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Tu (Não) te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas

Leonardo Góes
| Tempo de leitura: 2 min

Antoine Jean-Baptiste Marie Roger Foscolombe, Conde de Saint-Exupéry, popularmente conhecido como Antoine de Saint-Exupéry, profetizou em sua célebre obra 'Le Petit Prince': "Tu deviens responsable pour toujours de ce que tu as apprivoisé". Ou popularizada em nosso tupiniquim por "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas".

Por muito tempo, muito mesmo, para não dizer minha vida inteira, sempre interpretei referida frase com os "melhores" propósitos possíveis. Todavia, de uns tempos para cá, venho percebendo o quão ela é pesadíssima e faz com que nutramos um sentimento de culpa eterna: calma lá, cara pálida, quer dizer então que seja o bem ou o mal que eu faça, terei que eternamente me responsabilizar?

Evidentemente que não... O propósito do imortal adágio é nobre, mas se trazido para uma culpabilização/vitimização pode trazer sequelas trágicas: quantos de nós evitamos situações prazerosas, renegamo-nos, porque 'apita' em nossa consciência aquela raposinha maldita falando isso para o principezinho... E isso hoje se traduz como 'e sua responsabilidade afetiva?...'

Eis que decidi, pela terceira vez, reler a festejada obra para não 'colocar na conta' do Antoine, do Príncipe ou da Raposa: existem alguns pormenores, que se referem até a própria tradução do francês para o português, que nos exigem uma releitura.

Lendo um texto da profa. Roberta Fuks no site Cultura Genial, vi que: "Apesar da tradução brasileira ter escolhido transformar o verbo francês "apprivoisé" em "cativar", na realidade a tradução mais literal seria "domar" ou "domesticar"." E assim prossegue: "Dom Marcos Barbosa (primeiro tradutor) optou por tirar uma licença poética e adaptou "apprivoisé" para "cativar", um verbo que pode ser tido como sinônimo de encantar, seduzir, atrair, enfeitiçar, fascinar e envolver. O verbo escolhido por Dom Marcos Barbosa envolve entrega, necessidade um do outro, dedicação". Logo, o 'cativar' lido com ressalvas, não significa propriamente você trazer para si um fardo e o 'eternamente' seria um advérbio de constância, sem um prazo definido mas não necessariamente que seja infinito (que seja eterno enquanto dure, como profetizou nosso Poetinha).

O que quero com esse texto? Que tanto o 'cativador' quanto o 'cativado' sejam adultos (afinal a Raposinha ensina isso ao Pequeno, não?!) e entendam que a sinceridade, o diálogo e, principalmente, a lealdade, não façam com que uma poética passagem se torne uma prisão perpétua: sejamos leves e deixemos fluir como Heráclito de Éfeso ensinou lá atrás ("Ninguém entra em um mesmo rio uma segunda vez, pois quando isso acontece já não se é o mesmo, assim como as águas que já serão outras").

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