Para policiais, decreto de Lula não muda normas já existentes
As principais bases do decreto publicado nesta terça (24) pelo governo Lula sobre uso da força por policiais não devem modificar a rotina das forças de segurança, especialmente em São Paulo, porque as orientações já fazem parte dos procedimentos operacionais adotados há décadas, segundo policiais ouvidos pela reportagem.
A reportagem falou com cinco policiais militares (entre oficiais e praças) e dois delegados, todos da ativa, e eles são unânimes em considerar que o decreto do governo Lula se aproveita da crise na segurança pública vivida pela população paulista na gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) para reafirmar procedimentos que já são exigidos.
Um dos principais pontos da nova norma prevê que não é legítimo o uso de arma de fogo em duas circunstâncias: contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou lesão para policiais ou terceiros; e contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando houver risco de morte ou lesão.
No estado de São Paulo, por exemplo, desde 1998 a PM utiliza o Método Giraldi, que organiza o uso progressivo da força policial e coloca o emprego da arma de fogo como o último recurso, quando existe a absoluta necessidade de defesa da própria vida ou da vida de terceiros.
Além disso, desde o início dos anos 2000, a corporação vem organizando seus POPs (procedimentos operacionais padrão) baseados na ideia de evitar a realização de abordagens que possam pôr em risco a vida do policial e, principalmente, a vida de pessoas inocentes.
Sobre atirar em pessoas desarmadas correndo em fuga, essa orientação prevista no decreto é considerada insensata pelo policiais, pois qualquer policial, desde sempre, sabe que não se pode atirar em uma pessoa desarmada em fuga, de carro ou pé, sob o risco de responder pelo crime de homicídio doloso.
Com relação aos recentes casos de violência policial registrados em São Paulo neste ano, como o do estudante de medicina que resistiu à prisão, o próprio governo admitiu ter havido erro de procedimento. A dupla não seguiu as normas, entre as quais a de usar primeiro uma arma de choque.
O policial que realizou o disparo foi indiciado pela corporação por homicídio doloso (quando há intenção de matar ). Há a possibilidade de ele ir à júri popular, se o crime for considerado doloso (intencional) ao término da investigação e o Ministério Público e Justiça concordarem com tal tese.
A maioria dos policiais ouvidos pela reportagem aponta que a explosão de casos de violência policial no estado é consequência direta da escolha do capitão reformado Guilherme Derrite como chefe das polícias. Segundo eles, a postura e as declarações do novo secretário --que foi desligado da Rota (tropa de elite da PM) por excesso de mortes-- são uma espécie de salvo-conduto para, principalmente, uso de armas nas ocorrências em que PMs se sentirem ameaçados.
Além disso, apontam os agentes, aumentou a sensação de impunidade na tropa em uma eventual investigação sobre episódios de violência.
Os delegados ouvidos pela reportagem salientam ainda que as normas do decreto já estão previstas em legislação, como os casos de matar alguém em legítima defesa. Eles também citam o dispositivo legal da legítima defesa putativa, que ocorre quando o agente pensa estar em situação de extremo perigo, mas que, posteriormente, descobre não estar.
Exemplos disso são quando uma pessoa está com uma arma de brinquedo, os chamados simulacros, ou quando alguém faz menção de sacar uma arma, quando, na verdade, está retirando um celular da cintura. Esse tipo de erro pode ter a punibilidade excluída.
As diretrizes apresentadas pelo governo federal não são imposições aos estados, que são os responsáveis pelo comando das polícias militares. Elas servem como uma tentativa de padronizar uma política pública para a segurança pública em nível nacional.
O governo Lula, porém, define no decreto que os repasses para os fundos de segurança pública observarão se os estados têm cumprido as diretrizes.
Para os policiais, o decreto do Ministério da Justiça pode até ser considerado ilegal porque, da mesma forma como foram interpretados os decretos do governo Bolsonaro, não é possível o Executivo legislar por meio de decretos envolvendo questões pertinentes ao Poder Legislativo.
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Comentários
1 Comentários
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Darsio 16 horas atrásCá entre nós. Se os policiais cumprissem os procedimentos que dizem cumprir, criança de quatro anos não seria morta por policial. Estudante de medicina desarmado, também não seria morto por policial. Pessoas não seriam jogadas de pontes por policiais. Mulheres e até idosas não receberiam tapa na cara ou golpes mata-leão de policiais. Em quem devemos acreditar, ou seja, na realidade dos fatos e acontecimentos ou no discurso dos policiais?