LITORAL

Guarujá tem alta de casos de virose e hospitais lotados

Por Cláudia Collucci e Raíssa Basílio | da Folhapress
| Tempo de leitura: 5 min
Prefeitura do Guarujá/Divulgação
Prefeitura de Guarujá diz que houve aumento de 42% de queixas relacionadas a quadros de virose nos pronto-atendimentos
Prefeitura de Guarujá diz que houve aumento de 42% de queixas relacionadas a quadros de virose nos pronto-atendimentos

Turistas que passaram a virada de ano em Guarujá, no litoral paulista, relatam sintomas gastrointestinais, como náusea, vômito, dor abdominal e diarreia, e enfrentam prontos-socorros lotados e falta de remédios nas farmácias.

Em nota, a Prefeitura de Guarujá diz que houve aumento de 42% de queixas relacionadas a quadros de virose nos pronto-atendimentos. Em dezembro, foram 2.064 atendimentos contra 1.457, em novembro. Não há dados separados de quantos desses registros se referem ao período das festas de fim de ano.

Em razão dessa alta, a prefeitura informa que estendeu o horário de três unidades de saúde no período de 28 de dezembro a 5 de janeiro, em caráter de plantão. Elas estão funcionando das 7h às 22h. Já as UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e prontos-socorros funcionam 24 horas.

Também em nota, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo disse que, até o momento, não recebeu notificações sobre eventuais surtos das chamadas DTAs, doenças transmitidas por água e alimentos, no litoral paulista, mas que segue monitorando a situação em parceria com os municípios.

De acordo com o Boletim de Balneabilidade da Cetesb, divulgado nesta quinta (2), das 175 praias monitoradas no litoral paulista, 38 (22%) apresentam condições impróprias para banho.

Essa classificação é baseada em densidades de bactérias fecais, medidas em amostras coletadas ao longo de cinco semanas consecutivas.

Nas redes sociais, há várias queixas de quadros gastrointestinais em praias do litoral, em especial em Guarujá. A comunicadora Roberta Martinelli conta que ela e outras dez pessoas que estavam em uma casa na praia de Pitangueiras desenvolveram sintomas a partir do dia 27 de dezembro.

"A gente pensa: 'Normal, Guarujá sempre foi assim, deve ser a água, vai passar'. Mas aí todo mundo vai ficando mal, a maioria com enjoo, vômito e diarreia. Não dá para normalizar isso."

Ela diz que teve dificuldades de comprar remédios para o controle desses sintomas. "A gente rodou várias farmácias e não tinha. No fim, achamos uma caixa."

A Folha tentou fazer compras online desses medicamentos em Guarujá. Na DrogaRaia, o estoque estava zerado e a Drogaria São Paulo só dava opção de disponibilidade em quatro dias.

O administrador de empresas Paulo Ramos, 51, afirma que esteve no final do ano em Guarujá com sua família e amigos, quando sua filha de 11 anos e outras crianças do grupo começaram a passar mal com vômitos, febre e diarreia.

Em busca de atendimento, ele foi ao Hospital Ana Costa, no bairro Jardim Tejereba, e enfrentou longas filas e superlotação. A reportagem tentou contato com o hospital, por meio da assessoria de imprensa, mas não teve retorno.

"Chegamos ao hospital por volta das 21h, e minha filha, que já estava desidratada, só foi atendida às 2h da manhã. As filas eram enormes, e as pessoas estavam sentadas no chão, pois não havia mais lugares disponíveis", relata.

Ramos cita também um vácuo de medidas preventivas por parte das autoridades e diz que sentiu falta de informações sobre o que estava acontecendo no litoral.

"No hospital, entrei no sistema da Sabesp [Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo] e vi que todas as praias estavam sinalizadas com bandeira verde. É um absurdo diante do que estava acontecendo. A prefeitura deveria interditar as praias, mas parece estar ignorando a gravidade da situação."

Ele diz que no PS escutou de outros pacientes que um duto de esgoto havia estourado no mar. Procurada, a prefeitura informou que havia acionado a Sabesp para apurar a existência de vazamento ou derramamento de esgoto irregular na cidade, especialmente na região da praia da Enseada.

Vinícius Gentil, 23, estagiário em uma empresa de suplementos alimentares, relata que 4 amigos de um grupo de 12 apresentaram sintomas de virose em Guarujá, o que levou a turma a antecipar a volta para São Paulo no dia 1º de janeiro. "A gente se cuidou em casa, tomando alguns remédios, Gatorade e água de coco, além de descansar."

Segundo Roberta Martinelli, diante de tantas pessoas sintomáticas em Guarujá, enfrentou dificuldade para usar banheiros em estabelecimentos comerciais. "Minha filha queria ir ao banheiro no supermercado, mas estava todo cheio de vômito no chão. A caixa estava passando mal, com virose também."

Ela tentou usar o banheiro de uma farmácia próxima, mas também não teve sucesso. "A atendente disse que não poderia deixar usar senão ia 'virar uma zona' porque está todo mundo passando mal."

Segundo a prefeitura, o aumento no número de casos de virose é comum nesta época do ano devido a diversos fatores, como temperaturas elevadas, aglomeração de pessoas e falta de cuidados com alimentação.

De acordo com a infectologista Rosana Richtmann, do Instituto Emílio Ribas, com o aumento de turistas no litoral, é muito comum a contaminação da água porque a rede de saneamento fica sobrecarregada e esgoto sem tratamento costuma ser lançado no mar.

Um dos vírus mais comuns responsáveis por esses surtos, segundo ela, é o norovírus, com alta capacidade infecciosa e resistência, que pode ser transmitido pelo consumo de alimentos e água contaminada, além do contato com pessoas infectadas.

"A pessoa vai limpar o vômito da criança no chão, por exemplo, e acaba se contaminando porque é um vírus que resiste no ambiente. A criança também pode ser infectada brincando na areia contaminada."

Além disso, ela alerta que o vírus pode ser transmitido por meio de alimentos preparados com água contaminada ou manipulados por mãos não higienizadas de forma correta.

"Quem vai limpar alguma coisa, um banheiro, tem que se proteger usando uma luva e higienizar muito bem as mãos porque é alto o risco de contaminação."

Segundo a médica, se a opção for comer na praia, a orientação é evitar alimentos que sejam mais perecíveis ou que levem maionese, cremes e molho tártaro, por exemplo. "Coisas muito gordurosas ou à base de ovo facilitam muito a proliferação de microorganismos, inclusive bactérias."

Ela também recomenda que as pessoas prefiram consumir água com gás em locais em que há dúvida sobre a procedência do produto. "Água com gás, a gente tem certeza de que é industrializada, e o pH é um pouco mais ácido, o que bactéria não gosta."

Também é preciso muita hidratação. "Não pode passar o dia inteiro na praia e não beber líquidos porque, se você adoecer, vai desidratar rápido."

Diante de sintomas de virose, ela recomenda uma medicação antiemética (contra náuseas e vômitos) que seja via sublingual porque a absorção é mais garantida. "A partir daí, você pode usar um soro caseiro ou tomar esses isotônicos que têm todos os sais minerais."

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