A campanha de fim de ano da Havaianas, estrelada por Fernanda Torres, extrapolou o campo da publicidade e ganhou contornos políticos, com reflexos imediatos no mercado financeiro. Em meio à repercussão negativa impulsionada por setores da direita, as ações da Alpargatas — controladora da marca — registraram forte queda na Bolsa nesta segunda-feira (22).
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Por volta das 16h20, os papéis da empresa recuavam 3,41%, cotados a R$ 11,32. No mesmo horário, o Ibovespa operava praticamente estável, com baixa de 0,26%, aos 158.056 pontos, indicando que o movimento foi específico da companhia.
Veiculado na TV aberta e nas redes sociais, o comercial traz Fernanda Torres defendendo que o público não entre em 2026 apenas com o “pé direito”, mas “com os dois pés”. A mensagem aposta em metáforas ligadas à iniciativa, atitude e movimento, como “os dois pés na estrada” ou “os dois pés na porta”.
Apesar do tom motivacional, a peça foi interpretada por críticos como uma provocação política. A reação foi rápida: políticos, influenciadores e militantes conservadores passaram a acusar a marca de fazer um posicionamento ideológico velado.
A insatisfação se traduziu em campanhas de boicote nas redes sociais. Um dos episódios de maior repercussão envolveu o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que publicou um vídeo descartando um par de Havaianas com as cores da bandeira brasileira.
Outro nome de destaque na reação foi o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que ironizou o slogan histórico da marca ao afirmar, no X (antigo Twitter): “Havaianas, nem todo mundo agora vai usar”.
O histórico recente da atriz também entrou no debate. Fernanda Torres ganhou projeção internacional após vencer o Globo de Ouro 2025 pelo filme Ainda Estou Aqui, que aborda o período da ditadura militar no Brasil — fator que ampliou a leitura política da campanha.
Enquanto parte do público pedia boicote, outra parcela respondeu com humor. Uma enxurrada de memes tomou conta de plataformas como X, Instagram, Threads e Reddit. O principal símbolo da sátira foi a “ferradura”, apresentada como alternativa às Havaianas para quem rejeitasse a marca.
Montagens mostravam ferraduras adaptadas com as tiras coloridas do chinelo, acompanhadas de frases irônicas como “nova coleção pós-boicote” ou “agora é ferradura fashion”. No Reddit, publicações acumularam centenas de comentários destacando a criatividade dos usuários.
Para especialistas, a turbulência tende a ser passageira. O estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, avalia que a polêmica não deve comprometer a trajetória da empresa no médio e longo prazos.
Segundo ele, a Havaianas tem alto grau de penetração no mercado brasileiro e não enfrenta concorrentes diretos capazes de absorver rapidamente uma eventual migração de consumidores. Além disso, a estratégia da Alpargatas está cada vez mais concentrada na expansão internacional.
“O consumidor brasileiro costuma decidir pela compra considerando conforto, modelo e disponibilidade, e não campanhas específicas ou posicionamentos políticos”, afirma Cruz.