OPINIÃO

Nervo Vago: O Herói da Saúde


| Tempo de leitura: 4 min

Imagine um super-heroi discreto, que trabalha incansavelmente para manter nosso corpo equilibrado, nossa mente calma e a digestão funcionando como um relógio suíço. Esse heroi existe e se chama nervo vago. Apesar de não usar capa, ele tem poderes impressionantes e, quando está em equilíbrio, a saúde agradece. Mas, se ficar sobrecarregado, até o mais zen dos monges poderá sentir os seus efeitos. 

Quem é o nervo vago, afinal? O nervo vago é o décimo par de nervos cranianos, que atua como um amigo que faz mil coisas ao mesmo tempo. Ele sai do tronco cerebral, tem ramos para ouvidos, garganta, laringe, faringe, vai descendo pelo pescoço, abraça o coração, os pulmões, esôfago, estômago, baço, pâncreas, poucas inervações para os rins,  e chega até o intestino delgado e parte do grosso. Praticamente em todos os órgãos. Sua missão? Regular funções automáticas como respiração, digestão, batimentos cardíacos e, pasmem, até mesmo o humor!

Pesquisas, como as publicadas no Frontiers in Neuroscience (2018), destacam o papel do nervo vago no eixo intestino-cérebro. Esse nervo é o canal de comunicação entre o que acontece no intestino (o famoso “segundo cérebro”) e o humor. Sabe aquela ansiedade antes de uma reunião importante? Ou mesmo aquela sensação de “borboletas no estômago”? Culpa, em parte, do nervo vago e suas mensagens viscerais e intestinais.

O nervo vago é o mestre do sistema nervoso autônomo parassimpático, responsável pelo “modo relaxamento e digestão” (o oposto do sistema simpático, que ativa o “modo luta ou fuga”). Quando ele está ativo, seu corpo entende que pode respirar profundamente, desacelerar e digerir aquela feijoada sem entrar em pânico. Ou seja, não podemos viver no “modo automático”, estressado e nervoso o tempo todo, é o vago quem nos ajuda a sair desse estado de vigília excessiva e nos coloca no “modo relax”. 

Mas, na correria moderna, esse nervo muitas vezes fica esquecido, como um heroi aposentado. Resultado? Estresse crônico, má digestão, insônia e um humor mais ácido que o limão verde. Estudos publicados no Journal of Psychiatric Research (2020) mostram que uma baixa atividade vagal está associada à ansiedade, depressão e inflamações sistêmicas.

Agora que já conhecemos o heroi, vamos descobrir como ajudá-lo a brilhar, ativando um “superpoder vagal”. Modular o nervo vago é acolher o ser humano para que ele seja mais “humano”, para que possamos nos conectar com a nossa verdade, nossa essência, com o nosso brilho. Quem consegue isso tudo nervoso, estressado e com dores? Há maneiras de restaurarmos nosso equilíbrio através de intervenções vagais. Veja como é fácil e delicioso!

A respiração diafragmática é um ótimo caminho. Respire fundo, abrindo as costelas, mobilizando toda a caixa torácica (mas não elevando os ombros), mobilizando todo o abdômen (afinal, o vago passa por toda a região), e solte o ar muito devagar. Um estudo do International Journal of Psychophysiology (2017) mostrou que a respiração profunda aumenta a variabilidade da frequência cardíaca (VFC), um marcador da saúde vagal. Como o vago é o principal agente do sistema parassimpático, ele influencia diretamente tanto os batimentos cardíacos, a frequência respiratória, como a variação no intervalo de tempo entre um batimento cardíaco e outro. Isso é a variabilidade da frequência cardíaca, pois apesar do coração ter uma frequência média, ele não bate como um relógio, há variações entre os intervalos que nos indicam a capacidade do nosso sistema nervoso autônomo de se adaptar às demandas internas e externas. 

As vibrações vocais, cantar, rir, ajudam a modular o vago, pois quando a voz vibra as cordas vocais, de maneira prazerosa, ajuda a regular o nosso sistema nervoso autônomo, pois o nervo vago passa pela laringe, então cantar no chuveiro, gargarejar água e mastigar alimentos firmes são exercícios involuntários para essa estrutura. E se sua voz não for digna de um “The Voice”, não se preocupe: o nervo vago não é crítico musical. Vocalizar os sons:  “VOOO…”, “AHHAA…” e “EEEEE” são excelentes para nossa conexão autonômica e energética. 

Rir ativa o nervo vago. Um estudo na Biological Psychology (2013) mostrou que interações sociais positivas aumentam a atividade vagal. Ou seja, invista em bons papos, gargalhadas genuínas e, quem sabe, um stand-up comedy de vez em quando.

Além de manter seu humor e sua digestão em ordem, o nervo vago também é um guerreiro na linha de frente imunológica. Ele modula a resposta inflamatória pelo chamado “reflexo inflamatório”. Um estudo na Nature Reviews Immunology (2014) revelou que a estimulação vagal pode reduzir inflamações crônicas, como nas doenças autoimunes.

Tomar uma ducha fria no final do banho ativa o nervo vago. Pesquisas na Medical Hypotheses (2015) indicam que o choque térmico estimula o sistema parassimpático. Comece com 30 segundos e veja sua coragem (e seu nervo vago) crescerem juntos.

Então, quando sentir aquele cansaço inexplicável, a mente agitada ou o intestino rebelde, lembre-se do seu heroi oculto. Talvez esteja na hora de respirar fundo, cantar, dar uma boa gargalhada e, quem sabe, até encarar um banho frio. O nervo vago agradece e sua saúde também. E agora, respire fundo. O nervo vago sorriu para você. Muita saúde a todos.

Liciana Rossi é especialista em coluna e treinamento desportivo, pioneira do método ELDOA no Brasil (licianarossi@terra.com.br)

Comentários

Comentários