Não há situação mais complexa do que residir em áreas de risco, especialmente em períodos chuvosos. A ocupação urbana revela a desigualdade social e define previamente a parcela que deve suportar tal calamidade. O valor do lote é definido pela localização e pelos investimentos em benfeitorias, excluindo as pessoas de baixo poder aquisitivo, a quem resta o parcelamento irregular, as encostas de morros e as beiras de lagos e rios. Há necessidade da instituição de lote social, que onera qualquer loteamento, ou de lotes urbanizados pelo poder público destinados às referidas famílias.
Há insuficiência de fiscalização e de retirada de pessoas em áreas de risco. Sempre haverá quem pergunte “retirar para colocar onde?”. Por fim, fica para o Município esta responsabilidade. Para resolver o problema, é preciso enfrentar o déficit habitacional com auxílio-aluguel provisório e casa própria, de forma definitiva.
É dever da União, dos Estados e dos Municípios promover “programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais”, conforme a Constituição Federal. Considerando que a União recebe 52,2%, os Estados 26% e os Municípios 21,8% da receita tributária total (dados de 2021, elaborados pela Frente Nacional dos Prefeitos), não é razoável cobrar exclusivamente dos Municípios.
Enquanto as ações judiciais são movidas somente contra os Municípios, os prefeitos ficam escolhendo em razão do risco iminente de dano ou do valor da multa aplicada, com prejuízo de outras necessidades da população. Os órgãos de controle devem acionar o Estado e, no caso de maiores proporções, a União.
É preciso deixar de tratar o ocupante de área irregular como vítima e fazer prevalecer o dever de retirada, com a eliminação do risco à vida, e não utilizar estes momentos para discutir a política habitacional.
Por último, é necessário cobrar rigor técnico dos profissionais de engenharia com os projetos de drenagem, terraplenagem dos lotes, cálculo de índice de declividade e estrutura das obras de infraestrutura. Projetistas, executores, aprovadores e fiscalizadores são profissionais que devem sofrer apuração ética quando os parcelamentos apontam questões estruturais.
Enfim, o enfrentamento do complexo problema de retirar as pessoas de áreas de risco, e incluí-las em programas habitacionais, requer um esforço de entendimento de todo o Estado (as três esferas e os três poderes). Exige também de todos os profissionais, do direito, da engenharia e da política, a compreensão completa do tema e disposição de colaboração. Sem entendimento dos Agentes Públicos, o povo, os mais necessitados, continuarão a sofrer os maiores danos e riscos à vida.