TECNOLOGIA

IA turbina acelerador de partícula e hidrogênio verde na capital

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Divulgação
Visão aérea do acelerador de partículas Sirius
Visão aérea do acelerador de partículas Sirius

De tamanho próximo ao do estádio do Maracanã e construído com investimentos totais de R$ 3 bilhões, o Sirius é um acelerador de partículas com porte apenas comparável a outros dois no mundo. Capaz de enxergar átomos e reações químicas, ele está na origem de avanços que veremos no futuro em áreas como saúde e agricultura.

Esse monumento à ciência, de 68 mil m² e consumo de energia suficiente para abastecer 80 mil casas, seria dinheiro e tempo jogados fora se não fosse a tecnologia do momento: a inteligência artificial. Sem ela, seria impossível processar as milhões de fotos geradas em um único experimento.

Localizado na zona rural de Campinas (SP), o Sirius é o exemplo mais evidente de como a cidade do interior paulista se tornou um polo de tecnologia no Brasil e aplica o poder sobre-humano da IA nas mais diversas áreas, da segurança pública ao monitoramento da saúde, passando pela descoberta de novos materiais e combustíveis.

Hoje, a bola da vez é a IA generativa, aquela capaz de produzir conteúdo de forma parecida com a de um ser humano. Uma pesquisa citada pela Universidade de Stanford em seu relatório sobre IA aponta que apenas esse tipo bem particular da tecnologia deve gerar R$ 24,6 trilhões em receitas adicionais para alguns segmentos econômicos. Campinas, porém, trabalha com uma visão mais ampla da IA.

"Basicamente é coletar dados do mundo, de sensores e câmeras, interações com usuários. Levar isso para o computador, analisar os dados, aprender com eles para extrair padrões e assim chegar a conhecimentos para tomar decisões e atuar novamente no mundo", destaca Anderson Rocha, professor do Instituto de Computação da Unicamp.

Rocha é o coordenador do Recod.AI, um dos maiores laboratórios de IA da América Latina. Com cerca de 200 colaboradores na universidade e mais 100 pelo mundo, o centro conduz pesquisas para multinacionais como Samsung, Nvidia e Shell.

"Para realizar pesquisa de ponta em IA, precisa de capital humano. Como é uma área multidisciplinar, as pessoas têm de ser especialistas nas mais diversas áreas do conhecimento. A vantagem de Campinas é que a Unicamp tem todas essas especialidades em um só local. Física, neurociência, medicina, educação física, matemática, computação, tudo isso num espaço pequeno", diz Rocha.

Exemplo disso é a pesquisa do físico médico Luis Felipe Bortoletto e do cientista da computação Matheus Corrêa Lindino. A dupla está criando um sensor de ansiedade a ser inserido em relógios inteligentes. Trabalham com o Galaxy Watch 5, da fabricante sul-coreana de eletrônicos.

 SERVIÇO PÚBLICO

A pesquisa feita no laboratório também chega a entidades do serviço público. O engenheiro da computação Gabriel Bertocco desenvolve dois serviços voltados para a segurança pública. O primeiro busca imagens de pessoas de circuitos de câmeras. Basta digitar algumas das características físicas e de vestimenta. O segundo analisa pixel a pixel dos vários frames de um vídeo para identificar deepfakes. Graças a isso, ele já deu cursos para a área digital e forense da polícia de Dubai, nos Emirados Árabes, e discute a mesma ação para a Polícia Federal.

 VALE DO SILÍCIO BRASILEIRA

Constantemente apelidada de "Vale do Silício brasileira", Campinas está prestes a ser oficializada como capital da inovação. Na última quarta (26), um projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados deu a Campinas o título de "Capital Nacional da Ciência, Tecnologia e Inovação". O texto segue para o Senado e, se avalizado, irá para a sanção presidencial.

A interação entre academia e iniciativa privada faz da Unicamp um celeiro de startups. São algumas das empresas-filhas ClearSale, Padtec, QuintoAndar e Movile, dona do iFood, Sympla e Playkids. Juntas, essas empresas faturaram R$ 25,9 bilhões em 2023, um salto de 32% em relação ao ano anterior. Com capital aberto na Bolsa de Nova York, a CI&T é uma delas. A prestadora de serviços de transformação digital faturou R$ 2,23 bilhões e lucrou R$ 95,7 milhões em 2023. A maioria dos clientes é norte-americana. "O Brasil tem um potencial gigante para desenvolver tecnologia", diz o vice-presidente da CI&T para América Latina Leandro Angelo. Em algumas dessas empresas, a inteligência artificial é o carro-chefe. Nos centros de pesquisa e laboratórios espalhados por Campinas, a tecnologia é uma ferramenta indispensável. No Instituto Eldorado, uma das maiores organizações de pesquisa aplicada do Brasil, a IA é embutida em projetos encomendados. "A gente trabalha junto à universidade através da pesquisa básica e aplica conhecimento e tecnologia em produtos e serviços de empresas", afirma Mateus Pierre, diretor de software e inovação do Instituto Eldorado.

Durante a visita da reportagem, o executivo mostrou um drone criado para inspecionar torres de energia. Sem citar o nome da empresa, contou que ela quer substituir mão de obra humana pelas máquinas que voam sozinhas para evitar os constantes acidentes. "O que você quer com o hidrogênio verde? Ter um material que, diretamente da luz solar, consiga converter água em moléculas de hidrogénio. Daí já sai o gás para usar em diferentes processos", diz Schleder.

O Sirius é um caso à parte. A começar pelo prédio. Uma das mais complexas obras da engenharia brasileira, ele foi construído para reduzir vibrações. Por isso, canos possuem amortecedores e desnível do chão não passa de 10 milímetros. Funcionando como um grande aparelho de tomografia, o Sirius usa feixes de luz mais brilhantes para analisar objetos em seu nível mais elementar, chegando a verificar os átomos e reações químicas presentes neles. Esse processo gera milhões de fotos, que compõem radiografia para lá de precisa. Mas muito complexa para olhos humanos analisarem.

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