Ideias

brasil hoje é um bicho de sete cabeças

Por Guilhermo CodazziJornalista e escritor, editor-chefe de OVALE e Gazeta de Taubaté e autor de dois livros da série Cartas Perdidas. | 02/11/2018 | Tempo de leitura: 3 min

Com suas várias cabeças, todas elas aterrorizantes, Hidra de Lerna era um monstro que habitava um pântano junto ao lago de Lerna, narra a mitologia grega. Filha de Tifão e Equidna, Hidra tinha corpo de dragão e as temidas cabeças de serpente, todas mortais -- de tão venenoso, matava os homens só com o hálito e os comia. Só de cheirar seu rastro, quando o monstro dormia, o ser humano morreria. Hidra, de acordo com a lenda, tinha ainda a capacidade de se regenerar quando perdia -- aqui, literalmente -- a cabeça. Se uma delas fosse ceifada, nasciam duas no lugar. Como derrotar um ser tão poderoso?

Tarefa para um herói mitológico: Hércules. E para ser mais preciso, foi a segunda das 12 tarefas do filho de Zeus. Como vencer as cabeças de serpente? Inicialmente, em vão, tentou cortá-las, mas, como dito antes, a cada uma que era decepada nasciam mais duas, igualmente letais. Hércules decide então alterar a estratégia. Ele pediu que o sobrinho queimasse, usando um tição, as cabeças logo após o corte, cicatrizando assim a ferida e impedindo que o monstro se regenerasse.

Funcionou!

No entanto, restava a cabeça do meio, que era imortal. E Hércules cortou e enterrou a última cabeça com uma enorme pedra, narra a lenda mitológica.

No Brasil, onde a palavra 'mito' hoje está em evidência, quem terá um trabalho hercúleo pela frente será o presidente eleito Jair Bolsonaro, do PSL. Vencedor de uma disputa que dividiu os brasileiros, o pesselista agora possui a tarefa de comandar o país, terra com antigas e novas feridas difíceis de cicatrizar. País que, infelizmente, ainda está longe de encarar face a face seus fantasmas do passado -- sem empurrá-los para debaixo do tapete, como faz ainda hoje com os abomináveis anos de chumbo ou onde, ainda hoje, há quem culpe o africano por séculos de escravidão -- e do presente.

Como, assim, encontrar respostas que criem um caminho reto e seguro para o futuro?

Bolsonaro tem pela frente mais, bem mais do que 12 tarefas.

São desafios como, por exemplo, equacionar a profunda crise econômica e o terrível desemprego que assola 14 milhões, cumprir a promessa de refundar o sistema político (sistema hoje combalido, enferrujado e aprodecido do qual faz parte há 27 anos), combater o monstro da corrupção, a violência que ceifa mais de 60 mil vidas todos os anos, diminuir o abismo social, encontrar uma saída para o rombo da Previdência, e outros, além de reunificar o país partido.

Apesar de ter sido apelidado de mito, por seus seguidores, Bolsonaro é homem e não um salvador da pátria. Para governar o Brasil, precisará de várias cabeças. E até aqui, como na campanha, é difícil identificar um discurso homogeneo no projeto que saiu vitorioso das urnas. Até integrantes do núcleo próximo já foram desautorizados pelo presidente eleito -- como o vice-presidente Hamilton Mourão, e seus futuros ministros Onyx Lorenzoni e Paulo Guedes.

Afinal, o que pensa o governo de Bolsonaro? O 'mito' da campanha já é passado, é preciso encarar de frente a realidade. Governar o Brasil é um bicho de sete cabeças..

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Receba as notícias mais relevantes de Vale Do Paraíba e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.