OPINIÃO

Rubens do Amaral Gurgel

24/03/2024 | Tempo de leitura: 3 min

O ciclo existencial implica na intercalação entre boas vindas e despedidas. A humanidade é dinâmica. Início e fim são ininterruptos. Partidas de seres queridos machucam e fazem sofrer.

Jundiaí perdeu há alguns dias uma figura de exponencial significado. Rubens do Amaral Gurgel.

Filho de D.Amélia e de Bento do Amaral Gurgel, moradores à rua do Rosário, quando ainda habitada por um reduto de famílias tradicionais. O pai foi um respeitado tabelião desta urbe, consultado por advogados e magistrados, no exercício da verdadeira função tabelioa: dar conformação jurídica à vontade das partes.

Rubens era predestinado a militar nas hostes jurídicas. Desde cedo assumiu os encargos extrajudiciais confiados aos antigos cartórios. Especializou-se, antes mesmo de estudar direito nas Arcadas, a célebre escola criada por D. Pedro I em 1827 e que ainda funciona em prédio que foi o Convento franciscano, daí ser mais conhecida como a "São Francisco".

Foi titular do único Registro de Imóveis de nossa cidade, assumindo a delegação imobiliária de São Bernardo do Campo, como era seu direito, quando houve a divisão do cartório entre duas circunscrições.

Durante as décadas de exercício desse complexo juízo de qualificação do direito fundamental à propriedade, foi um paradigma de exação, correção e ética. Lamento hoje não ter aceito o convite que formulou a meu pai, de que fosse trabalhar com ele no RI. Teria conhecido antes esse universo fascinante, que assegura à cidadania um dos cinco direitos essenciais, consagrados no caput do artigo 5º da Constituição Federal.

Tornou-se um dos mais prestigiados registradores. Conhecia toda a normatividade incidente sobre a matéria, sempre abundante e até esdrúxula. Sabia resolver as questões fundiárias com prudência e sabedoria. Era apontado pelo Juízo da Corregedoria Permanente e pela Corregedoria Geral de Justiça como exemplo de servidor público.

Acompanhei a carreira registral de Rubens do Amaral Gurgel, cuja dimensão só vim a assimilar, quando me tornei Juiz da Primeira Vara de Registros Públicos da Capital e depois assessorar o Corregedor Geral Desembargador Sylvio do Amaral.

Durante toda a minha jornada, sempre contei com a fraterna amizade de Rubens e de sua esposa, Wanda Latorre do Amaral Gurgel. Ele sempre circunspecto, contido e incentivador daquilo que a consorte fez em benefício da coletividade.

Inúmeras ações sociais foram desenvolvidas espontaneamente, com Wanda à frente e Rubens na retaguarda. Praticaram a verdadeira solidariedade e o fizeram com atuação discreta, longe de holofotes e de badalação.

Wanda e Rubens fizeram questão de me acompanhar em todas as etapas. Eram pessoas presentes às posses, às celebrações, às solenidades tão pródigas para quem abraça carreira jurídica. Ele sempre me dispensou a atenção paternal e afetuosa de quem possui verdadeira grandeza e não hesita em partilhar seu conhecimento com os neófitos.

Rubens do Amaral Gurgel é um nome a ser preservado na memória jundiaiense, por inúmeras razões. Mas, principalmente, por ter sido esse padrão de elegância sóbria, de participação cidadã em tudo o que interessou ao mais auspicioso destino da cidade, por exercer uma delegação extrajudicial com zelo e devoção que representam segura trilha para os que abraçaram essa área.

Saibamos mantê-lo vivo em nossa lembrança e a luzir como farol para as gerações do amanhã.

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo (jose-nalini@uol.com.br)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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