PERSONA

'Saúde de Piracicaba evoluiu 50 anos em 30', diz Perci Bertolini

Por Roberto Gardinalli | roberto.gardinalli@jpjornal.com.br
| Tempo de leitura: 8 min
Claudinho Coradini/JP

Escolhido pela federação Brasil pela Esperança, que é composta pelos partidos PT, PV e PC do B, como pré-candidato a vice-prefeito de Piracicaba, Perci Zilli Bertolini é um médico experiente, que já atuou tanto na saúde pública, como na saúde privada. Iniciou sua vida na medicina em 1982, quando se formou médico, e se especializou em cirurgia oncológica e de cabeça e pescoço em 1986. De lá para cá, muita coisa mudou, tanto na formação da cidade, quanto no exercício da profissão, desde o crescimento da população piracicabana, até a chegada da tecnologia e informática aos tratamentos de saúde nas unidades básicas. Veja entrevista do vice da Professora Bebel nas eleições deste ano:

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Sua trajetória na medicina e na saúde em Piracicaba são os principais assuntos da entrevista de Perci Bertolini à seção Persona do Jornal de Piracicaba.

Conte um pouco da sua trajetória na medicina, a sua especialidade e como a escolheu.
Escolhi a medicina desde que me conheço por gente. Acredito que tenha sido fortemente influenciado pelos meus pais que através do espiritismo, ajudavam muitas pessoas, inclusive doentes que procuravam nossa casa. Cresci com a mentalidade de que descobriria a cura do câncer e ser médico era meu maior objetivo de vida. Se voltasse no tempo, faria tudo de novo. A especialidade, foi consequência daquilo que investi. Fiz cirurgia oncológica e cabeça e pescoço, porque em 1986 não existia ninguém nessa especialidade aqui em Piracicaba.

O senhor atuou por mais de 30 anos como médico da rede pública, com atendimentos em postos de saúde, prontos-socorros e, também, no Centro de Especialidades. Como era a saúde pública em Piracicaba na época em que o senhor atuava nesta área e como vê a situação de hoje?
Formei em 1982 e comecei trabalhar no Pronto Socorro Municipal que ficava, onde hoje é aquela pequena praça, próximo ao Teatro Municipal, começo da avenida 31 de março. Além daquele local, atendia também nos pronto atendimentos do Hospital Santa Mônica e Santa Casa. Quando um plantonista recebia algum paciente mais grave, ligávamos para os hospitais e enviávamos esses pacientes, direto para Santa Casa ou Hospital dos Fornecedores de Cana. Os hospitais por sua vez, não contavam com muitos serviços que hoje em dia, é impensável não ter. Não havia intensivistas nas UTIs. Não havia hospitalistas nas enfermarias e quando ocorriam intercorrências com pacientes internados, era o plantonista do hospital que se deslocava para enfermaria ou UTI e resolvia. Os hospitais não tinham ainda, hemodiálise, hemodinâmica, centros de oncologia, laboratório 24 horas, entre outros. A rede pública cresceu e se estruturou bastante, assim como os hospitais que se modernizaram e investiram em novas tecnologias, equipamentos e serviços. Hoje, eu diria que Piracicaba evoluiu 50 anos em 30. Fruto do trabalho de muita gente envolvida com a saúde.

Uma das reclamações mais comuns que recebemos é a da demora no atendimento das UPAs da cidade. Com a sua experiência na rede pública, quais medidas seriam eficientes para diminuir esse problema?
Em 1983, Piracicaba tinha em torno de 250 mil habitantes e hoje, pelo censo de 2022, temos uma população estimada em quase 440 mil habitantes. Se fizermos os cálculos, a população não dobrou, mas se somarmos todos os serviços oferecidos à população, mais que triplicamos a oferta. Então, porque tanta reclamação, se oferecemos mais UPAS, mais Unidades de Saúde da Família, mais Unidades Básicas de Saúde, Resgate 193 que é o Corpo de Bombeiros, também envolvidos com a saúde, SAMU 192, que não é apenas um serviço de ambulâncias, mas uma unidade que salva vidas e ajuda diminuir a morbimortalidade, assim como o 193. A cidade conta com mais especialistas, o hospital Unimed também dá suporte ao atendimento do SUS, nas emergências, o COT, o hospital Regional e por aí vai. Porque a população reclama? É pontual? Ou será que as unidades básicas de saúde oferecendo atendimento limitado, menos ágeis, concorrem para uma sobrecarga das unidades de urgência e emergência, que deveriam servir apenas para urgências e emergências e acabam atuando como unidades ambulatoriais? Os hospitais que deveriam arcar somente com atendimento terciário, acabam servindo muitas vezes de amparo diagnóstico!  Como a rede é morosa, os hospitais acabam, muitas vezes, virando centros diagnósticos e de tratamento que o sistema básico de saúde não consegue oferecer. Além disso, o sistema pré-hospitalar está bem estruturado, mas o pós-hospitalar, não. Muitas vezes, o paciente tem alta e logo depois reinterna, porque não há resposta rápida nos pós alta hospitalar. Enfim, vejam que não existe uma resposta única. Será necessário um conjunto de medidas que precisam ser adotadas para que o sistema todo, funcione melhor. Temos ainda a faculdade de medicina que deve se integrar mais ao sistema de saúde da cidade, com ambulatórios de especialidades e atendimento à população como ocorre com as tradicionais faculdades de medicina do país. A faculdade de Odontologia também é antiga na cidade e já oferece ótimos serviços à Piracicaba. Conversar com esses parceiros, me parece ser uma atitude honesta para com os seus alunos e também com os pacientes de Piracicaba e região. É necessária muita conversa e alinhamentos de parceria efetivas com todos os atores envolvidos. Mesmo sem dinheiro novo, certamente conseguiremos melhorar e Piracicaba aumentará sua referência no sistema de saúde regional, que já é grande. Isso sem contar que teremos apoio do governo federal, quando apresentarmos projetos com indicadores e índices confiáveis para mais verbas e transformar nossa região metropolitana, em um polo de atendimento em saúde, comparável às cidades como Rio Preto, Ribeirão Preto e Campinas.

