ARTICULAÇÃO

Ecossistema de inovação integra startups e soluções tec

Por Ariadne Gattolini |
| Tempo de leitura: 10 min
Divulgação
Guilherme Brunhole, da UAU Box, envia mensalmente caixas de beleza para 15 mil clientes
Guilherme Brunhole, da UAU Box, envia mensalmente caixas de beleza para 15 mil clientes

O  ecossistema de inovação em Jundiaí, embora em fase de articulação, tem se mostrado maduro quando se trata de apresentação de soluções para a indústria e serviços.  Iniciativas de empreendedorismo de inovação e tecnologia vêm alcançando sucesso, com a criação de pequenas e médias empresas, que passam desapercebidas pelo público local, mas que têm repercussão nacional e, em alguns casos, alcançam o mercado da América Latina.

Para encontrar estes tec empreendedores, é preciso um olhar mais atento e indicações que passam de boca em boca. E eles estão espalhados pelo município, desde o bairro do Caxambu até as típicas avenidas 9 de Julho e Jundiaí. São empresários jundiaienses, que não trocam a segurança e tranquilidade da cidade, mas que estão globalizados e inovam em tecnologias com soluções para empresas que circundam a vocação da economia local ou mesmo na criação de produtos como nicho de mercado.

Este é o caso de Guilherme Brunhole, 32 anos, fundador da UAU Box, um clube de assinatura de beleza, que possui mais de 15 mil clientes em todo o Brasil. O espírito empreendedor de Guilherme surgiu ainda na faculdade de Ciência da Computação, da Unicamp. “Eu já trabalhava como programador, mas sabe como você já sente que seu lugar não era ali? Eu queria imprimir minha marca, ter um desafio maior.” Em 2018, Guilherme cria a UAU Box, nos fundos de sua casa no Caxambu. Hoje, a empresa tem mais de 30 funcionários, mas o Centro de Distribuição continua no mesmo bairro desde a fundação.

O clube de assinatura consiste em enviar às usuárias produtos de beleza mensais, de acordo com a preferência, características pessoais e cor da pele, normalmente de marcas novas, com produtos inovadores. Se hoje a UAU possui 15 mil assinaturas, esse montante aumentou estratosfericamente durante a pandemia de covid-19, quando a empresa chegou a contar com 80 funcionários. “A UAU representava a startup que todo mundo queria, por conta de sua inovação e crescimento”, afirma Guilherme.


Alexandre Borin é cofundador do Grape Valley, grupo informal de startups jundiaienses

Mas a rapidez e sucesso também tiveram seus percalços. O fundador teve de aprender rapidamente como lidar com o sistema tributário brasileiro e investir na gestão. Hoje, Guilherme não é mais o CEO da empresa, atua como conselheiro e já lançou um novo produto inovador, O Hiperfy, plataforma de avaliação e match entre empresas e influencers.

Através de IA, carinhosamente chamada de Lucy, o sistema resume o CV do influencer, em categorias e métricas, combina os perfis das marcas com as pessoas, avaliando também como esse influencer se comunica, qual a afinidade entre o cliente e quais são os sentimentos de quem segue e comenta o perfil.

A plataforma Hiperfy também trabalha por assinatura e o sonho de Guilherme é inserir Jundiaí no mapa da inovação. “Tem muita gente boa com startups inovadoras e soluções fantásticas, que precisam de mais exposição.”


CEO da iV2, Vlamir Ienne, aposta em gamificação e solução para a cidade digital
 
Articulação
O grande avanço de Jundiaí conta com uma lei de fomento à inovação, desde 4 de março de 2022, instituindo o Conselho Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação e o Fundo de Apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação. Desde então, houve passos significativos, como a qualificação do sistema público acessado pela população, maior segurança jurídica para investimentos em startups e o posicionamento de Jundiaí como polo de inovação e tecnologia, com participação ativa da comunidade empresarial e acadêmica. Para dar suporte a esta jornada, em 2022, foi criado o Grape Valley, um grupo informal de empreendedores tec, que busca se autoajudar, promover conhecimentos técnicos e até mesmo vender serviços na plataforma.

