Céu X Inferno

Por José Faganello | 05/02/2020 | Tempo de leitura: 3 min

“O rústico porque é ignorante, vê que o céu é azul; mas o filósofo, porque é sábio, e distingue o verdadeiro do aparente, vê que aquilo que parece azul, nem é azul nem é céu”. (Padre Antônio Vieira – Sermão da Quinta- -Feira da Quaresma).

A palavra céu vem do latim (caelum)) e refere-se às regiões muito acima da superfície terrestre onde se pode ver os astros.

Passou a significar também a morada de Deus, seus anjos e dos justos, após suas mortes.

Na civilização mesopotâmica, seus deuses eram sanguinários e déspotas, e apenas se aplacavam com sacrifícios e oferendas. A morte era o aniquilamento definitivo. A sombra dos mortos descia para o abismo das trevas, onde se alimentavam de poeira e de lama, por mais puro que tivesse sido sua existência na Terra.

A moral dos habitantes era a do prazer, gozar enquanto vivo porque após a morte só restava sofrimento e dor.

Na civilização egípcia, o morto que conseguisse usar o Livro dos Mortos, poderia chegar até Osiris, na esfera de venturas, caso contrário iria para uma região de dores e aflições.

Acreditando na imortalidade da alma (Rá), mumificavam o defunto, pois se a alma não voltasse para o corpo (Ká), era porque ele não tinha sido conservado. Essa prática ajudou a medicina egípcia ao desvendar os estragos feitos pelas doenças dentro do corpo do morto.

O céu dos gregos localizava-se no Monte Olimpo. Seus deuses lá habitavam e tinham formas humanas (antropomórficas). Embora imortais, eram sujeitos às fraquezas e sentimentos humanos: dor, alegria, inveja, luxuria, etc.

Maomé, ao unificar as tribos árabes, acabou com o politeísmo e implantou o monoteísmo, com Alá, único deus.

Os guerreiros islâmicos mortos em combate iam direto para o Paraíso, lugar com belos jardins, rios de águas frescas, não faltavam alimentos saborosos nem lindas mulheres.

O Inferno islâmico (Geena) é um lago de fogo reservado para os assassinos, ladrões, agiotas, avarentos, hipócritas e infiéis.

Dante Alighieri em sua monumental Divina Comédia, em Inferno III, suscintamente conseguiu preocupar que lê sua obra, mesmo aquele que nega a existência de céu e inferno, com esses contundentes versos: “Por mim se vai à cidade ardente,/ por mim se vai à sempiterna dor,/ por mim se vai à condenada gente./.../ Deixai toda esperança, ó vós que aqui entrais”.

Omar Kháyyán em Rubáyát, não hesitou em perpetuar sua descrença, contrariando Dante com esses versos: “Oh, ameaças do Inferno e esperanças do Paraíso!/ Pelo menos uma coisa é certa: esta vida voa:/ Uma coisa é certa e o resto são mentiras:/A flor que uma vez desabrochou morre para sempre”.

Há muitos anos, ainda em minha juventude, ouvi de um exímio pregador uma homilia sobre o Paraíso.

Começou descrevendo demoradamente as venturas incalculáveis que lá poderíamos gozar, para em seguida enumerar uma por uma as renúncias que teríamos de fazer para alcançar o tão cobiçado prêmio.

O desejo das delícias anunciadas foi esmorecendo à medida que ouvimos que o caminho para lá é cheio de espinhos, subidas íngremes, enormes pedras e precipícios mortais, renúncias de tentadoras oportunidades de gozos imediatos. Talvez percebesse nos semblantes dos ouvintes a desilusão, pois na tentativa de reanimar os desiludidos, arrematou sua prédica com a sentença do poeta Schiller: “Um momento vivido no Paraíso/ não se paga caro demais com a própria morte”.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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