Criado a partir da combinação das palavras moustache (bigode) e November (novembro), o movimento global Movember reforça como a saúde mental masculina pode interferir no combate ao câncer de próstata e testículo. Lucas Benevides, psiquiatra e professor de Medicina do Centro Universitário de Brasília (CEUB), alerta sobre o impacto fisiológico e psicológico do estigma em torno da masculinidade no diagnóstico e o tratamento de doenças - que pode prolongar o sofrimento e elevar as taxas de mortalidade.
A cultura de honra, marcada pela valorização da força e da autossuficiência, é um obstáculo. Segundo Benevides, muitos homens evitam consultar médicos de todas as especialidades ou realizar exames preventivos, pois consideram que isso os torna vulneráveis ou frágeis.
"Essa relutância está enraizada no machismo, que valoriza o autocontrole e a resistência física. A mentalidade dificulta que eles aceitem procedimentos de rastreamento, o que é alarmante em relação ao câncer de próstata, uma das doenças que mais matam homens no Brasil", destaca.
O docente do CEUB destaca que essa barreira emocional se agrava por envolver o exame de toque, que "carrega um peso simbólico por ser considerado uma invasão à identidade masculina". No entanto, a falta de diagnóstico precoce significa um custo alto para a saúde do homem.
"Quando o câncer de próstata é detectado nos estágios iniciais, as chances de sucesso no tratamento são muito maiores. Mas a resistência com os exames preventivos atrasa o diagnóstico, o que pode levar a piores desfechos clínicos e comprometer a qualidade de vida dos pacientes".
Outro fator preocupante é o medo de que o tratamento do câncer de próstata comprometa a função sexual. No entanto, o psiquiatra alerta para o impacto psicológico dessa decisão: "A percepção de que o tratamento pode afetar a virilidade é uma das principais razões para a recusa ao diagnóstico. A ideia de masculinidade está, muitas vezes, intimamente ligada à sexualidade, o que faz com que muitos homens prefiram correr o risco de complicações graves a encarar um tratamento que eles associam a uma ameaça à sua identidade masculina".
Apoio psiquiátrico e psicológico
De acordo com Lucas Benevides, o medo sentido pelo homem também leva a altos níveis de ansiedade e estresse antes dos exames, o que contribui para o adiamento do diagnóstico, perpetua o ciclo de negação e procrastinação do cuidado médico.
Campanhas que promovem a prevenção do câncer de próstata e abordam temas de saúde mental masculina ajudam a superar esse estigma, sendo os apoios psiquiátrico e psicológico indispensáveis.
O psiquiatra sugere que psicólogos adotem abordagens terapêuticas específicas para ajudar homens a lidar com o impacto psicológico do tratamento, especialmente no que tange à função sexual.
Com os avanços na medicina, técnicas menos invasivas são adotadas, como a cirurgia robótica, que minimiza o impacto físico e psicológico do tratamento.
Segundo Benevides, essas alternativas permitem preservar melhor a função sexual e a imagem corporal dos pacientes, reduzindo a sensação de ameaça à masculinidade.
No âmbito da saúde mental, técnicas de enfrentamento como mindfulness e a participação em grupos de apoio podem ser eficazes para ajudar os homens a lidar com o medo e a ansiedade antes e depois do diagnóstico.
"Quebrar tabus em torno da masculinidade é mais do que uma questão de redefinição cultural: é um ato necessário para promover uma saúde mais inclusiva e prolongar a vida daqueles que hesitam em buscar o cuidado de que tanto precisam", arremata o professor.
Raio-X do Câncer de próstata no Brasil
No Brasil, o câncer de próstata representa 29% dos casos da doença, de acordo com levantamento do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Em 2023, foram 70 mil novos casos e 17 mil óbitos pela doença no país, ressaltando a importância de iniciativas que promovam a conscientização e o diagnóstico precoce.
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