POLÍTICA

Tarcísio mais que dobra valor de emendas voluntárias

Por Carolina Linhares | da Folhapress
| Tempo de leitura: 5 min
Mônica Andrade/Governo do Estado de SP
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), mais que dobrou a distribuição de emendas voluntárias para parlamentares em 2024, superando valores pagos pela gestão tucana anterior e passando a contemplar deputados federais e senadores no ano eleitoral - em que o fluxo de recursos para as prefeituras é considerado crucial nas disputas locais.

Segundo dados da Secretaria de Governo, controlada por Gilberto Kassab (PSD) e responsável por atender as demandas, o volume de emendas voluntárias somou R$ 2,14 bilhões neste ano. Esse recurso é usado para bancar gastos, obras e melhorias em municípios e entidades indicados pelos deputados, o que é uma forma de favorecer a base eleitoral de aliados.

A secretaria nega que o aumento tenha relação com o ano eleitoral ou com a privatização da Sabesp aprovada na Assembleia do estado e afirma que a gestão prioriza o diálogo e a cooperação institucional, mantendo um canal aberto com os deputados.

Até a primeira semana de dezembro, pouco mais da metade (52%) desse valor já havia sido efetivamente empenhado ou pago, e o restante ainda estava em processamento, o que é motivo de reclamação nos corredores da Assembeia.

Em nota, a secretaria afirma que o prazo de pagamento das emendas varia, já que é exigido em alguns casos que haja plano de trabalho e cronograma de obras.

No ano passado, Tarcísio destinou apenas R$ 858 milhões (ou R$ 891 milhões em valores corrigidos) às emendas voluntárias e atendeu somente deputados estaduais, contrariando a prática da gestão anterior de incluir deputados federais e senadores paulistas.

Em 2022, último ano do governo João Doria e Rodrigo Garcia, então filiados ao PSDB, o valor das emendas voluntárias chegou a R$ 1,28 bilhão (R$ 1,39 bilhão em valores corrigidos). Até então, a distribuição dessa verba não era publicada no portal da transparência, o que passou a ocorrer sob Kassab, com atualização diária.

O pagamento das emendas voluntárias não é obrigatório e ocorre conforme a conveniência do Palácio dos Bandeirantes. Por isso, esse mecanismo acaba servindo como moeda de troca na política, privilegiando deputados que votam a favor do governo.

Já as emendas impositivas têm execução obrigatória e são distribuídas de forma igual entre os 94 deputados estaduais. Em 2024, cada deputado teve direito a quase R$ 11 milhões (mais de R$ 1 bilhão no total).

No caso das voluntárias estaduais, Tarcísio atendeu 89 deputados de 16 partidos. Apenas a bancada do PSOL, com cinco deputados, ficou de fora da lista de beneficiados.

Já os 18 membros da bancada do PT, que também fazem oposição, indicaram emendas voluntárias, ainda que em valor bem menor em comparação com deputados governistas.

Tanto no ano passado quanto neste ano, Tarcísio ofereceu valores fechados aos deputados, que puderam distribuir essa verba nos projetos de sua preferência. Em 2023, a maior parte dos aliados indicou R$ 11 milhões cada ante R$ 5,5 milhões dos deputados da esquerda.

Em 2024, a discrepância foi maior. Aliados tiveram direito a R$ 20 milhões contra R$ 5 milhões para os membros do PT, por exemplo. Deputados ouvidos pela Folha atribuem o aumento à votação mais importante para Tarcísio até aqui --a privatização da Sabesp, aprovada em dezembro de 2023, por 62 a 1, que acabou sendo recompensada neste ano.

Outra medida relevante para o governo, a da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que permite que parte do gasto antes obrigatório na educação seja direcionado para saúde, foi acompanhada da liberação de R$ 460 milhões em emendas voluntárias, pagas entre o primeiro e o segundo turno da votação, em novembro.

Líder do PT, o deputado Paulo Fiorilo diz que o partido briga para aumentar o valor das emendas impositivas, que são igualitárias. "[Com as emendas voluntárias] Os deputados da base acabam tendo mais capacidade de ajudar seus candidatos e prefeitos do que os da oposição", afirma.

"Mas entendemos que não há problema em receber [emendas voluntárias] até porque não estamos trocando votos por emendas. As emendas voluntárias deveriam ser para todos, são públicas e é possível fiscalizar e controlar", completa.

Em nota, o governo diz que as emendas são parte do relacionamento com a Alesp "especialmente com os deputados da base, que [...] apoiam os programas e projetos desenvolvidos pelo Executivo e conhecem em detalhes as demandas de regiões específicas".

"Todas as indicações devem seguir a legislação e estar alinhadas ao portfólio de programas e projetos do estado", completa.

O fluxo de emendas também influencia as eleições. Os partidos que elegeram mais prefeitos no estado em 2024, como PSD, PL e Republicanos, aparecem também entre os cinco primeiros no ranking de emendas voluntárias.

Kassab, presidente do PSD, partido que elegeu mais prefeitos no país e também no estado (205 de 645), é quem controla a distribuição das emendas. Como mostrou a Folha, o poder do secretário e a reclamação de que ele usa o cargo para favorecer sua própria legenda têm gerado rachas na base de Tarcísio. Kassab afirma que o atendimento dos deputados é republicano e não partidário.

Após pressão do Republicanos e do PL para reduzir o domínio de Kassab, o Orçamento de 2025 para a pasta dele acabou desidratado --o texto foi aprovado em 17 de dezembro com pouco mais de R$ 900 milhões para a secretaria em vez dos R$ 2,2 bilhões propostos pelo governo.

Outra novidade de 2024 foi o fato de Tarcísio retomar uma prática tucana e distribuir emendas voluntárias para a bancada federal --70 deputados e 3 senadores. Esses congressistas têm direito a diversos tipos de emendas no Orçamento federal, mas não no estadual.

No início do ano, porém, Tarcísio fez um acordo com os parlamentares paulistas, que enquanto bancada estadual têm direito a uma emenda impositiva no total de R$ 316,9 milhões. O grupo concordou em destinar essa verba ao programa Muralha Paulista, de combate à criminalidade com base em reconhecimento facial, e ao Hospital das Clínicas.

Em troca, Tarcísio ofereceu R$ 10 milhões em emendas voluntárias para cada, totalizando mais de R$ 720 milhões. O acordo envolveu parlamentares opositores, incluindo petistas e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), a quem o governador enfrentou na eleição da capital enquanto principal cabo eleitoral do prefeito reeleito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB).

Segundo o governo, o acordo é vantajoso porque a verba da bancada pôde dar celeridade a projetos prioritários e porque as indicações de emendas voluntárias têm que contemplar ações que já fazem parte de projetos do estado e metade deve ser destinada à saúde.

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