Para seu cofundador, Alexandre Borin, o principal motivo do grupo é divulgar ações e apoiar a criação de uma comunidade inovadora. “Juntamos pessoas interessadas da sociedade civil, com interesses próprios, agregando investidores, prestadores de serviços, alunos, professores e até mesmo o governo.”  O grupo tem aceitação de 72% de seus participantes e sua constituição tem inspirado novas comunidades na região, como o Tropeiro Valley, recém-criado em Sorocaba.


Mauricio de Oliveira, CEO da Runtec, levou mais de sete anos para conseguir emplacar sua solução logística

Se a informalidade é o motor do Grape Valley, os tec empresários da Região buscaram integração e fundaram, em outubro de 2024, uma Associação de Tecnologia e Inovação, para imprimir formalidade e ter acesso a editais e fomentos que são abundantes no Brasil. “A maturidade do ecossistema jundiaiense exigiu que tivéssemos cuidado com a questão burocrática, com a criação de CNPJ, por exemplo. A cidade precisa de um novo modelo de pré-incubação de empresas da área e testagem de novos modelos de inovação reais”, afirma o cofundador da associação, Vlamir Ienne.

Vlamir é um exemplo de como foi a maturação do setor em Jundiai. Ele é CEO do Grupo Iv2, que presta consultoria para software e atua no setor de gamificação, e vice-presidente do Conselho de Inovação e Tecnologia de Jundiaí. Engenheiro de computação com MBA em gestão de tecnologia e negócios, Vlamir atua há 30 anos como consultor e criou a Iv2  há 17 anos focada em inovação. Atualmente, são quatro empresas no grupo, duas consultorias e duas empresas voltadas à criação de jogos e games.

Com 80 funcionários,  uma das lacunas a ser preenchida é a especialização de mão-de-obra, um problema comum a todas as empresas de tecnologia na Região. “Jundiaí tem falta de mão de obra qualificada para processos complexos de automação. A pandemia de covid, de alguma forma, acabou abrindo o mercado globalmente, nos conectando a profissionais, com salários compatíveis, que não precisam de deslocamento.” Na Iv2, o trabalho é hibrido e a figura do tec líder tem autonomia para decidir como trabalhar de acordo com a produtividade e flexibilidade da equipe.

Entretanto, para dar conta da formação de novos profissionais do mercado, a Iv2 também lançou uma plataforma  Edtech, por onde já passaram mais de 1.700 alunos, apoiando a jornada de profissionalização de jovens formandos.

Vlamir também está à frente de um projeto ambicioso, de gamificação da cidade digital, Smart City. A ideia é conectar o mundo das relações humanas com o uso da IA para contratação, saúde mental, carreiras, energia renovável etc. Para entender a  navegalibidade, o usuário entra no prédio virtual desta cidade e consegue ter acesso a consultas e serviços públicos sem sair de casa. Como o mito de Ícaro, o empresário também sonha em construir um protótipo do “Jundiaí Valley”, colocando as tec inovações juntas, em uma área física comum, aproveitando o fluxo de informações e logística desta cidade bem situada.

O presidente do Conselho de Ciência e Tecnologia de Jundiaí, Amauri Marquezi, afirma que, após a criação do Campus Jundiaí - Ecossistema de Inovação, da atualização da lei Municipal de Inovação e do Plano Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Internacionalização, o município trabalha para fomentar a atuação integrada entre os diferentes ambientes de inovação, valorizando o potencial local, buscando criar fluxo contínuo de desenvolvimento. “Queremos estimular empresários para investimento e aceleração, com criação de programas de capacitação de talentos para atuarem nos ambientes de inovação e de fomento às empresas inovadoras nos diferentes estágios de evolução, explica Amauri.


Amauri Marquezi, presidente do Conselho de Ciência e Tecnologia, afirma que Jundiaí avança na legislação
 
Cases
Nem sempre uma startup tem sucesso imediato. Maurício Oliveira, CEO da Runtec, mostra como a persistência também é fundamental para a continuidade do negócio. Em 2001, o multitarefa Maurício ainda cursava faculdade de Administração, mas criava programações caseiras em sua residência. “Foi quando percebi que o setor logístico era carente de soluções tecnológicas”, afirma.

Neste período, ele criou uma solução que se assemelhava à torre de controle logístico, como conhecemos atualmente. Ele vendeu a solução para uma indústria química e conseguiu implantá-la na Colômbia. Porém, até 2008, não houve mais pedidos. “Na verdade, a solução era muito inovadora e não havia maturidade no mercado para sua implantação.”

