prefeitura. A conversa teria se iniciado por mensagens no telefone pessoal de um servidor - que apagou a conversa posteriormente.
Comentários
2 Comentários
-
Teodoro 06/10/2023É treta em cima de treta! Tá loko! -
Tati 06/10/2023Qd vejo este tipo de coisa tenho nojo de ser brasileira e viver em Bauru.