Louis Vuitton e a desigualdade

04/01/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Elon Musk não é mais o homem mais rico do mundo. Ele perdeu o lugar para o dono de uma fábrica de bolsas. Bernard Arnault é francês, presidente da LVMH e tem uma fortuna de 188 bilhões de dólares, 10 bilhões a mais do que o americano.

O capital de Bernard é maior do que o PIB de mais de 57% dos países do mundo. Um único homem tem mais dinheiro do que o montante gerado em 2021 em cada um de 110 países dos 193 que existem no mundo (dados do Banco Mundial). Ele é a cereja de um bolo muito mal distribuído. Segundo o World Inequality Report, os 10% mais ricos detém 75,6% da fortuna do mundo, enquanto 50% dos mais pobres têm 2%. Isso significa que um adulto rico classificado entre os 10% acumula em média EUR 550 mil, enquanto um adulto pobre classificado entre os 50% da população mundial acumula EUR 2,9 mil. Mas os 10% mais ricos não representam Bernard. Ele é 1 em 100 milhões de adultos que possuem mais de EUR 77,4 bilhões. Isso significa que existem 52 pessoas no mundo como Bernard e Elon Musk e que juntos detém 1.1% de toda a fortuna mundial.

A LVMH é uma holding de empresas de artigos de luxo, como Louis Vuitton, Chandon e Sephora. Para ter acesso a essas marcas, o consumidor já tem de estar entre os 10% mais ricos da população mundial. Para comprar uma bolsa de R$14 mil, certamente o indivíduo deve ganhar mais de R$5 mil por mês (pib per capita mundial segundo o Banco Mundial) ou mais de R$2.652,00 (média salarial brasileira segundo IPEA). Por mais que a Chandon tenha colocado espumantes de entrada no Brasil que custam a partir de R$90 a garrafa, uma unidade do espumante francês não custa menos de R$400.

O fortalecimento dos ultra-ricos é um fenômeno que tem crescido a taxas surreais desde 1995. A fortuna do Bernard e seus amigos cresce quase 10% ao ano, enquanto a fortuna de 50% da população cresce 3.7%. Isso porque não estou falando da disparidade desses 50% da base da pirâmide. Certamente a grande maioria dessas pessoas são incapazes de acumular capital, já que seus gastos muitas vezes são maiores do que sua receita. Segundo uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, mais de 75 milhões de brasileiros vivem com metade ou menos de um salário mínimo (perto de R$651 por mês), sendo 11 milhões abaixo da linha da pobreza (R$198 por mês, quase a metade de uma chandon francesa). Isso sem considerar que ainda há uma dependência significativa das políticas assistencialistas. Somente 47% da renda das famílias mais pobres vêm do mercado de trabalho, o restante é proveniente do INSS e dos auxílios governamentais. É evidente que o acúmulo desigual de capital é, entre outros, resultado da disparidade salarial. A Coca-Cola é um exemplo: o salário do CEO chega a ser 14007% maior do que o de um funcionário. No Brasil essa média é de 75 vezes.

Em um momento histórico de tamanha disparidade e polarização, o homem mais rico do mundo ser dono de uma loja de bolsas é um retrato claro da confusão de valores que estamos vivendo.

Elisa Carlos é yogini, especialista em inovação e head de operação (elisaecp@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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