Em 2008, entretanto, exigências burocráticas e governamentais demandaram mais informações para o setor, como justificativa de entrega, comprovação de receita, receita recorrente e o sistema da Runtec se adequava a este modelo.  “A partir de 2010, a Runtec não tinha concorrência e lançava um produto novo por ano. Em 2020, expandiu para a América Latina, em países como México, Chile, Peru e Argentina, com ênfase na gestão da cadeia de suprimentos com gestão do fornecedor embarcador, transportador e distribuição no varejo.

Com uso de IA preditiva com agendamento, estoque/inbound, solução de prompt, a consolidação do mercado veio nestes últimos anos. Com 60 funcionários, a empresa também tem preocupação com formação de mão de obra e fornece um lab tecnológico para a formação de 15 jovens.


A automação de atendimento via chatbot  foi a tônica para Ricardo Alves criar a Rvops

A automação de atendimento foi a tônica para Ricardo Alves e seu sócio criarem a  Rvops , em 2020, para cuidar da jornada do cliente em atendimento conversacional usando automação de hubspot e chatbot. Em um ano e meio, já possuía 100 clientes, focado em B2B para médias e grandes empresas.

Sua solução gera um sistema conversacional para vendas, principalmente focado em whatsapp, com qualificação de leads, identifica padrões e integra atendimento via zap e ou site.  “Nosso desafio é verificar as informações entre os departamentos para atender melhor e vender mais, cuidando da integração para a hiperpersonalização com apoio da tecnologia.”


Franklin Yamasake afirma que a cidade precisaria criar uma agência de inovação municipal

Cidade digital
Para Jones Martins, ex-gestor de Governo e Finanças de Jundiaí, o município tem caminhado com políticas públicas para a consolidação da smart city, com governança, transparência e oferta de serviços públicos digitais, rápidos e de fácil acesso. “Temos investido em tecnologia para aproximar o cidadão do serviço público, com facilidades digitais que avançam continuamente para uma resolução mais rápida e eficiente.”

O consultor de desenvolvimento de ecossistemas de inovação, com doutorado no mesmo tema pela USP (Universidade de São Paulo), Franklin Yamasake, afirma que uma boa alternativa para Jundiaí passa pela criação da  Agência Municipal de Inovação, com diretoria dedicada e políticas específicas voltadas para startups, visando manter sua relevância. “É fundamental que a Agência dinamize o ecossistema de inovação por meio de mentorias, matchmaking, eventos, conexões com oportunidades internacionais e atração de investidores, entre outras iniciativas. A instalação da Agência no Citylab seria uma opção estratégica”.

Outra medida que Franklin recomenda seria de incluir Jundiaí no Ranking Global de Startups (StartupBlink). “Atualmente, Curitiba ocupa o sétimo lugar no ranking da América Latina, e acredito que Jundiaí possa alcançar, no mínimo, a quinta posição. No entanto, hoje Jundiaí nem sequer aparece no mapa. Ao contratar os serviços do StartupBlink, eles realizam um mapeamento das startups e também podem oferecer um workshop com práticas recomendadas.”


Jones Martins, ex-gestor de Finanças, mostra como  a tecnologia se conecta à smart city

Em relação à gamificação das ações do ecossistema, Jundiaí poderia utilizar plataformas, como o Peoplefy. “Em Sorocaba, implementei o Peoplefy para atividades focadas em inovação. Por exemplo, para facilitar a geração de negócios entre empresas e startups, promover a participação em eventos organizados pela Prefeitura, entre outros. O ranking gerado pelos indivíduos mais engajados pode ser utilizado para a Premiação Anual. Além disso, como os próprios participantes registram a conclusão dos desafios, a Prefeitura obtém os dados necessários ao final do ano. É fundamental que essa plataforma tenha um coordenador responsável por definir os desafios, motivar os participantes por meio de campanhas e aprovar a realização dos desafios.”

Para a inovação que se articula, Jundiaí deve fomentar ainda selos públicos de inovação, feiras de tecnologia e um ambiente colaborativo para que todos se conheçam e troquem experiências. No ecossistema estadual, a cidade pode ser ponta de lança para abrigar tec empreendedores criativos e geradores de soluções e oportunidades.

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