CRÔNICA

Cid Moreira, JN, vô e meus 8 anos: a vida é uma grande notícia

Por Guilhermo Codazzi | Taubaté
| Tempo de leitura: 2 min
Editor-chefe de OVALE
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Eu, minha prima Malu e minha irmã Marina no colo do meu avô, Doutor Hélcio
Eu, minha prima Malu e minha irmã Marina no colo do meu avô, Doutor Hélcio

Meus oito anos.
Este é o título do poema mais conhecido de Casimiro de Abreu (1839-1860), declamado por Cid Moreira nesta segunda-feira (30), em sua última gravação, dois dias antes de sua morte. A gravação foi postada por ele nas redes sociais, como forma de agradecimento pelas mensagens de parabéns, pelo seu aniversário de 97 anos, celebrado no domingo (29).

"Oh! Que saudades que tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras,
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!", diz a estrofe mais conhecida do poema.

Coincidentemente, minhas lembranças sobre Cid, meu conterrâneo, datam do tempo dos meus oito anos, aproximadamente. E, já vou logo dizendo, eu não gostava do Cid Moreira. Nem um pouco. Calma, já explico.

No fim da tarde, depois das aulas na Escola Professor Doutor Alfredo José Balbi, o colégio da Unitau (Universidade de Taubaté), meus irmãos e eu costumávamos ir à casa da minha avó, que ficava ali pertinho. Tomávamos café (o café da minha avó, a Dona Nívia, era delicioso!) e ficávamos por lá, vendo televisão ou brincando, ao lado da Malu, nossa prima de nascimento e irmã de coração.

Quando a noite caía, após o jantar (que delícia o arroz com feijão da minha avó!), meu avô, o sisudo Doutor Hélcio, subia as escadas e sentava-se diante da televisão, para assistir o Jornal Nacional. Até hoje, só de ouvir a vinheta do JN, lembro-me daquele tempo. Meu avô, a quem eu via como um homem bravo e sério, exigia silêncio absoluto. Nem um pio!

E ainda piorava. Havia um problema adicional. A sala da televisão ficava no meio do caminho para o quarto dos netos, onde estavam os brinquedos. Para chegar até só lá tínhamos duas opções: ou esperávamos pelos comerciais ou passávamos agachados, para não ficar na frente da TV e levar uma bronca.

Por isso, a criança que eu fui não gostava (nem um pouco) do Cid Moreira e não via a hora dele encerrar o jornal, com o seu tradicional e solene "boa noite".

Hoje, sem a armadilha do saudosismo, mas compreendendo a doçura dos versos do poeta Casimiro, recordo-me disso tudo com saudade.

Acredito que a morte de grandes personalidades, como Silvio Santos, Pelé ou Cid Moreira, entre tantos outros exemplos, no impacta, mesmo que não conhecêssemos tais figuras ilustres, porque faz com que nos lembremos de nossa própria finitude, do que vivemos. E de quem já se foi.

Quem diria que, anos depois daquelas noites da década de 1980, o menino de Taubaté se tornaria jornalista, trabalharia em um jornal e odiaria que o interrompessem enquanto ele assiste o Jornal Nacional. 

Surpreendente e irônica, a vida é mesmo uma grande notícia, não?

Boa noite Cid. Boa noite vô, mande notícias.

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