Outra medida que foi tomada para agilizar o atendimento na rede pública de saúde é a implementação da telemedicina. O que o senhor acha dessa modalidade?
A informática também chegou na Medicina. A telemedicina é uma ferramenta interessante para o atendimento à população, estando seu uso cada vez mais frequente. Serve para orientações mais simples e facilita a vida do cidadão. No entanto, é apenas mais um serviço oferecido e no meu modo de ver, não o mais importante. A telemedicina não substitui a boa e velha medicina, quando o médico olha nos olhos do seu paciente, ouve sua história, examina seu corpo e vira um amigo confiável. Estamos banalizando a medicina. Então, não sou contra, mas hoje, temos que tomar muito cuidado, atenção e responsabilidade quanto às suas aplicações que ainda são bastante limitadas.

O senhor também tem experiência na rede particular de saúde. Como a vivência na saúde pública te ajudou na sua carreira na saúde particular? Quais as diferenças?
A saúde pública traz muita experiência, pela quantidade de casos que você atende. Na maioria das vezes, sem ser padrão ouro, mas você vai lá, e resolve. Quando levamos essas vivências para o consultório, onde atendemos pacientes conveniados ou particulares, o atendimento na rede pública serve de grande aprendizado em nossa evolução, encurtando tua curva de aprendizado. Penso que algumas diferenças são notáveis. Na saúde privada, conhecida também como saúde complementar, você tem mais opções de clínicas para diagnóstico (ultrassom, tomografia, ressonância, endoscopia, patologia, etc). Existe também mais diversidade de especialistas. Então, quando você precisa de um dermatologista, endócrino, cardiologista ou otorrino, você encontra mais opções e o atendimento é feito em consultório, o que faz haver um envolvimento maior do médico com o paciente. Na rede pública, existe menos agilidade e maiores limitações, em quase tudo. No entanto, o SUS acaba dando maior cobertura em algumas ações que a medicina privada tem mais dificuldade de oferecer. Tudo isso acaba se resumindo na agilidade, e necessidades de trabalhar o dinheiro que o gestor tem para usar.

Uma das dificuldades da prefeitura hoje em dia é a contratação de médicos para a rede pública de saúde. Na sua visão, é vantajoso ser médico da prefeitura? Como tornar o cargo mais atrativo?
Estou aposentado do serviço público há quase 6 anos e, portanto, não estou atualizado quando aos ganhos médicos, no serviço público. Quando falo de ganhos, não é apenas dinheiro, mas investimentos no seu currículo. É para se deduzir que o médico, assim como qualquer outro profissional, vai trabalhar onde possa ganhar melhor ou ter mais benefícios.
Pagar melhor o médico, oferecer cursos que possam recapacitar ou melhorar sua performance, reflete em ganho também à população assistida. Contrato trabalhista que gere segurança de emprego, plano de cargos, carreira e salários, cursos de mestrado, doutorado, ATLS, ACL, servem de incentivos que estimulariam mais e melhores médicos atuarem na rede pública.

Por fim, na sua opinião, qual é o grande desafio para a saúde de Piracicaba hoje em dia?
Nas passagens de ano, desejamos aos amigos e familiares, feliz ano novo! Desejamos ainda, “Saúde para dar e vender”. Quando adoecemos, sentimos medo, dor, insegurança. E quando o ser humano fica doente, ele precisa de apoio, atenção, colo. Então, se dermos mais atenção ao cidadão doente, ou que precisa de atendimento, os desafios ficam mais fáceis de serem vencidos. Acolhimento é a palavra. Termos serviços que ofereçam acolhimento, é mais importante que um arsenal de máquinas e equipamentos que necessitamos, mas que são instrumentos frios e insensíveis, ao que o ser humano sente. Profissionais de saúde engajados, sorridentes e acolhedores, podem mudar muito o panorama de tudo. Investir em melhorias para os funcionários da saúde, investir em recursos que diagnostiquem mais rapidamente uma possível doença, fazer busca ativa para prevenção e tratamento de diversas doenças, são fatores que merecem atenção e o grande desafio é trabalhar com dedicação. 
Além disso, educar a população para saber quando e como usar os recursos públicos disponíveis, pode ajudar a organizarmos um fluxo de atendimento mais dinâmico, consciente e responsável.

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