CORTA MATO

Prova resiste ao tempo com muitas histórias: ‘corrida acontece faça chuva, faça sol’

Com quase quatro décadas de existência, o evento na Esalq/USP acontece todos os primeiros domingos do mês e é aberta a todos

Por Erivan Monteiro | 25/02/2024 | Tempo de leitura: 6 min
erivan.monteiro@jpjornal.com.br

Fotos – Divulgação

Participantes da prova em 1988: histórias de amor ao esporte e às corridas
Participantes da prova em 1988: histórias de amor ao esporte e às corridas

Há quase quatro décadas, um grupo de piracicabanos se encontra todo o primeiro domingo do mês na Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) para celebrar a vida por meio do esporte. A corrida Corta Mato é uma tradição na cidade e reúne não somente pessoas ligadas à universidade, mas todos aqueles que gostam de muita adrenalina. A próxima edição será no domingo (3 de março), às 8h, com inscrição gratuita momentos antes da largada.

Essa aventura começou no início do ano de 1985, quando um grupo de amigos, composto por pessoas comuns e corredores mais experientes, iniciou o Corta Mato. Eles corriam na Esalq/USP todos os dias, nos finais de tarde, alguns juntos e outros não, pois os ritmos e o preparo físico eram diferentes. Após os treinos, se sentavam na escadaria em frente ao prédio central do Campus para um bate-papo descontraído.

“Naquele momento foi gestado um objetivo que era também um sonho: uma corrida perene, todo primeiro domingo do mês, um local de encontro feliz, onde amantes das corridas se encontrariam para confraternizar. Um dos idealizadores foi além e disse: ‘mesmo aqueles que já estão na eternidade estarão aqui, conosco’”, conta o engenheiro agrônomo Adelino Augusto Duarte, 69 anos, que atualmente é o diretor-geral do evento.

Duarte contou que, a partir de então, firmou-se um compromisso inegociável: se chovesse forte, se nevasse, ou “mesmo que fosse uma chuva de canivetes”, ainda assim a prova ocorreria. “Ao propor isso, nem imaginávamos que enfrentaríamos uma pandemia”, lamenta o diretor.

O termo “corta mato” é uma designação que os portugueses davam às corridas desta categoria, que aconteciam em terreno misto, terra-asfalto-pedra, com vegetação e elevações. “É um nome multicentenário e que faz parte da nossa história luso-brasileira. Por isso, é um nome que nos orgulha bastante”, explica Duarte.

O diretor-geral disse que os participantes têm um carinho enorme pela corrida Corta Mato. “Puro amor! Quem corre por querer não se cansa nunca. E cada um que corre sabe o amor que carrega em si pelas corridas de rua, pelas corridas de trilha, pelos trotes nas avenidas. Correr é magnifico, é saudável”, discursa.

CORREDORES

A média atual na corrida gira em torno de 120 atletas. No último encontro, em fevereiro, participaram 153 pessoas. “A família Corta Mato não para de crescer. Nós temos alguns lemas que foram surgindo ao longo destas quase quatro décadas. Um deles diz: ‘Durma tranquilo, o Corta Mato é inevitável’. Outro arremata: ‘Só existem duas certezas na vida e uma delas é que o Corta Mato dá a largada todo primeiro domingo de cada mês’. No ano passado, o primeiro domingo do mês coincidiu com o feriado de 1º de janeiro. Sabe o que aconteceu? Alguma dúvida? Teve corrida Corta Mato, sim senhor”, se empolga o diretor-geral.

‘ENLAMEADOS’

Ao longo da história, a Corrida Corta Mato construiu muitas histórias, algumas inesquecíveis. “São milhões de histórias. De união, de parceria, de superação. Eu me lembro de quando começaram a construir o prédio da biblioteca do Campus. Na ocasião, abriram uma valeta para o esgoto que cortava a estrada, que era de terra. A valeta tinha mais ou menos um metro de fundura e toda a terra foi deixada de lado, impedindo qualquer possibilidade de desvio”, recorda o engenheiro agrônomo Adelino Augusto Duarte, diretor-geral da prova.

“Acontece que na noite anterior à corrida choveu muito e o buraco se encheu de água, além de o percurso ficar tomado pela lama. A chegada daquela corrida ficou marcada na memória dos participantes. Alguns corredores acabaram caindo no buraco. Susto à parte, no final foi hilário ver os atletas chegando cobertos de lama. Lembro-me que um dos mais enlameados era o saudoso Alfenderim, um dos fundadores do Corta Mato. Naquele dia, tudo acabou em festa e brincadeira”, emenda.

Em outra ocasião, há mais ou menos 10 anos, houve uma ventania muito forte em Piracicaba que derrubou muitas árvores pela cidade e na Esalq não foi diferente. Quando os organizadores chegaram para fazer os preparativos da corrida, perceberam que a situação estava complicada. Um deles chegou a dizer que não daria para realizar a corrida naquele dia, pois o caminho estava bloqueado pelas árvores caídas. Mas o evento aconteceu. “Logo no início do percurso, havia uma árvore imensa bloqueando o caminho. Alguns passaram por baixo, outros por cima e entre muitas brincadeiras e alegria completamos o percurso”, diz Duarte.

“Ao longo de quatro décadas, o Corta Mato teve o privilégio de receber pelo menos um campeão da São Silvestre e alguns campeões sul-americanos de renome nas corridas. São tantos momentos especiais e histórias pitorescas que certamente dariam para escrever um livro”, finaliza o diretor.

TRAJETO

Quanto ao trajeto, inicialmente foi idealizado um primeiro percurso que margeava o rio Piracicaba, mas era perigoso devido a arvores caídas, cobras, porcos do mato e outros inconvenientes. Então, foi elaborado um segundo trajeto, que teve que ser abandonado após o surto de febre maculosa ocorrido há uns 20 anos.

O trajeto atual de 6.750 m. Também, foi acrescentado um percurso mais curto, mais plano e mais acessível. “Assim, a partir daquele momento, passamos a oferecer dois percursos para os corredores, um em que o atleta pode fazer 6.750m e outro de 5.300m. O percurso mais longo é também mais desafiador, passando por um terreno mais acidentado, que inclui a famosa ‘serrinha’. Mas o fato é que em ambos os percursos a paisagem é indescritível, maravilhosa”, garante Duarte.

CONVITE

“Gostaria de aproveitar o espaço para convidar o povo de Piracicaba para que venha conosco participar desta festa que é a corrida Corta Mato. O objetivo aqui não é a competição e sim a confraternização entre corredores. Costumamos brincar que aqui, se você não corre, sem problemas, você anda. Se você não anda, sem problemas, você pode rolar, engatinhar, espreguiçar. Apenas faça seu corpo funcionar!”, explica o organizador. “No Corta Mato você é a pessoa mais feliz do mundo. Venha rir e conversar com o pessoal. Viva o encanto de sentir a brisa no rosto”, emenda.

“Por aqui estamos sempre procurando fazer melhorias para atender aos nossos corredores. Confeccionamos uma camiseta especial do Corta Mato que todos os participantes podem adquirir e estamos implementando um sistema eletrônico de cronometragem das corridas. Também adquirimos um sistema de som para melhorar a comunicação com os participantes. Outras melhorias virão em breve”, explica Duarte.

“Um dos momentos mais marcantes do dia é quando todo o grupo se reúne ao final de cada prova nas escadarias do prédio central para a foto oficial e o grito de guerra que já virou tradição. Ninguém deixa o local antes deste momento”, finaliza o diretor.

Duarte (3º na foto) com seus amigos, que também organizam a prova: amor ao esporte

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