Março Torrencial

Por José Faganello | 04/03/2020 | Tempo de leitura: 3 min

“É pau, é pedra/é o fim do caminho/é um resto de toco/é um pouco sozinho/é um caco de vidro/é a vida, é o sol.” (Tom Jobim)

O Sol reapareceu até que não perturbou muito o Carnaval. As mortes e destruições, causadas pelas chuvas, foram logo depois Tristeza e alegria não se misturam. A euforia dos sambistas e das arquibancadas foi uma demonstração inequívoca de que as desgraças do temporal já estavam esquecidas.

Foi uma ilusão. Principalmente para os moradores da Grande São Paulo. Justamente à noite a enxurrada levou quase tudo de roldão.

O mesmo está acontecendo com nossa política. De há muito, nossos homens públicos abusam da desfaçatez, deixando de lado sua obrigação de defender os interesses dos seus eleitores, ao mesmo tempo em que não se esquecem de defender seus interesses particulares. O constante agir desta forma e a frequência com que os abusos de nossos dirigentes são noticiados tornam estes escândalos corriqueiros. O eleitor acaba perdendo a capacidade de indignar-se.

O caso da aposentadoria dos parlamentares é um exemplo, cuja imoralidade é digna de repulsa geral. Se os eleitores tivessem real espírito cívico, levantar-se-iam coesos, não apenas para protestarem, mas para cassarem para sempre, tão indesejáveis e cínicos representantes.

Levar vantagem é um ato que, se não combatido, torna-se compulsivo. De há muito que as maracutaias de nossos representantes são praticadas. Como nunca houve contra elas a devida reação e a necessária punição, avolumaram-se de uma maneira tal, que colocam nossa frágil democracia em perigo.

Pior que a ameaça das águas de março, no entanto, é a ameaça de nosso Legislativo. Ele retornará a discussão das chamadas reformas. A desfaçatez e o corporativismo deverão continuar privilegiando, em primeiro lugar, seus próprios interesses e em segundo lugar os daqueles que financiam suas campanhas políticas.

Muitos acham que criticar nossos políticos é fazer um desserviço à democracia, pois desilude ainda mais o eleitor. Até agora prevaleceu a tática da avestruz – enterrar a cabeça num buraco e deixar rolar o que acreditam que não adianta combater.

A vida de cada um de nós está intimamente interligada com a política. Assim como a água é indispensável para a vida, a política e fundamental para a qualidade de vida dos cidadãos.

Para Aristóteles, a política é a continuação da ética e deve coroar o trabalho da razão, tornando-a presente na vida do Estado.

Para Hegel é no Estado que o indivíduo encontra sua essência universal realizada de modo concreto. O dever do cidadão é ser membro do Estado e reconhecer-se nele, porque o Estado retira-o do estado da natureza e da violência e coloca-o no estado de direito. É por isso que necessitamos participar da política. Omitir-se, deixar acontecer, sentir nojo da política é deixar a porta aberta para os arrivistas.

Embora a política seja feita “por paus e por pedras” e na maioria das vezes nos deixe com a sensação de estarmos sozinhos a combater por um ideal, é necessário não fugir dela, caso contrário, no lugar da vida que desejamos, encontraremos apenas o fim do caminho, ou seja, da democracia.

Pressione o candidato que você votou. Se não agir corretamente, não vote mais nele. Vai demorar, mas deixaremos uma rica herança para nossos filhos.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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