NOSSAS LETRAS

Golfinhos e humanos no Brasil

Por Mário Eugênio Saturno | Especial para o GCN/Sampi Franca
| Tempo de leitura: 2 min

A revista Science nos traz uma interessante matéria sobre como, por mais de 140 anos, pescadores no sul do Brasil estabeleceram uma parceria incomum com golfinhos. Estes animais conduzem cardumes de tainha do Oceano Atlântico para águas mais rasas de uma estreita lagoa na pequena cidade costeira de Laguna. E ali pescadores aguardam os golfinhos com suas redes.

Cientistas da Universidade Estadual do Oregon, de Corvallis, entrevistaram 177 pescadores em Laguna. Descobriram que os pescadores procuravam um bom parceiro de pesca, golfinhos que os direcionavam para a tainha. Os pesquisadores também registraram quase 5000 capturas de tainha de 2018 a 2019 e, pela primeira vez, investigaram se os golfinhos se beneficiavam dessa parceria.

Descobriu-se que 85% das capturas dos pescadores vieram dessa parceria. As pescas acontecem em perfeita sintonia entre golfinhos e humanos e resultam na captura de mais peixes por ambos, conforme relatam os pesquisadores na revista Proceedings of the National Academy of Sciences. Os pescadores tinham 17 vezes mais chances de pegar tainha quando os golfinhos estavam presentes; além disso, os pescadores pegavam quase quatro vezes mais peixes quando combinavam seus arremessos com as dicas dos golfinhos.

Assim como os pescadores observavam os golfinhos, os golfinhos também observavam os pescadores. Ambas as espécies precisam sincronizar corretamente suas ações para pegar peixes. As pessoas aguardam com suas redes prontas para que um golfinho se aproxime. Quando um golfinho vê um pescador preparado, o mamífero marinho dará uma dica, geralmente um mergulho profundo, indicando ao pescador que a tainha está ali e é hora de lançar a rede. Os cientistas relatam que, de quase 3000 tentativas de pesca registradas, quase 46% foram bem-sucedidas.

O estudo demonstra de forma convincente que, quando agem ao mesmo tempo, os pescadores capturam mais tainha, e os golfinhos emitem mais cliques de ecolocalização que indicam uma caçada bem-sucedida. Especula-se que a relação pode ter evoluído depois que golfinhos mais ousados observaram pescadores lançando redes para pegar tainha e usaram isso como uma oportunidade para pegar mais tainha por si mesmos.

Essa colaboração pode ser possível apenas porque tanto humanos quanto golfinhos sejam espécies cooperativas. Populações de golfinhos em outras regiões também são conhecidas por cooperar com pescadores humanos, conduzindo peixes em direção à costa ou para redes na Austrália oriental, Mauritânia e Sudeste Asiático. No entanto, essas práticas desapareceram ou estão em declínio.

Um fato surpreendente é que a cooperação entre pescadores brasileiros e golfinhos acontece a quase cento e cinquenta anos e não despertou pesquisas locais. E mesmo depois de uma pesquisa anterior feita por cientistas da Universidade de Plymouth, do Reino Unido, e publicada no Biology Letters em maio de 2012. O Brasil precisa investir muito em Ciência e Tecnologia para despertar cientistas criativos e geniais.

Mário Eugênio Saturno (cientecfan.blogspot.com) é Tecnologista Sênior do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e congregado mariano

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