De quem virá, agora, o som do contrabaixo?

Por David Chagas | 01/02/2021 | Tempo de leitura: 3 min

Para onde vamos? Humanos? Quem? Onde? Perdemos a consciência desta condição! Quantos se dizem humanos e não se reconhecem na espécie. A Escola precisa ensinar essa consciência de pertencimento à Humanidade.

Há quase uma semana perambulo pela casa repetindo o que lhes dito acima, à procura de remédio que me desperte do incômodo que tomou conta de mim e me fere a alma desde o instante em que soube ter-se calado o contrabaixo de Antonio Roberto Roccia Dal Pozzo Arzolla.

Se ouço uma canção de ninar, me ajudaria? Dar-me-ia certeza do descanso deste meu aluno? Uma composição de Ernst Mahler ou a belíssima Meditação de Thaís para noneto de contrabaixos, com solo dele traria, de algum modo, resposta a cada uma das perguntas que perambulam pelo meu cérebro? Insisto comigo mesmo fingindo entender, sabendo que até mesmo Deus na sua grandeza desentende a razão de tudo isso. Se fosse ao Rio de Janeiro e perambulasse por lá encontraria resposta para um contrabaixo em silêncio, à procura de um dos melhores solistas do Brasil, sempre em interpretação virtuosa a seu público?

O velho professor ainda o vê, na sala de aula, durante os anos em que dividiu com ele e outros estudantes conceitos de literatura e teoria da linguagem, ajudando a descobrir a beleza do instante e a verdade da vida como só a Literatura é capaz. Não é para isso que existem escolas? Quem poderá sair inteiramente realizado de instituição que passa o tempo cobrando resultados fazendo seus jovens deixarem pelo caminho, dons, talentos, virtudes e alma tão mais importantes que vestibular?

Sinto que Antonio Roberto virá à sala em que descanso da sequência de aulas, para poucas, mas inesquecíveis conversas, me obrigando a refletir acerca destas e de tantas outras indagações em torno da natureza, etapas e limites do conhecimento humano.

Como ele, também me atormentava ver grupo agradável no convívio, não nego, mas formações distintas, cruéis nas avaliações feitas a respeito de cor, corpo, fala, modo de ser, como se isso tudo fosse o que de melhor pudesse reconhecer e notar no ser humano. A escola não sabe intervir nisso. Ela trata a todos visando resultados para ampliar, com isso, sua presença onde está.

Se a Escola nada sabe da vida, como dar ao aluno alguma condição para decifrar a forma enigmática como se apresenta e saber da coragem necessária para o enfrentamento? Ensinar não é para qualquer um. Vocação, preparo, formação. Estudo diário. Dar ao Ser, importância maior que ao Saber e ao Fazer e esperar pelo retorno no longo prazo. Quem sabe ser tem a porta aberta para o mundo. Leiam o que dizem sobre Antonio Roberto, como professor. Músico, vejam as críticas de seu trabalho em jornais do Brasil e do mundo. Aplaudam, como aplaudi, sua presença na Fundação Gulbenkian, em Lisboa. É com isto que os pais devem sonhar, antes de pensar em que universidade estará seu rebento. É disto que se devem honrar de seus filhos como dona Carolina Arzolla, orgulhosa dos seus.

Antonio Arzolla. Graduado em Contrabaixo. Mestre, com louvor, em práticas interpretativas. Professor em diferentes instituições do Rio de Janeiro. Ativo participante da Orquestra Sinfônica Brasileira e do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Vencedor em diferentes concursos. Medalha de Ouro na UFRJ.

Orgulhosamente Piracicabano.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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