AÇÃO DE IMPROBIDADE

Justiça mantém bloqueio de bens de Saud e agência de publicidade

Por Julio Codazzi | Taubaté
| Tempo de leitura: 6 min
Divulgação
O prefeito de Taubaté, José Saud
O prefeito de Taubaté, José Saud

Embora tenha negado a ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, a Justiça decidiu manter o bloqueio dos bens do prefeito de Taubaté, José Saud (PP), e da agência de publicidade Aorta Comunicação, que tem sede em São José dos Campos e em 2021 foi contratada sem licitação pela Prefeitura por R$ 1,8 milhão.

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No início de julho, ao emitir a sentença, o juiz Pedro Henrique do Nascimento Oliveira, da Vara da Fazenda Pública de Taubaté, não se manifestou sobre o bloqueio dos bens, que havia sido determinado anteriormente pelo Tribunal de Justiça, em fevereiro desse ano, de forma liminar, até o limite de R$ 1,8 milhão. Por meio de embargos de declaração, Saud solicitou que a decisão fosse alterada para revogar a indisponibilidade do patrimônio, mas isso foi negado pelo magistrado nessa segunda-feira (19).

Segundo a decisão, o bloqueio dos bens deve ser mantido até o esgotamento dos recursos no processo. "Apesar da improcedência da ação, fica mantida a liminar de constrição dos bens ao menos até o trânsito em julgado da sentença. Isso porque este julgado [a sentença] ainda pode ser revertido pelas instâncias superiores, e a revogação da liminar neste momento poderia dar azo à dilapidação patrimonial por parte dos réus, frustrando eventual ressarcimento ao erário", afirmou o magistrado.

Procurado na tarde dessa terça-feira (20), Saud alegou que a decisão da Justiça é contraditória. "Eu tenho pago um preço alto por ter tomado a única decisão que poderia tomar: por intermédio de uma agência, ter ferramentas para orientar a população durante a pandemia da Covid, quando a falta de informações adequadas representava a diferença entre viver e morrer. Mas, vamos lá. Só me resta seguir em frente. Nós iremos recorrer, pois há uma contradição: se a Justiça entendeu que não há nada de errado, julgando improcedente a ação de improbidade do Ministério Público, por que manter o bloqueio?", afirmou. A Aorta não se manifestou até a publicação da reportagem. O espaço segue aberto.

Publicidade.

Em janeiro de 2021, no primeiro mês do governo Saud, a Prefeitura deu início a um processo administrativo interno para abrir uma licitação para contratar uma agência que ficaria responsável pela publicidade institucional – finalizado em maio, o edital previa gasto de R$ 7 milhões a cada 12 meses; o certame acabou vencido posteriormente pela RP Propaganda, de Mogi das Cruzes (SP), que assinou contrato em novembro de 2021.

Paralelo a isso, em março de 2021, entrou em vigor uma lei federal que autorizava "medidas excepcionais" para a contratação de bens e serviços relacionados ao Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. Dentre essas medidas estava a possibilidade de dispensa de licitação para a contratação de serviços de comunicação social e publicitária.

Em 12 de julho, já com o processo licitatório da publicidade em andamento, a Prefeitura decidiu, com base na lei federal, dar início a um segundo processo de contratação dos serviços de publicidade – nesse caso, com dispensa de licitação e voltado apenas para campanhas relacionadas à pandemia. Esse segundo processo, que contou com a participação de três empresas, resultou na contratação da Aorta, em 27 de julho, por R$ 1,8 milhão, para um período de seis meses.

Ação.

Na ação, o MP apontou supostas irregularidades na contratação da Aorta. Uma delas era que, embora a Prefeitura tenha tratado a contratação como emergencial, citando “aumento substancial do contágio da população do município pelo coronavírus”, a dispensa de licitação teria ocorrido em período em que o número de casos e de mortes já estava em queda. Outra irregularidade, de acordo com a Promotoria, era que, com base nas duas regras previstas no termo de referência, teria havido empate entre duas agências, mas a Prefeitura teria se baseado em apenas um dos critérios para definir a vitória da Aorta.

O MP também apontou que, ao contrário do que estabelece a legislação para esse tipo de contratação, “não foi composta subcomissão técnica e nem a comissão permanente de licitação se manifestou no feito, de modo que não havia quem avaliasse a viabilidade das propostas”. A Promotoria afirmou que, “mesmo sem possuir competência administrativa, que no caso seria da subcomissão técnica ou da comissão permanente de licitação”, Saud “pessoalmente julgou e definiu a empresa vencedora” da contratação por dispensa de licitação.

O MP citou ainda que a Aorta prestava serviços para o diretório municipal do MDB de São José dos Campos – mesmo partido de Saud à época – e que a empresa foi desclassificada pela Comissão Permanente de Licitações no processo principal, do contrato de R$ 7 milhões, por não atender todas as exigências do edital.

Na ação, que tramita desde abril de 2022, a Promotoria pede que Saud seja condenado ao pagamento de uma multa de até 24 vezes seu salário, o que poderia chegar a R$ 446 mil, e que a Aorta seja condenada à devolução do valor do contrato, de R$ 1,8 milhão.

Sentença.

Na sentença, públicada no dia 2 de julho, o juiz Pedro Henrique do Nascimento Oliveira, da Vara da Fazenda Pública de Taubaté, afirmou que, "de acordo com o conjunto probatório constante nos autos, não restou demonstrada a prática de fraude" e "não há qualquer evidência nos autos de relação entre os réus que justifique o favorecimento da empresa Aorta".

O magistrado apontou que, "além dos depoimentos constantes nos autos, que comprovam que a contratação da empresa Aorta se deu pelo aumento dos casos no ano de 2021, é notório que no decorrer da pandemia Covid-19 surgiram novas ondas de contágio relacionadas em decorrência da contaminação por novas variantes".

"A vacinação só se deu em janeiro de 2021, período em que a Prefeitura de Taubaté não possuía contrato com empresa de comunicação e se tornou extremamente necessária a comunicação dos municípios relacionada a dinâmica adotada para vacinação da população, específica em cada região, além de coincidir com onda de contágio de nova variante. Além disso, importante consignar que era notória a propagação de desinformação (fake news) pertinente às vacinas, o que colocou em risco a vida de muitos brasileiros, restando necessária a correta informação da população", diz trecho da decisão.

O juiz afirmou também que, "de acordo com os documentos juntados em contestação pela empresa Aorta e pelos depoimentos das testemunhas, o serviço contratado foi prestado de forma satisfatória pela empresa, cabendo ao TCE [Tribunal de Contas do Estado] a fiscalização do cumprimento integral do contrato".

Recurso.

O MP já apresentou recurso contra a sentença. Na apelação, a Promotoria afirma que "da leitura da sentença percebe-se que foi dada ênfase demasiada, e divorciada das demais provas, daquilo que se deve extrair da prova testemunhal", como se "o conjunto probatório se resumisse quase que exclusivamente a elas [as provas testemunhais]", deixando "ao largo, desprezando a análise detida de todas as evidências obtidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa".

Ainda no recurso, o MP alega que a suposta fraude teve motivação política e repete as provas apresentadas durante o processo. "O termo de referência não tinha data; quem figura como seu subscritor nega a autoria do documento; desconsiderou-se o empate técnico entre os disputantes ao objeto certame", exemplifica a Promotoria, que conclui que "em nome do combate à covid não se poderia admitir um vale tudo na seara da administração pública".

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