A Lei 14.181, conhecida como Lei do Superendividamento, mudou a forma como dívidas de consumo podem ser renegociadas no Brasil e trouxe impactos diretos para idosos, grupo mais exposto ao endividamento excessivo. Em vigor desde 2021, a norma reforçou a proteção da renda essencial, criou regras para acordos mais realistas e passou a exigir maior responsabilidade das instituições financeiras na oferta de crédito.
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Ao contrário do que muitas informações sugerem nas redes sociais, a lei não “apaga” dívidas automaticamente. O que ela faz é organizar mecanismos para evitar abusos, estimular negociações viáveis e permitir a reorganização conjunta dos débitos, sempre com foco na preservação do chamado mínimo existencial.
A legislação passou a tratar de forma específica a situação em que o consumidor pessoa física, agindo de boa-fé, não consegue pagar o conjunto de suas dívidas de consumo sem comprometer despesas básicas como moradia, alimentação, transporte e saúde.
Entre aposentados e pensionistas, esse quadro costuma surgir quando gastos fixos elevados consomem grande parte da renda mensal, restando pouco espaço para parcelas de empréstimos, financiamentos ou cartões de crédito.
Um dos pilares da Lei do Superendividamento é a garantia de que acordos não inviabilizem a sobrevivência do consumidor. Para isso, foi incorporado ao Código de Defesa do Consumidor o conceito de mínimo existencial, que funciona como um limite para o comprometimento da renda.
Após debates e ajustes, o governo federal definiu, por meio do Decreto nº 11.567, de 2023, o valor de R$ 600 como referência mínima a ser preservada nos procedimentos de prevenção, conciliação e tratamento do superendividamento. A definição desse parâmetro ainda é tema de discussões judiciais, inclusive no Supremo Tribunal Federal.
O caminho previsto pela lei começa fora do Judiciário. O consumidor pode propor um plano de pagamento que reúna todas as dívidas e convoque os credores para uma tentativa de conciliação conjunta. A ideia é substituir acordos isolados por uma solução global, compatível com a renda disponível.
Se houver consenso, o plano é formalizado. Caso contrário, a lei autoriza o ingresso na Justiça para buscar a repactuação judicial das dívidas. Nesse caso, o juiz analisa a proposta e pode ajustá-la, respeitando o limite máximo de cinco anos para quitação e as características essenciais dos contratos, desde que compatíveis com a nova realidade financeira.
Podem ser incluídas dívidas de consumo assumidas de boa-fé, como empréstimos pessoais, financiamentos, cartões de crédito e contas de serviços essenciais, desde que exista relação de consumo.
Ficam de fora obrigações com regras próprias, como tributos, multas e pensão alimentícia. Especialistas ressaltam que a inclusão de cada débito depende da análise do contrato e da finalidade do crédito, o que torna essencial a avaliação caso a caso.
A Lei 14.181 também atua antes da dívida existir. O Código de Defesa do Consumidor passou a exigir mais transparência na oferta de crédito, com informações claras sobre juros, encargos e riscos do não pagamento.
Práticas de cobrança abusivas, como ameaças e constrangimentos, foram reforçadas como ilegais. A medida busca proteger especialmente idosos, frequentemente alvo de ofertas insistentes e contratos firmados sem análise adequada da capacidade de pagamento.
A portabilidade de crédito surge como uma ferramenta complementar para reduzir custos, permitindo transferir a dívida para outra instituição com juros menores ou prazos mais adequados. Em 2025, o Banco Central anunciou medidas para ampliar e padronizar esse mecanismo no contexto do open finance.
Especialistas alertam, porém, que a decisão deve ser baseada no custo efetivo total do contrato, evitando que a troca resulte em um valor final maior.
Antes de qualquer negociação, a recomendação é reunir todas as informações sobre as dívidas e calcular quanto sobra da renda após as despesas essenciais. Com esses dados, o consumidor consegue apresentar uma proposta mais realista.
Procons estaduais e municipais oferecem orientação gratuita, mediação com credores e registro de reclamações sobre assédio de crédito ou práticas abusivas. Esses órgãos costumam ser a principal porta de entrada para idosos que buscam reorganizar a vida financeira com apoio institucional.