Ao examinar a língua das pessoas descobrimos que não gostam de mostrá-la. Parece revelar intimidade, quase sexual! Algumas se recusaram em participar da pesquisa: se sentiam invadidas. Outras participavam, mas não deixavam nem fotografar apenas a língua. Foi incrível.
A língua tem o sentido do paladar e deveria ser chamada de palato, mas quem recebeu este nome foi o “o céu da boca”. No início achava-se que os botões gustativos estivessem na parte superior da boca, mas depois descobriu-se que estavam na superfície da língua, mas não teve jeito de trocar o nome e quem detecta o paladar não é o palato! No mínimo, estranho!
A língua tem movimentos na fala, deglutição e mastigação, além das manifestações de carinho, intimidade e libido. Quando machucamos, percebemos como é importante! Quem nunca sentiu o roçar de uma língua pelo frisson que provoca.
Um de nossos estudos sobre a língua tinha o objetivo de saber como as pessoas aprendem a usá-la. Os pais ensinam, aprende-se sozinho ou herdamos esta habilidade. Usar a língua significa movimentá-la. As pessoas aprendem a andar, exercitar-se e melhorar sua capacidade motora e de articulação corporal. A língua formada por dezenas de músculos pode ser melhorada? Mas, para quê sabermos isto?
A língua está fixada na parte posterior da boca e na entrada da faringe. A sua parte mais solta ou terço anterior avança mais ou menos para fora de acordo com a pessoa Em baixo, temos um freio que ajuda a conter a mobilidade, mas algumas pessoas nascem com a língua presa demais, pois esta prega fica muito grande. Ficam como o personagem “Cebolinha”, com dificuldade em pronunciar palavras com “r” e não conseguem colocar a ponta da língua para fora da boca ou no palato. Tecnicamente chama-se anquiloglossia.
No doutorado de Rosa Maia, na FOB-USP, estudamos os movimentos da língua em 839 pessoas de todas as idades, gêneros e etnias. Procuramos resgatar a história familiar dos movimentos linguais e como as pessoas aprenderam utilizá-los nas mais variadas formas.
Todo conhecimento aumenta nossas potencialidades físicas, intelectuais e aumenta a adaptação ao meio, melhorando as relações com o mundo. Mas o objetivo específico foi: como fazer fisioterapia, treinamento e melhorar a performance da língua de pacientes, especialmente os operados para remoção do câncer mais frequente na boca?
Câncer
No câncer de língua, assintomático e insidioso, quando se descobre a ferida tem mais de 1cm. A maioria, em fumantes, etilistas ou portadores do papilomavírus associado ao sexo oral e promiscuidade. Na língua, o câncer precocemente dissemina-se para os gânglios linfáticos da região submandibular e cervical como metástases regionais difíceis de serem controladas.
Na cirurgia, o oncologista remove também boa parte da língua, como margem de segurança, e promove o esvaziamento cervical tirando os gânglios para evitar as recidivas. Depois da recuperação o paciente fica com a língua diminuída e disforme: requer fisioterapia e treinamento para recuperar parte dos movimentos e funções.
A análise dos movimentos linguais em centenas de pessoas objetivou contribuir para estabelecer protocolos fisioterapêuticos em pacientes que perderam parte da língua ou com deficiências decorrentes de síndromes, acidentes e outras causas.
Os movimentos linguais para fora e lados, no tocar o palato e fazer uma canaleta com as margens são realizados por quase todos. Mas existem quatro movimentos que poucas pessoas conseguem executar, como colocar a língua no queixo ou mento, tocar o nariz com a ponta da língua, rotacionar a língua continuadamente ou dobrar sua ponta para trás. Poucas, porém, conseguem colocar a ponta da língua atrás da úvula ou da mandíbula.
Apenas 26% das pessoas têm história familiar de seus movimentos linguais, mas a maioria nunca conversou com os familiares sobre o assunto: incrível! A pesquisa revelou que a idade aumenta a habilidade para novos e amplos movimentos da língua, ou seja podemos aprender! Os movimentos da língua devem ser aprendidos para melhorar suas várias funções e recuperarmos habilidades caso haja necessidade um dia!
No espelho, analise minuciosamente sua língua. Detecte quais movimentos você consegue ou não executar. Acostume-se com sua língua auto-examinando e exercitando-a toda semana: vai aumentar sua autoestima e prevenir-se de possíveis lesões cujo diagnóstico precoce leva à sua cura definitiva!